12.4.06

A Democracia Divide - Eleições em Itália, Por André Bandeira

Bernardo Provenzano foi preso. Quem traíu o Chefe ?

Santapaola tinha sido preso em 1992. Toto Riina, pouco depois. Portanto, Provenzano era Imperador sozinho, como todos os Imperadores.

Alguém lhe disse: andas demasiado livre e sozinho. A Liberdade é um perigo para as coisas sérias. Nós, senadores, sabemos (e queremos) do fundo da fossa humana que ninguém é livre. Vais ter de crescer e multiplicar-te na cadeia. E Provenzano foi dentro no dia em que caía Roma. Provenzano não se vende. Só compra. Por isso sabe que não é livre e obedeceu.

A Democracia está a chegar aos limites, empanturrada de contadores da alibís. Como se isso não fosse patente num bilião de muçulmanos, num bilião e meio de confucionistas, nas vagas globais sem rosto nem voz, nas rave-party que destroem tudo numa noite só, mostrando os dentes sem rir, no frenesi sexual, na confusão dos géneros, no desrespeito dos velhos, na Religião de moeda na ranhura e alavanca na mão.

Mas Roma caíu por engano. Escorregou virada de costas, empurrada por uma coligação feita de costas, trazendo aos ombros alguém que estva dentro porque esteve fora e irá para fora, porque esteve dentro. Roma caíu e o Imperador, mesmo no chão é volumoso. Ele, que pagava a todos os clientes porque tinha dinheiro é a maior estátua, no meio das ruínas. Só lhe tiraram o pedestal, a estátua ficou de pé.

Todavia Roma tinha caído há muito mais tempo. A Democracia divide todos, em dois, e dois em três e três em quatro, divide a personalidade, o voto na Primavera e o voto no Outono, as famílias, as Nações. As eleições, ou melhor, o resultado delas é a mãe de todas as divisões. Não são um momento de verdade, são um modificação no Contrato, são sempre emendas. O Eleitorado diz timidamente qualquer coisa, nunca diz tudo, cada vez diz menos, um pouco para se defender dos senadores, um pouco para se aproveitar deles, visto que não confia em si próprio, ele, eleitorado, que foi inventado pelos acrobatas dos quocientes. Votando, julga que se liberta de qualquer coisa, como quem lança uma bola sem pontaria, até lançar todas as bolas e não ficar nenhuma. Por isso não há legitimidade nenhuma em impôr o jogo a quem não quer jogar, ou nunca jogou porque é tudo uma distracção lúdica, contra a consciência, que exige maturação.

Mas o Imperador proclamou-se quando os senadores estavam todos com as mãos entaladas nas bolas, depois de lincharem o Imperador Negro, Mussolini, que nunca ninguém fôra tão amado. Assim, o Imperador da venda pagou para que se calassem as vozes à volta do vazio. E, agora, mesmo caído, tem a estátua mais volumosa, que não cai, de tão redonda, entre as ruínas.

Que interessa saber quantas ruínas há, se mais à esquerda ou mais à direita, conforme a enxurrada do Inverno as dispõe ? Como se pode fazer a unidade do Mundo, contando-o ? Quem dá o divisor não é o ingénuo palerma que quer sempre mostrar que sabe contar e dividir. Além disso, a estátua de um Imperador não faz das ruínas, um Palácio.

Os desolados e saudosos das ruínas juraram tanto fazer a terra rasa, que, para brincarem com as ruínas, arranjaram um Imperador de brincadeira. Por isso Provenzano obedeceu e se entregou. Vai comçar agora um grande processo sobre o acasalamento das ratazanas que medram nas ruínas. E o Imperador continuará de pé, mesmo fora do pedestal para distrair os olhos das ruínas, onde as ratazanas se desenfiarão, como sempre.

E o mais triste é que os saudosos dos palácios continuarão a fazer filmes, a ganhar óscares, a deixarem crescer o nariz como o Pinóquio e a atiraraem pedras ao Imperador de Brincadeira, quando o seu próprio egoísmo, que chamam ternura e o seu cinismo, que chamam beleza, os aborrecerem de morte.

Oh Roma ! Já não és Itália, tu que dizes que não és qualquer. Os Gigantes já não têm força para te levarem à montanha. O Santo dos Alpes, Teresio Olivelli, camisa negra, camisa vermelha, entregou-se por um qualquer, que vinha de longe, aqui e agora, não se entregou por ti, que não existes, que não és nada, só malícia pretendente.

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