Quando era pequeno, três amigos fomos nadar para uma velha salina, em Darque, Viana do Castelo. Um de nós quase morreu afogado. Lutámos durante muito tempo para que ele viesse ao de cima. Um lutou mais do que eu e arrastou-se para a margem, desistindo. Por fim ele emergiu das águas, pobre moço franzino e feio, filho das ervas, que não conhecera nem o pai, nem a mãe e nadou como um desesperado os poucos metros que o separavam da margem. Caímos exaustos os três na margem, ninguém nos ouviria se gritássemos, ali ficámos a tremer, em silêncio, a chorar, os três.
Eu vi Saddam Hussein morrer. Um morte assim faria de Hitler, ou de Estaline, ou de Mao Zedong, justos. Sim. E começaria a fazê-los justos uma hora antes. O mistério da Morte reduz-nos a todos, como uma descoberta milenar, à condição da verdade. Os Guerreiros que viveram a experiência da Morte sabem isto muito bem. Mas nós, como loucos de Sodoma continuamos a bailar e dançar. Pior, continuamos a pensar, julgando que descobriremos a chave do Mundo. Entrei hoje na Igreja e S. Paulo falava. As profecias são parciais, o conhecimento é como uma imagem obscura no espelho. Só o Amor, que se não impacienta, que tudo suporta, que não tem rancôr, nem orgulho, que não tem interesse, permanecerá. O amor do Padre Pierre que teve a sorte de ser reconhecido, o amor talvez do Ayatollah Sistani que evitou uma Guerra ainda maior, sim e até o "amor" de Bill Clinton por Monica Levinsky. Prefiro um rapazola, que ainda tem devaneios eróticos, a mandar em mim que uma data de revolucionários moralistas. Quero lá saber da Democracia e da Justiça. Se ela não tem Amor, de nada serve.
Gosto do meu Povo de tristes, que não acertam, que não reagem, que não atinjem. Sei que quase todos, em pensamento, meteram a cabeça na corda de Saddam Hussein para que nenhuma corda pudesse enforcar um milhão de cabeças e arrebentasse. Sei que o meu Povo ouve os que defendem o Sim e os que defendem o Não em relação ao Aborto porque tentam, no fim, julgar com o coração. Uns ouvem mais os casos das mulheres que arriscam a vida para abortar, outros sabem que o Amor não existiria sem se tornar na coisa amada, por mais pequenina, por mais semente que fosse essa coisa. E sei que muitos continuarão a pensar, a pensar, só para ouvirem bem o bater do coração. Gosto do meu povo que se põe do lado do Sargento Luís Gomes que se apaixonou por uma coisa pequenina, e sei que o meu Povo ama a mãe, a brasileira Aidida e que gosta também do pai Baltazar. E sei que ouve os juristas e os especialistas para ouvir bem, muito bem, onde bate o coração. Sei que o meu Povo não toma partido para vencer o partido contrário. Toma partido, para, na sua humildade e pobreza de espírito, puder contribuir para uma boa solução. Benditos sejam os pobres de espírito porque deles é o Reino dos Céus. Que sorte que tenho de ter nascido neste Povo, ou em outro qualquer. Maria de Fátima, a jovem desempregada que morreu sozinha em Braga e que estava grávida, não chegou a dar à luz. Foi encontrada vinte dias depois, em estado de decomposição com um envelope com bastante dinheiro ao lado e o telemóvel a carregar. Maria de Fátima não deu à luz, talvez se tivesse suicidado quando o seu ucraniano partiu deixando-lhe apenas o dinheiro. Mas nós, mesmos tristes e desgraçados, ouviremos aquele telemóvel, mesmo sem ter dinheiro para comprar um. Porque não estamos sózinhos, desde o ventre das nossas mães. Que Sorte que temos em ter Esperança, Boa-Esperança.
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