8.10.06

Uma praga russa, por Pedro Cem


Anna Politkosvkaya morreu, com quatro tiros, dentro do elevador, pequenino e estreito, do seu apartamento exíguo de Moscovo. Tinha sido mediadora durante o sequestro terrorista no Teatro Nordeste e fora alvo de uma tentativa de envenenamento quando se dirigia a Beslan, para o mesmo fim. Dizia um pianista russo durante aquilo que eles chamam a Grande Guerra da Pátria e nós Segunda Guerra Mundial que "hoje não quero pensar em Música mas apenas em matar alemães e enterrá-los bem fundo na terra". O Verão está a morrer na estepe, o Sol voa baixo, a Natureza morre e Anna será enterrada bem fundo na terra. Na estepe, o vento levará os soluços dos seus filhitos órfãos, como já levou tantos gemidos, os transformou em uivos de lobo e os trouxe de novo, na Primavera, com os gritos das andorinhas. Na Chechénia o fantasma de Basayev continuará a dançar sobre um pé e o viking islâmico Omarov a cortar-lhe a erva por baixo, com a foice grande.

Há uma alma russa que suporta todas as dores e, de rastos na lama e no frio, toma um balanço sem fim. Essa alma não vive no Kremlin, nem bate às portas de Novgorod. Essa alma foge a correr pela estepe, com o filhinho nos braços. Algures na fronteira onde vagueiam os povos sem mapa, alguém dará fogo de aquecer e água de beber ao filhinho que Anna não teve. Também a estepe sem fim, traz a doce rendição, dos que vencem sendo vencidos e dos que têm o ar míope, confundido e escolheram não ter mar, como Politkovskaya.

O relâmpago cairá na estepe, sobre o assassino que julga fugir. Porque todos os lobos que guardam a Santa Rússia, saiem esta noite a monte para lhe indicarem o caminho.

2 comments:

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