9.10.08

VIII - (Re)leituras -- Bosquejo de Europa, de Salvador de Madariaga, por André Bandeira

Ora aqui está um livro com espírito, com sabedoria. Na parte que nos interessa, Madariaga, da família de Solana, entra no campo chutando para a canela do adversário: os portugueses são espanhóis. Dá-nos um lugar autónomo entre "Gregos e Turcos" e "Judeus e Ciganos".Contudo, quando se trata de falar de espanhóis, que coloca num clube dos 5, na Europa, já não se refere ao braço direito da "Hispânia", que seria o lírico Portugal, nem o braço esquerdo (a levantina Catalunha), só fica o corpo, Castela/Andaluzia ( diga-se que este corpo, com os cabelos no país Basco e o baixo-ventre na Andaluzia, não tem pernas para andar).
Madariga, que escrevia do México, em 1951, altura do bem sucedido desenvolvimentismo franquista, tem humor, elegância, imaginação europeia. É culto, informado e veraz. Certamente que, num salão europeu, arrancaria uns suspiros e fixaria uns olhares da carneiro-mal-morto de algumas europeias. Não sei se durariam o tempo da Melanie Grifith e do António Banderas, mas, nesse tempo, não se conhecia o divórcio.
Enfim, também nos vem com um esclarecimento, útil de reler, porque já nos esquecíamos: a América Latina não é Hispano-América por causa do Brasil, e não é Ibero-América por causa do Haiti.
No meio de tanto "mikado", lá vou retirando as varinhas e fico com a ideia de que os seres humanos se fixam em vários pontos da terra, outras vezes imigram e vão ficando mais ou menos isolados, mais ou menos miscigenados. Isto não que dizer que tudo é uma misturada. Quer dizer que nada é definitivamente de ninguém. No fundo, o que Salvador de Madariaga diz é que a Europa na sua diversidade, é ainda muito dominadora.
Salvador de Madariga é, claro, um percursor da União Europeia, mas a sua "Hispânia" altaneira e esperta, é tão neurótica quanto muitos europeus. Ora Portugal, ainda tem um Império para velar, porque Tristeza tem-na muita, vinda de não se sabe de onde, vinda de não sei quando, mas neurótico, Portugal não quer ser. Nem que, para isso, se meta a bóiar num deserto azul, martelado pelo Sol.

1 comment:

Anonymous said...

"Portugal não quer ser neurótico," diz o meu caro amigo, mas quem quer sê-lo?
As neuroses ou mais século dezanovemente dito "as nevroses", não se escolhem, nem se afastam com um estalar de dedos.
Duvido que Portugal se meta voluntariamente a boiar, para fugir da neurose colectiva nesse deserto azul, martelado de sol (bonita metáfora, lá chegaremos se se deixar o Belmiro e o Lino). Porque vendo bem as coisas não há coisa mais neurótica (entendo por neurose o que entristece e tira energia) do que as saudades. Tem a ver com fatalismo, não com uma forma superior de Tragédia que tenha a possibilidade de despoletar a necessária catharsis.

Por isso, os seus portugueses de escolha de deserto azul antes que de neurose são, se os houver, um punhado. A maioria tem um deserto cinzento e atávico na massa azul, digo na massa cinzenta.

A maioria anda cosmetizada em "alegrote", o contrário do "allegro"mozartiano. P.ex. o Joâo Baião e o Malato e os Fedorentos são os profetas do alegrote, que é neurose dissimulada.

Diz e bem que Portugal tem Tristeza. Presta-se-lhe um culto imenso, de resto. A Tristeza vem do pecado, não da virtude. Que pecado enorme individual e colectivo terá sido?

E para finalizar muito obrigado pelo seu interessante post sobre o familiar do Bildeberg Solana.


Escrevendo do PC de pessoa amiga,
aqui me assino,

P. Sampayo Durões

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