11.12.14

A morte e renascimento de Camões.

 Após o final da Guerra Peninsular, num momento em que Portugal estava exangue e vivia  em regime de protetorado inglês, com o rei no Brasil, Camões veio ao de cima. Em 1817, o Morgado de Mateus criou a monumental edição ilustrada de "Os Lusíadas", na  oficina de Firmin Didot, em Paris. Em 1818, o compositor João Domingos Bontempo, criou a obra-prima "Missa de Requiem a  quatro vozes, à memória de Camões Em 1824, o pintor exilado Domingos António de Sequeira, expôs no Salão de Paris "A  Morte de Camões de que se conserva o cartão no MNAA.(foto) Em 1825 Almeida Garrett publica o poema "Camões", que inicia o movimento romântico na  literatura, tal como as obras anteriores na musica e pintura. A todos, as fortes estrofes de Camões ofereciam a expressão do pessimismo mas também  o tónico de esperança . E eram tais certezas que levavam o Morgado de Mateus a publicá-lo, Bontempo a tocá-lo,  Sequeira a pintá-lo e Garrett a cantá-lo. Quatro em um...

5.3.14

Mario Joseph, o imã que encontrou o Cristianismo no Corão

Mario Joseph, o imã que encontrou o Cristianismo no Corão
Mario José era um imã aos 18 anos. Em seguida, tornou-se cristão e o seu pai tentou matá-lo. Hoje, é um pregador católico na Índia. O seu caso é único no mundo: é o primeiro clérigo muçulmano a ter abraçado o Cristianismo, o que no mundo islâmico é punível com a morte. No cemitério da sua cidade indiana, há uma lápide com o seu nome, e por baixo dele, um caixão com uma escultura de barro de seu tamanho. O pai disse-lhe: "Se quiser ser um cristão, tenho que matá-lo." 

9.2.14

Um outro mundo - A obra de Cecília Pinto

Foto

“La vraie vie est absente” - Arthur Rimbaud
A pintora não está cá….. Mas à nossa frente desfilam como filigranas de um outro mundo os desenhos de um mundo que agora volta à luz pela dedicação de seus filhos Ana e João Pico…
A pintora não está cá….Mas à nossa frente estão os seus desenhos a branco e negro ... Estão as aguarelas de tons subtis, os óleos … e mesmo as fotos de esculturas que ficaram por terras da América.
Olhamos para os retratos que ela pintou e que nos olham de dentro das coisas...
Retratos de família, sobretudo, intimidades que fizeram sentido para quem as viveu mas que de tão poderosamente retratadas, evocam o nosso reconhecimento….
Auto retratos…. Bastantes… Porque reconhecer-se é missão de uma vida inteira e uma imagem autêntica de nós é um dos poucos presentes limpos que podemos oferecer …
E vemos surgir telas e aguarelas com profusão de temas …
Grupos de música de câmara e orquestras … Porque a música é o que mais falta faz ao mundo …Porque evoca os dezasseis violinos que havia em sua casa onde seu pai era músico e lutier.
Grupos sentados em cafés com rostos a que faltam olhos …. Não porque não vejam …mas porque o que de mais importante há para ver está ausente.
Casarios em tons suaves que se erguem nas margens de rios e ribeiros que descansam o nosso olhar… Idílios que gostaríamos de ver transpostos na selva urbana…
Muitos cavalos porque o mundo é movimento … Algumas flores de vez em quando … Poucas …. Que o mundo raramente é risonho.
E depois as cores.. Sempre maravilhosas ... Sempre trovões de cores que explodem em harmonia mesmo que os tons sejam suaves
E podemos continuar a ver … Caricaturas e cartoons onde se nota o gosto da pintora pelo concreto, dos tempos de hoje e do passado. Pelo tempo de Napoleão, da revolução francesa.
E nem faltam as notas políticas com os comentários contra o omnipresente salazarismo que tiranizava os portugueses. Ou contra as touradas. Contra o pensamento único, afinal
Os especialistas dirão das influências de mestres na obra de Cecília Pinto cuja existência discreta e cuja missão secreta é agora resgatada pela Ana e João.
Mas a todos nós pertence a sua inspiração de que um outro mundo é possível.

A pintora não está cá … Mas a sua obra, sim, e continua a inspirar-nos ….
Agosto de 2011
Após revisitar com a Nazaré Barros, a obra de Cecília Pinto
Mendo Henriques

30.1.14

CXXXIX (Re) Leituras -- Die Philosophie des Judentums, de Julius Guttmann, comments by André Bandeira


Finally, what is a jew? And why does one pose the question? There is some room for meaning. One knows that one which some fit guys, with brown shirts on and funny caps, expressed, shouting and yelling, with clubs in their hands, in the thirties, in Germany. And one knows what was the meaning when a medecine doctor, in the prophet’s tombs, decided to shoot his machinegun, at random, on the arab worshipers. But, in between, there is “jewishness”, “jewish blood”, “jewish nose and ears”,”jewish culture”, “semitic”, “semitism”, “Synagogue of Satan”, “sionism”, etc. Guttmann tells us, in this Treatise, that Religion is one thing, and Philosophy is another. It is the most capable History of jewish philosophy I ever read and a very keen History of the main philosophers with a jewish religious background. But finally, is there a “jewish philosophy”, or is there philosophy made by jews? Guttmann never lived up to write a “Theology of Judaism”. It would be interesting to see how a theological reasoning – yes, because Guttmann, despite being an orthodox jew, he was a rationalist – would impact in Philosophy. After reading the book, I think that the religious life of the jewish diaspora, did impinge in its own tribalization, but that, mostly because of the isolation jews have been condemned to, by its neighbours. It wouldn’t have been unimaginable that jewish religion spread beyond the diaspora ethnic boundaries. As a matter of fact it did, with the Kazar in Russia and with the Falasha, in Ethiopia, the most conspicuous among several cases. But it also did, in a way, with all christians. All christians may be considered a kind of jews. In a few sentences: Guttmann defines judaism as a kind of Religion which has philosophical implications. Guttmann was an Historian of Philosophy, with a philosophical expertise. But, whether Judaism has philosophical implications or not, that question doesn’t mean that judaism is a philosophy. Judaism has been so much penetrated by Platonism, Aristotelism, Kantian philosophy or existencialism, as Christianity was. As a matter of fact, it remains Maimonide and Jehuda ben Halevy, or Hermann Cohen and Rosenzweig on both of the recurring lines of division. But something we have to be prepared to, that is to consider that judaism was more philosophical than christianism, because it worked all these years within close doors. That is wrong, says Guttmann. But the hint he has, in his carefully drawn watershed, between Religion and Philosophy, leads to the conclusion that thinking within Religion – such has the one set by jewish worshipers – probably is an alternative to Philosophy ...that greek, pagan, magic illumination. Better close to God, whatever that may mean, than squirting a flash light on his own face, I say.

28.1.14

Dag Hammarskjold - A estrada



Quantas vezes as pessoas ou comunidades divididas estão tão afastadas que é necessário
 um pacificador para absorver o veneno de ambos os lados? 
Dag Hammarskjold, Secretário Geral da ONU, cumpriu esse papel . 
Foi provavelmente assassinado em 1961 durante a missão de paz que desempenhava na guerra civil no Congo ex-belga . Em 17 de setembro, Hammarskjöld embarcou para discutir um cessar-fogo com Tshombe. O DC-6B que o transportava caiu pouco depois de avistar o aeroporto. Uma investigação das autoridades coloniais concluiu que houve erro do piloto. A ONU não aceitou tal resultado. Uma pesquisa do The Guardian, em 2011, levantou sérios indícios de que o avião foi abatido, pouco antes de pousar, por mercenários ocidentais baseados na Zâmbia.. Em 2012 foi constituída uma comissão internacional para examinar o assunto.

Hammarskjöld ficou reconhecido como modelo para gerações futuras, tendo recebido o Prémio Nobel da Paz, a título póstumo. Deixou muitos escritos merecedores de leitura e reflexão. Quando de sua morte, foi encontrado o seguinte escrito: "Quando nasceste, todos riam, só tu choravas. Vive de maneira tal que, quando morreres, todos riam; só tu não tenhas lágrimas para verter".

Um seu poema A Estrada - mostra bem essa sua faceta.

A estrada, tens de a seguir
A diversão, tens de a esquecer.
A taça, tens de a esvaziar
A dor, tens de a esconder
A verdade, tens de a dizer
O final, tens de o suportar!

27.1.14

Unicidade, de Barnett Newman

Onement

Onement, I - Barnett Newman
Antes da actual  banalização  da pintura abstracta o pintor americano   criou Onement I, Unicidade . Considerava- a  a primeira encarnação  do que mais tarde chamou 'zip', uma faixa vertical de cor, sobre o qual executou muitas variações posteriores. O título da pintura é uma derivação da palavra "expiação",  significa " ser feito em um." Para Newman, o zip desigualmente pintado em um campo plano de cor não divide mas funde  a tela. Houve quem comparasse os zips às figuras esguias de Giacometti, reforçando as ligações de Newman entre as suas pintura e os corpos.

25.1.14

Sacrifício, de André Tarkovsky



Trouxe de S. Paulo, da É Realizações este belo foto-livro que narra com guião e imagens o filme de Tarkovsky,  em tradução de Anastassia Bytsenko e Adriano Carvalho Araujo e Sousa.
Uma maneira de ver a obra do artista é considerá-la uma expressão através da beleza para chegar aos outros. O cineasta falou de seu trabalho como realizador de cinema:“A grande função da arte é a comunicação, uma vez que o entendimento mútuo é uma força para unir as pessoas, e o espírito de comunhão é um dos aspectos mais importantes da criatividade artística .. .Eu não consigo acreditar que um artista apenas trabalhe para se exprimir. A expressão só tem sentido se encontrar uma resposta. Criarmos vínculos com as outras pessoas é um processo que custa muito, e sem ganho prático: em última instância, é um acto de sacrifício. E, certamente, não valeria a pena o esforço só para ouvirmos o eco de nós mesmos” (Sculpting in Time, 1986. p.39 e s.)
Aqui nesta edição , destaco o que diz a badana

“A questão de saber o que insistentemente me fascina no tema do sacrifício – dos ritos sacrificiais – tem uma resposta direta: interesso-me essencialmente, eu, homem de fé, por todo indivíduo capaz de se dar em sacrifício, quer em nome de um princípio espiritual, quer por sua própria salvação, ou por essas duas razões ao mesmo tempo. Dar esse passo naturalmente supõe de antemão a renúncia total a todos os interesses, em primeiro lugar aos interesses egoístas; aquele que é tocado age num estado existencial que está além de toda lógica, de toda causalidade "normal", livre do mundo material e das suas leis. Entretanto – ou talvez justamente por causa disso –, o seu ato acarreta mudanças evidentes. O espaço em que evolui aquele que está pronto a sacrificar tudo, e até a dar-se como oferta no sacrifício, representa uma espécie de réplica dos nossos espaços empíricos, habituais; sem que isso o torne menos real.”

Surpresas II - Arrependimento, um filme de Tengiz Abuladze




Para sondar as profundezas da noite escura da alma de um João da Cruz, ou da noite escura de Deus de Nietzsche, penetrar no mistério da Shoah em Auschwitz , pode desenterrar-se um morto, como fez Tengiz Abuladze no seu  filme de 1984, Arrependimento , a forma de mostrar o horror causado por Estaline e seus cúmplices .
Arrependimento (georgiano: მონანიება, Monanieba, russo: Покаяние)  foi filmado em 1984, mas proibido na União Soviética devido a ser uma crítica semi-alegórica do estalinismo. Estreou-se em 1987 no Festival de Cannes, ganhando o Prémio FIPRESCI, Grande Prémio do Júri e o Prémio do Júri Ecuménico.
No plano prosaico, é a história do pós-estalinismo e mesmo da perestroika com as regiões russas a tentarem libertar-se do pesadelo do passado. Mas Arrependimento é tudo menos prosaico; é um poema filmado, cheio de surrealismo. 
Tudo no filme vale a pena. Todos os personagens transportam-nos a um tempo e espaço próprios do que todos nós, fora da Geórgia, achamos que terá sido a Geórgia dos anos 50, a mesma terra onde nasceu Josef Vissarionovich Djugashvli dito "Staline", o homem de aço.Varlam, o vilão é uma mistura de Estaline e Hitler e Mussolini de aldeia, com as capacidades de um herói de ópera bufa. A música não podia ser melhor escolhida, do bufo ao heróico, do hino à alegria de Beethoven ao cântico final místico em que as vozes parecem responder à velha senhora que pergunta "Para que serve uma rua, se não conduz a uma Igreja?". Feito antes da queda do Muro, Arrependimento mostra como o Muro teria de cair.

Cheio de pormenores surrealistas,  o filme tem várias culminâncias, como a cena em que Abel aterrorizado se vai confessar a uma figura invisível., afinal o seu pai Varlam, o tirano da vila, que dele se ri. "Vieste confessar-te ao diabo!" E assim , entre medos e arrependimentos, somos levados às profundezas da noite escura de que poucos hoje falam mas que está sempre aí, na consciência.

22.1.14

Walker Percy -



Alguns anos antes de morrer, no final de uma entrevista com Robert
Cubbage , Walker Percy foi questionado sobre o segredo da sua escrita :

“Se um escritor tem um segredo, não é que ele tenha algo de especial, mas
que ele tem um nada de especial. Nestes tempos, acho eu, um escritor
sério tem de ser um ex-suicida, uma nulidade , um nada, zero. Ser um
nada é a condição de fazer qualquer coisa. Esse é o segredo.
As pessoas não sabem que escrever bem é simplesmente uma questão de desistir,
de se entregar, de deixar ir . Tu dizes: " Tudo está perdido . Pára o baile.
Rendo-me. Nunca voltarei a escrever. Admito a derrota total. Estou acabado."
O que te estou a dizer é que nada sei de nada. É uma questão de ser tão
lamentável que Deus fica com pena de ti, olha para baixo e
diz: " Ele está feito num oito. Vamos deixá-lo fazer um par de boas frases. "

( Percy, l987 “Writing in the ruins”, Notre Dame Magazine, autumn, p.31 )

É fácil substituir "filósofo" por escritor, pelo menos do tipo socrático. Sobretudo quando se tentar escrever sobre a humanidade.

21.1.14

Tivadar Csontvary - Supresas 1


Volto a publicar no Duas Cidades, após quatro anos.
Diz a Wikipedia: Tivadar Kosztka Csontváry (Sabinov, Eslováquia 5 de julho de 1853 - Budapeste, Hungria, 20 de junho de 1919), foi um pintor húngaro, dos primeiros a se tornar conhecido na Europa. Embora estimasse as suas raízes húngaras, cresceu falando uma mistura de língua eslovaca e alemão. Durante a juventude, foi farmacêutico.
Porque me surpreendeu? Porque, para mim, fala uma linguagem artística, nova, esmagadoramente bela. Não sei onde as suas experiências se encaixam em uma filosofia da humanidade. Mas sei que, pelo menos depois de ter respirado profundamente meditando a sua obra, o duro trabalho de compreensão pode recomeçar. Fica a sugestão.