4.7.06

sentimento de pertença , por Fernanda Leitao

O Portugal-Inglaterra encheu-me as medidas. Ricardo à baliza, foi ali mais do que ele, foi a vontade de todos nós. Cristiano Ronaldo, o menino que beijou a bola como quem diz “tu não me falhes”, foi ali mais do que ele: foi a crença ingénua do povo que somos. O brasileiro Scolari, rubro de entusiasmo, quase dançando, foi mais do que um grande treinador, foi ali o fio invisível que une o mundo lusófono, esse que existe onde dois seres humanos se entendam em português.

Quando o jogo acabou liguei para um amigo de Angola, como eu, o Orlando, que vive na mesma cidade que eu. Respondeu-me com a voz embargada de quem chorava. Eu fui até ao lindo e castiço Mercado de São Lourenço, em frente da minha casa, para esvaziar a tensão. Era o 1 de Julho, Dia do Canadá, e o mercado estava apinhado de pessoas alegres e descontraídas, a comprarem e petiscarem. De repente, dei com os olhos num rapagão todo embrulhado numa bandeira portuguesa, com a cara pintada com as cores da bandeira, que berrava a plenos pulmões em inglês: “O meu Portugal ganhou”. E todos aqueles estrangeiros o felicitavam, lhe davam abraços e palmadas nas costas. Fui direita a ele e disse-lhe apenas: “Lá ganhámos”. O rapagão abraçou-se a mim com as lágrimas a saltar dos olhos. E eu quase chorei. Éramos dois desconhecidos que pertenciam a uma mesma Pátria, com um sentimento de pertença sem reticências a um destino comum.