1.12.08

XI - (Re) Leituras «La connaissance surnaturelle», de Simone Weil, (no Primeiro de Dezembro) por André Bandeira

Escolhi este livro num dia de Sofrimento. No primeiro de Dezembro, a um passo do Sol nascente, Portugal dói-me enormemente no peito. Somos Portugueses de um modo diferente, em que os outros são outras coisas. Vivemos numa encosta de areia, sempre a escorregar, mas o nosso quintal é o Mar do Universo, onde o Sol nunca se põe,e, portanto, onde é sempre Natal. Penso ser este a primeira razão do nosso Sofrimento e da nossa maldade: é difícil viver sem nunca encontrar uma pedra onde fixar os pés.
Simone Weil morreu jovem pouco depois de lhe terem recusado, pela última vez, ser lançada de páraquedas em França, para se juntar à Resistência. Nestes seus escritos, os últimos no Sanatório onde morreu, Simone passa por todo o saber da Humanidade que ela, como judia que era, guardara na memória, na lenda, no rito e na Razão, na teima, na obsessão, no misticismo, acho que tão antigo como o tempo das cavernas. Com Simone sabe-se seguramente que a Memória da Humanidade é mais sapiente que a mais brilhante das descobertas da Física quântica sobre a estrutura do nosso cérebro. Mas também é mais indomável, esta sapiência que aparece e desaparece naquilo que dizemos ser «sensibilidade feminina», ou «visões». Ao longo do livro, Simone reconcilia-se com todos os traumas culturais do Mundo, inclusive, para ela, os alemães. Reconcilia-se à mesa, no Presépio, com alegria, como numa ceia de Natal. O cristianismo dela é genuíno, não é converso, mas é exigente, como um Evangelho que nasceu no Antigo Testamento. Por isso se revolta contra Moisés, por isso se perde de febre na busca de Jesus. Se Jesus esteve ao lado dela, nos lençóis febris daquele sanatório, não sei. Uma das suas últimas linhas fala de alguém que a queria visitar, apenas porque ela estava tão doente e tão sem ninguém. A sua última frase fala sobre a importância de Conhecer e a sua última palavra é «Enfermeiras», talvez referindo-se ao conhecimento em eterna presença que é o de tratar de doentes e irmanar-se com eles.
Hoje, por Portugal, um Nada que é Tudo, um Reverso inverso em Espada: talvez Portugal não seja nem o território, nem um certo número de cabeças, umas que riem, outras que choram. Talvez Portugal seja um «Rei», corporizado ou não em alguém, coroado ou não, decidido ou hesitante. Sim, Portugal é uma cabeça, humana, que alguns, muito poucos seguem, como quem segura um cadáver moribundo de alguém muito amado. E, seguindo-o, com o coração coladinho ao coração vacilante, como quem guarda um flor, ou um passarinho ferido. Compaixão? Não. Paixão.

Mia Rose

Mia Rose, um valor que se afirma.. Filha de pai inglês e mãe portuguesa...!
Ainda precisa de colocar a voz .. Mas em comparação com os êxitos em inglês - cheios de tiques de adolescente - ao pegar neste clássico de Rui Veloso, mostra que é um talento fantástico...!

21.11.08

Crise nas Universidades Públicas

Crise nas Universidades Públicas
O ministro Mariano Gago, admitiu que existem maus gestores nas universidades públicas. E logo a seguir acrescentou que confia na autonomia universitária.

A autonomia assenta em três pilares – o financiamento, a avaliação e uma realidade mais difícil de definir a que podemos chamar o carácter humanista do ensino e da investigação. Quanto ao financiamento do ensino superior público a despesa aumentou muito com a contribuição de 11% para a Segurança Social. Várias Universidades entraram em rotura financeira, situação que umas enfrentaram com reforços orçamentais e outras utilizando os saldos de receitas próprias. Mas como entre 2005 e 2008, as dotações diminuíram, em percentagem do PIB, cerca de 16%”, a situação é insustentável a médio prazo. Por isso, os ex-reitores escreveram ao órgãos do poder a apelar por uma revisão da actual política de financiamento.


Mas os ex-reitores não falam que a universidade que aspira à produção, transmissão ou a aquisição de um saber autónomo em relação ao poder e ao dinheiro tem que ser governada pela investigação da verdade mais do que pela utilidade. Tal é o núcleo vivo de qualquer universidade. Se este ideal universitário é obsoleto, deite-se fora e façam-se escolas superiores. Qualquer das 10 melhores universidades americanas tem um orçamento supeiror a duas vezes todo o orçamento do ministerio português do ensino superior. Mas a força das universidades americanas, para além dos seus meios financeiros, é que souberam favorecer a dimensão antiutilitária, interdisciplinar e humanista do saber.

9.11.08

A finalidade do Estado é a liberdade


Amsterdão vai homenagear um dos seus filhos mais famosos: o judeu lusodescendente Bento de Espinosa (1632-1677), filho de agricultores de Beja que escreveu que “A finalidade do Estado é a liberdade”. A frase estará no pedestal da estátua a inaugurar a 24 de Novembro, dia do aniversário, no Zwanenburgwal onde ele viveu. Mas Espinoza ainda causa controvérsia O mayor de Amsterdão, Cohen, quer fazer o filósofo tão emblemático de Amsterdão como Erasmo é de Roterdão.
O monumento por Nicolas Dings é uma representação em granito de um icosaedro - um globo de vinte triângulos idênticos que simbolize a idéia do universo como um modelo cuja forma é dada pelo intelecto humano. A representação figurativa de Spinoza tem uma capa decorada com pardais, periquitos e rosas. Os periquitos são os animais de estimação exóticos nas árvores de Amsterdão visto que o pardal holandês está a desparecer. Os pássaros são símbolos de Amsterdão como uma cidade emigrante. As raizes Portuguesas-Judaicas do filósofo fazem dele um imigrante.
As suas idéias na tolerância religiosa e de liberdade de expressão são mais relevantes agora do que nunca quando o medo do fanatismo islâmico e o terrorismo aumentam a pressão. De acordo com Espinoza, Deus não tem num plano, está na natureza, e a Bíblia foi feita poelos povo. No seu Tractatus Theologico-Politicus (1670) escreveu: “Amsterdão progride por tudo o que a liberdade pode dar. Aqui, povos de todos os credos vivem em paz.

8.11.08

X -(Re)Leituras: A Roménia depois de 1989, de Catherine Durandin e Zoe Petre, por André Bandeira

Um livro de duas historiadoras, sendo Zoe uma antiga conselheira do ex-Presidente de Direita, que tem hoje um partido irrelevante, Emil Constantinescu. O livro defende uma tese que toda a gente receia: que a Roménia, de todos os países da antiga Europa de Leste,foi aquele onde os membros do Partido Comunista, com o seu cortejo local de corruptos e tiranos, melhor se adaptaram. E equacionam o caso do seguinte modo: Ceausescu era realmente independente de Moscovo (tese contestada pelos historiadores russos e pela Espionagem norte-americana), de tal modo que Gorbachov teve mesmo de o mandar abaixo. Neste sentido, uma massa de militares, de agentes secretos (Securitate)e de pessoas com emprego ( inclusive os mineiros) se passaram de campo e serviram as cabeças do casal Ceausescu e uma espécie de Democracia, numa bandeja, aos russos. Mas, entretanto, Gorbachov era apeado e Moscovo passava do comunismo ao capitalismo selvagem. O que ficou? Ficou a capacidade de sobreviver, ficou uma velha Roménia que, em 1941, perdeu 200.000 pessoas a combater por Hitler, contra Moscovo e, em 1944, perdeu outros 200.000 a combater pelos Aliados contra a Alemanha, tudo isto para continuar a existir. Perdoem ser ignorante mas sempre pensei que a Roménia era a sul da Bulgária, porque esta sempre foi, pelo idioma e pela Igreja, muito naturalmente afeita a Moscovo. Ora a Roménia sempre foi muito romena,na sua diversidade, com os seus costumes, a sua música, o seu idioma. Mesmo os fascistas romenos, a Guarda de Ferro, eram os únicos fascistas que, apesar de terem cometido as maiores barbaridades, sabiam morrer, sem se moverem, debaixo de bala, por fidelidade ao seu comando e ao seu ideal que não era apenas violento.
Passeando pelo centro de Bucareste, em campanha eleitoral, dou esmola a gente boa que muitas vezes vejo em Portugal nos trabalhos mais humildes e topo com menos cães vadios do que os milhares que andavam livremente antes do presidente Basescu, então na Câmara, os limpar. Lembro-me do Rei Miguel que conheci nos seus modos simples e na sua permanente postura de saber ser digno perante quem o vai trair, a qualquer momento e de qualquer lado, mesmo da família, talvez até vendendo cara a pele, e renovo o meu amor por esta terra. A Roménia ligada ao solo, triste e nevoenta, com sóis orientais que arranja formas por vezes tortuosas de sobreviver. Na realidade, a Roménia apenas parece triste, para quem deixou de ver que as terras e os países foram compostos de pessoas, sobretudo de pessoas e por pessoas, antes de tudo. E sinto, no peito, que esta terra, nos seus vales, nos seus vampiros, na sua ingenuidade, nos seus pavores, nos seus ciganos que amontam a metade da alma romena, nos seus Cárpatos,se trata apenas dum enorme tesouro, algures nas traseiras da minha casa, a qual, sem ela, parecia um precipício sobre o Mar.

27.10.08

Liza Veiga, uma estrela mal conhecida!

Liza Veiga canta MArcos Portugal, com A Orquestra de Camra de Cascais.
Em qualquer país do mundo, esta diva já estaria a actuar para multidões.

O album homónimo "Liza Veiga", vem da produtora Chiado Records produções ou NZ produções onde canta também os Beatles, Procol HArum, etc..

Se tivessemos uma politica cultural a sério seria apoiado
Parabens Liza ! Canta, até que a voz doa...:!

16.10.08

IX - (Re)leituras : Truman, de David McCullough, por André Bandeira

Esta é um biografia do Presidente norte-americano Truman, e que foi prémio Politzer em 1980. Porquê Truman? Porque os neoconservadores que fizeram do mandato de Bush Jr. um "erro ideológico" se reclamaram de Truman.
Qual é a principal qualidade de Truman, que era maçon, aceitou contribuições da Ku Klux Klan sem as assumir, decididu o lançamento de duas bombas atómicas mas proibiu a terceira e começou a sua carreira ligado à máfia irlandesa?
A principal qualidade de Truman, como o seu nome indica, foi o Trabalho. Sim, o seu nome diz "verdade" e a verdade na América da sua época, foi o Trabalho. Por isso, Truman era de Esquerda porque ninguém pode trabalhar como ele trabalhou e não deixar o coração, um pouco, nesse Moloch poderoso que é o Trabalho. Ora porque Moloch é um Titã, dos tempos arcaicos, só pode, como qualquer Titã, estar, à esquerda ou estar à direita, quer dizer, descentrado. Este Mmoloch está à esquerda, sendo irrelevante a posição de um gigante.
O mesmo se está a passar agora. O neto do movimento dos Direitos cívicos (quer dizer: anti-apartheid) que Truman institucionalizou vai provavelmente vencer as eleições norte-americanas, no mês que vem e é apenas a metade mais densa de uma mesma coisa, onde talvez a simples vantagem da juventude é decisiva.
Portanto, Obama é neto da bomba atómica e filho de J.F.Kennedy, o que significa que estamos ante uma linhagem de ferro, o ferro da espada.
Truman diz que a decisão que mais lhe custou a tomar foi a da Guerra da Coreia ( que inchou e queimou Mac Arthur) e não a da bomba atómica (que amaldiçoou o seu criador, Oppenheimer). Diz-se que a Coreia prolongou a fabulosa máquina industrial-militar( um Moloch) da América na Segunda Guerra Mundial, permitindo ao Democrata Truman cumprir o seu programa social de Esquerda. A bomba atómica foi apenas mais um golpe horrível e sabemos que os ataques convencionais, como o bombardeamento de Tóquio, deixaram tantos mortos quanto Hiroshima e Nagasaqui juntas, numa geurra horrível. A Coreia deu origem ao Vietname, e o Vietname, por sua vez, deu origem ao Terceiro-Mundismo de Chávez e Ahmenidejad.
Mas qual foi a qualidade de Truman, sem ser um Moloch? Truman resistiu a tudo e levou com tudo. O que fez durante oitenta e oito anos e oito meses foi ignorar a má-sorte. De facto, a sua asserção de que nunca teve má-sorte tem o eco duma bomba. Quer dizer: ele não teve sorte, nem boa, nem má.
Truman morreu depois de escorregar na banheira. Teve um acidente de trabalho.
E, por incrível que pareça, tendo sido um empresário falhado, duma linha de empresários falhados e passado para a política com uma "mão irlandesa", mesmo assim, fez rigorosamente o que é permitido fazer a um homem nesta era sêca como a lua: trabalhou continuamente. E, nessa indiferença à Fealadade do Mundo -- da qual foi também um personagem -- Truman tem todo o mérito.

11.10.08

Escutar Marcos Portugal

"Sugiro a primeira audição moderna da ária Beatissimae Virginis, dos Responsórios da Imaculada Conceição (a 4 vozes e orquestra) de Marcos Portugal, executados a partir dos manuscritos existentes na Área de Música da Biblioteca Nacional de Portugal. O maestro Ricardo Bernardes esteve em Lisboa, este Verão, a consultar e copiar estes manuscritos e a 27 de Agosto já estava em Washington a executar a obra. Um exemplo a seguir!"

Do Blog A Biblioteca do Jacinto

http://abibliotecadejacinto.blogspot.com/2008/09/amrica-antiga-2.html


9.10.08

VIII - (Re)leituras -- Bosquejo de Europa, de Salvador de Madariaga, por André Bandeira

Ora aqui está um livro com espírito, com sabedoria. Na parte que nos interessa, Madariaga, da família de Solana, entra no campo chutando para a canela do adversário: os portugueses são espanhóis. Dá-nos um lugar autónomo entre "Gregos e Turcos" e "Judeus e Ciganos".Contudo, quando se trata de falar de espanhóis, que coloca num clube dos 5, na Europa, já não se refere ao braço direito da "Hispânia", que seria o lírico Portugal, nem o braço esquerdo (a levantina Catalunha), só fica o corpo, Castela/Andaluzia ( diga-se que este corpo, com os cabelos no país Basco e o baixo-ventre na Andaluzia, não tem pernas para andar).
Madariga, que escrevia do México, em 1951, altura do bem sucedido desenvolvimentismo franquista, tem humor, elegância, imaginação europeia. É culto, informado e veraz. Certamente que, num salão europeu, arrancaria uns suspiros e fixaria uns olhares da carneiro-mal-morto de algumas europeias. Não sei se durariam o tempo da Melanie Grifith e do António Banderas, mas, nesse tempo, não se conhecia o divórcio.
Enfim, também nos vem com um esclarecimento, útil de reler, porque já nos esquecíamos: a América Latina não é Hispano-América por causa do Brasil, e não é Ibero-América por causa do Haiti.
No meio de tanto "mikado", lá vou retirando as varinhas e fico com a ideia de que os seres humanos se fixam em vários pontos da terra, outras vezes imigram e vão ficando mais ou menos isolados, mais ou menos miscigenados. Isto não que dizer que tudo é uma misturada. Quer dizer que nada é definitivamente de ninguém. No fundo, o que Salvador de Madariaga diz é que a Europa na sua diversidade, é ainda muito dominadora.
Salvador de Madariga é, claro, um percursor da União Europeia, mas a sua "Hispânia" altaneira e esperta, é tão neurótica quanto muitos europeus. Ora Portugal, ainda tem um Império para velar, porque Tristeza tem-na muita, vinda de não se sabe de onde, vinda de não sei quando, mas neurótico, Portugal não quer ser. Nem que, para isso, se meta a bóiar num deserto azul, martelado pelo Sol.

3.10.08

Uns e Outros


A recente decisão do General Ramalho Eanes de abdicar de receber os retroactivos a que tem direito (num valor total de cerca de um milhão e trezentos mil euros) e que os Tribunais entenderem serem-lhe devidos pelas suas pensões públicas é mais um exemplo que ele nos dá de que um povo é uma comunidade de iguais e de desiguais. O acto do General Eanes contrasta com os dos 3200 pobrezinhos que receberam casas no Lisboagate desde que o vereador Pedro Feist começou o bodo, desde o tempo do eng.º Abecasis e que atravessou qual Bloco de Cimento de Esquerda e Direita das Casinhas. O acto do General explica algum ostracismo que lhe vota boa parte da classe política e banqueira. E merecia um acto de Homenagem, uma manifestação pública de apreço. Eu começo por aqui. E se continuarmos com outras pessoas e noutros lugares, algo de bom poderá sair.

15.9.08

II- Apontamentos de Viagem, por André Bandeira

Uma Viagem a Portugal

1 -- Em Sesimbra, o cigano sem mão, tentou delicadamente vender-me uma t-shirt ( eu já tinha comprado uma, sem noção de que o côr-de-laranja vivo faz em mim uma espécie de efeito de recusa do envelhecimento). Ele, o ciganito, que no ano passado vendia tudo com um silêncio trágico, entre as mulheres, faz agora um esforço por vender mais.Sei que a compra e venda são também uma informação sagrada entre os intervenientes e ele pergunta-me/avisa-me de algo.

2 -- De novo contra a parede quente da fortaleza de Sesimbra, recupero forças, reponho os ossos, respiro fundo e distendo os nós do peito. Num encontro com esse Grande Homem que se chama Fernando Nobre, encontro uma via estranha que reza assim: juntar todos os medos, desesperos e angústias entre o diafragma e o coração. Depois é só empurrá-los, que eles caiem como uma garrafa mal equilibrada.E penso nisto passeando no jardim que Fernando Nobre acumulou no claustro interno da AMI, semeado pela mão dele, trazida dos quatro cantos do Mundo, esquecendo-me de dizer a este Homem alquebrado pelo fardo do Mundo, que aquele jardim se parece com o interior dele.

3 -- Tenho medo de visitar os meus amigos. Tenho medo de lhes mostrar o que ganho, no rosto, ante os apêrtos e angústias do mês que lhes turvam o deles.Tenho medo de não ter dinheiro para lhes emprestar, o dinheiro que eles não pedem, em carência surda. As moças vêem que vivo fora e enlevam-se de suspiros que são apenas o apelo básico a que o homem ajude a mulher, veículo de vida, a fugir da miséria. Parece que toda a juventude se prepara para partir.

4 - Conheço dois jovens realistas, o João e o Duarte. Um, corajoso e elegante, outro duro e atento. Na noite ouço-os falar e fico com Esperança. Poderá ser? Pprefiro imaginar, que, com estes, morreria em combate...

5 -- Falo com o Francisco, mendigo à beira da Basílica da Estrêla, com o seu ar humilde, limpo e amparado por Deus. Francisco foi durante muitos anos trabalhador hoteleiro, nomeadamente "garçon" na Tentadora, de Campo de Ourique. Tem 44 operações no corpo ( câncer nos intestinos) o que não o impediu de trabalhar, mas agora, uma obstrução em 70% da aorta, deixou-o a vegetar, com trinta anos de trabalho, a 200 Euros ao mês. Procura um quarto térreo, melhor para um doente cardíaco e telefono para um número, em Campo de Ourique, onde dizem que só aceitam estudantes. Ao cabo dumas palavras trocadas, o proprietário diz que não tem "racismos" e aceita falar com ele. Muito sofre este portalegrense, até quando diz com um certa vergonha que outro mendigo, africano, consegue ter o quarto pago enquanto ele, com o seu ar limpo e humilde, talvez seja demasiado verdade, para que as pessoas a possam suportar. Guardo o seu número, sempre sem crédito: 932422963.

6 -- Corro o país, sem medo dos assaltos. O meu carro é velho, o meu ar é irrelevante. Abro as mãos para o brilho dos Jerónimos, coíbo-me de fazer a saudação romana, ao Sol, ao mendigo Camões, pois - por milagre -- os meus olhos dão com um pobre mendigo negro estendido no chão, a quem sinto um impulso enorme de beijar a testa branca e enrugada.À porta de outra igreja encontro um mendigo jovem, português e pergunto-lhe se dormiu na rua. Ele diz-me docemente, sem me pedir nada: tenho problemas, prefiro não falar. Dou-lhe apenas uma leve palmada no ombro e ele aceita, sem mais, com gratidão.

7 -- Janto com a minha amiga Ana e temos a bênção de passear nas Azenhas do Mar. Somos remediados, com grandes fardos às costas. A Ana tem sempre tempo para os outros ( fôssemos Francisco e Clara!). Percebo bem o que o meu irmão me disse uma vez: ela veio cá um dia. Se ficasse mais um, apaixonava-me por ela. E, contudo, nunca seremos senão gratificados pelo amor não correspondido... porque Deus, o Misericordioso, assim quis. Amparar-nos-emos.

8 -- Vou a Fátima. Rezo por todos. Saio da Cova da Iria com a imagem negra e perplexa dessa Mulher grega que conheci. Penso que a irresolução da minha oração, é porque ela é apenas um egoísmo meu. Mesmo assim dá-me força pensar nela, pensar que Deus deu ao Mundo muita Beleza, até aquela que não é esbelta, só para que percebêssemos, que é entre as brechas do caminho pedregoso onde, de repente, se levanta o Templo luminoso de Jerusalém.

8.9.08

Uma Carta para o arraial do barrete frígio, por Manuel Alves

Uma Carta para o arraial do barrete frígio
por Manuel Alves

Sob o título "Aos Republicanos", o historiador João Medina publicou em tempos
no Jornal de Letras, uma Carta que julgo deve merecer a atenção de todos
os que, como eu, entendem que a Instituição Real é a que melhor pode
servir na Suprema Magistratura de um Estado verdadeiramente republicano e
português.

Pedindo perdão aos seus "compatriotas de barrete frígio", João Medina vem
dizer "com franqueza e sem quaisquer intuitos de desafio ou provocação, a
dois anos do centenário da data da implantação da I República", "em termos
simples, cordatos e benévolos": "... não creio que valha a pena preparar,
oficialmente, ou mesmo em meios académicos, a celebração dum mau defunto
que foi esse regime de década e meia de vigência atarantada, e que, bem
feitas as contas, teve nada menos do que 47 governos que a desgovernaram
por trancos e barrancos (...) de atribuladíssima e caótica duração, com
muitas bernardas castrenses de permeio, sedições várias, tumultos
constantes e quase sempre mais ou menos sangrentos, de atropelos à
legalidade e ditaduras disfarçadas ou às escancaras, sem falar da Ditadura
das Urnas, com o 'partido democrático' do dr. Afonso Costa (aquele homem
de Direito que foi uma vez ao Porto, em 1902, com uma soqueira, para
agredir à traição o Sampaio Bruno), mais uma participação em tudo funesta
e catastrófica nos conflitos europeu e africano, e, por fim, uma degola
que nos privou da Liberdade, com certa lógica fatal depois de tanta
bagunça, desassossego, insensatez política e falta de implementação mínima
dum regime sério de Cidadania, Educação generalizada ou Progresso
material, porquanto nem se educou o povo, nem se fez de cada português um
cidadão livre, nem se melhorou a vida dos portugueses".

A concluir, João Medina lança aos correligionários algumas perguntas: "Em
2010 vamos, em suma, celebrar o quê? O começo dum erro imenso e desastroso
para o país que somos? A nova versão da comédia offenbaquiana da monarquia
constitucional, agora em versão sanguinolenta? (...) Não seria melhor, em
vez de celebrarmos o 5 de Outubro, rezarmos-lhe um responso (laico) pela
pobre alma penada que ele foi? Antes isso do que comemorar uma República
sem republicanos, como a nossa é."

Fazemos nossas as palavras citadas do seu balanço da I República, mas
acrescentamos ao desalento das suas interrogações finais: se o que é
nefasto não se celebra, pode no entanto ser comemorado com a História
diante dos olhos, como aliás o historiador, o ensaísta, e Professor
Catedrático da Faculdade de Letras de Lisboa, acaba de fazer nos trechos
que escolhi desta Carta. Como deixou escrito D. Jerónimo Osório, nas
vésperas do nefasto 1580, "A História é proveitosa para adquirir
prudência, poderosa para despertar virtudes, saudável para sanear as
feridas da República".

5.9.08

Sarah Pallin

(Com justificação a eventuais leitores pelo texto vir em inglês ; não é snobismo; é falta de tempo para retroverter os meus contributos para o WAIS)
Answering John Eipper’s call for European perspectives on SP, I viewed her speech.
From 00.00 SP until 9:58, amid roars of applause, SP elaborates family values and presents her dear ones in a very moving way. She has a “celebrity” touch and she is emotionally persuasive. This mix of public and private issues is not palatable in any European nation, both for good and bad motives. So much family awareness would be misconstrued as a bridge to nepotism and “special interests” or protecting a dysfunctional family. On the other way, the energy she gets from family life is obvious and attuned to what is current in peripheral US regions.
14: 15 Attack on Obama as unqualified. Obama is about words. McCain is about deeds. This rethoric is useful but it may develop a blowback. SP has good words “for the common good”, and “against special interests”. Yet, a VP has much less executive power than the Governor of Alaska and no use for “veto powers”. Or is she considering the possibility of being President, just in case?
22:35. After a reference to “dangerous Foreign Powers” she (or the neocon text writer) absolutely misrepresented the latest crisis. “Russia wanted to intimidate Europe”; “Europe is at the mercy of foreign supplies”. In fact Russia is much more dependent upon UE machinery than UE is on Russian natural gas and oil, with the exception of Germany. She had not a single word for South America, Asia, and Africa. She is obviously ignorant on foreign policy.
She is immensely energetic, in all possible senses of the word, from supporting “drill” to being unbalanced. The sound-bite “The difference between a Hockey Mum and a Pit Bull is lipstick”. It sounds good for local politics. If you are behind McCain, it is an awful sound-bite. You would entrust her your dog, a babycare system, town government and, of course, Alaska; nuclear weapons, never. That said, and considering the contempt for current politicians, I think she will gain votes for the RP. Wolf Blitzer said that, exceptionally, her speech had 42 million viewers. I agree with Michael Sullivan that SP “electrifies people”; for the time being, not in the electric chair.
I have not yet seen Mc Cain’s speech but one thing is obvious. He will get votes by being presented as a moderate “patriot”, not a “nationalist”, which is the European profile of Sarah Pallin. Good electoral tactics!

2.9.08

Fim de Férias!


Francoise Hardy Jacques Dutronc Le Music via Noolmusic.com

1.9.08

Balanço sobre Solzhenitsyn - com vista para os acontecimentos da Geórgia

morte de Alexander Solzhenitsyn produziu reacções muito previsíveis dos comentadores ocidentais. Basicamente jornalistas e opinion makers, disseram isto: “Foi um gigante moral ao expôr os males soviéticos no arquipélago Gulag; mas a sua estatura moral ficou depois comprometida por se transformar num nacionalista russo a desconfiar do Ocidente”. Nunca gostou do Ocidente, equiparando-o aos mercados livres ou à cultura Pop.”

A maior parte destes comentários revelam mais sobre os respectivos autores do que sobre Solzhenitsyn. É a geo-ideologia de que Ocidente e democracia são sinónimos. ‘Ocidental’ aparentemente já não significa a tradição das clássicas Atenas e Roma e as religiões judaica e cristã.

Há aqui grandes equívocos. A começar com os mercados livres. Uma das medidas da liberdade de um mercado são os impostos. A taxa única do IRS na Rússia é de 13% , metade dos 25% dos E.U.A, e 1/3 dos mais de 40% da Europa continental. Quanto a cultura Pop, a Rússia tem em abundância, infelizmente.

Quanto aos comentários que desacreditam como inadequada a visão de Solzhenitsyn de uma “sociedade mais espiritual” e os seus julgamentos duros e antiquados “de nacionalista” que se parece com a propaganda soviética, são comentários de arrogantes mas atrasados mentais.

 Reli o ensaio de Solzhenitsyn de 1995, The Russian Question at the End of the Twentieth Century. No livro Solzhenitsyn quase não se refere à religião que, sabemos, levava muito a sério. O que emerge é uma posição política extremamente simples e poderosa, idêntica à de Pat Buchanan, A Republic not an Empire, ou do libertário conservador Ron Paul, ou mesmo desse cowboy liberal William Ramsey Clark.

Solzhenitsyn ataca ferozmente trezentos anos de história russa. Só escapam a imperatriz Isabel, 1741-1762, e o Czar Alexandre III, 1881-1894. A coerência é evidente: opõr-se às aventuras imperiais a expensas da população russa. Antes de búlgaros, sérvios, Montenegrinos, seria melhor a Rússia pensar em Bielorussos e Ucranianos: a mão pesada do império privou-os de desenvolvimento cultural e espiritual; a tentativa da grande-Rússia prejudicou a Rússia. Aferrar-se ao império contribuiu para a extinção do povo.

Após o horror do comunismo, veio o caos relativo do post-Comunismo. O problema não é que a URSS quebrou – isso era inevitável. O problema real é que a dissolução ocorreu ao longo das fronterias leninistas. Em poucos dias, a Rússia perdeu 25 milhões de russos étnicos, 18% da nação, e o governo aceitou esta derrota.

O Leninismo criara as chamadas repúblicas Soviéticas, nacionalismos falsos que não correspondiam a realidades étnicas: Os Kazakhs são uma minoria numérica no Kazaquistão. A Ucrânia é uma colecção de antigas províncias russas (Kiev) e algumas ucranianas. Isto aconteceu quando a URSS foi dissolvida unilateralmente em Dezembro de 1991.

E esta é a chave da hostilidade ocidental para com Solzhenitsyn. O homem que ajudou o Ocidente a destruir o comunismo recusou dobrar o joelho às tentativas ocidentais de destruir a Rússia.

18.8.08

Saakashvili, criminoso de guerra e aventureiro tem ser julgado!

Boa parte do que se vê e ouve na comunicação social portuguesa sobre a Geórgia sofre da doença infantil do jornalismo: fontes viciadas; blogues políticos nem comento, porque não tenho tempo para ler.

As fontes que interessam ( ocidentais em Moscovo) permitem traçar em 18 de Agosto um quadro fiel embora incompleto do que foi o conflito da Geórgia.
Centenas de cidadãos ossetos mortos (as reivindicações russas de milhares são exageradas), Tskhinvali em ruínas, centenas de soldados Georgianos mortos, forças armadas Georgianas destruídas, milhares de deslocados, o mundo em agitação, por causa das ambições pessoais de um cleptocrata asiático, Saakashvili, disfarçado de democrata ocidental.
http://www.militaryphotos.net/forums/showthread.php?t=139150&page=69

Analistas militares dizem que a guerra esteve tremida durante dois dias.. A Ossetia sul é separada da Rússia pelas cadeias de montanhas mais altas da Europa, e a única estrada atravessa o túnel vulnerável de Roki. Não havia força do exército do russo em Ossetia sul. Nenhuns tanques. Foram precisas 24 horas para mover os tanques através do túnel, enquanto Tskhinvali era pulverizada pelo bombardeamento em tapete Georgiano e o exército Georgiano ocupava toda a região. A força aérea Georgiana tem alguns Su-25 aviões de ataque ao solo similares ao A-10 com quatro toneladas de bombas. Poderiam ter tapado a entrada ao túnel de Roki durante dois dias antes dos russos estabelecerem a superioridade aérea. Mas a estupidez, ou erro estratégico, ditou a vitória russa.

No primeiro dia do conflito, o exército Georgiano controlou quase todo a Ossetia sul, e defendia-se o sufiiente para abater quatro aviões russos. Mas os Georgianos nem tentaram obstruir o túnel de Roki. Se quisessem ganhar, concentrariam os esforços em capturar ou obstruir a entrada ao túnel, em vez de destruir Tsinkhvali. " A menos que os oficiais sejam recrutados em hospitais pisquiátricos, nunca poderiam pensar em manter o território que conquistaram. Não se sabe porque iniciaram a invasão, mas não queriam conquistar a Ossetia."
Diz-se que a Geórgia atacou a Rússia para captar simpatia ocidental e entrar para a OTAN. Saakashvili (a) pensou que os E.U.A. se apressariam a ajudar; e (b) pensou que pôderia vencer. Há uma opinião geral que o ataque foi muito estúpido. Os E.U.A. não têm força na região; levariam semanas a mobilizar e já estão presos no Iraque e no Afeganistão"

A outra teoria, que Saakashvili pensou na vitória é mais crível e mostra aventureirismo.

A explicação real é a fragilidade de Saakashvili. Quase foi corrido do poder no Outono de 2007. Aguenta-se com o apoio de algumas cliques neoconservadoras norte americanas, cada vesz mais isoladas. A sua reivindicação principal é que só ele é respeitado no Ocidente. A sua propaganda é, que se for corrido, o Ocidente não apoiará a Geórgia contra os russos. Tal como os generais argentinos com as Malvinas, fugiu para a frente, para uma aventura militar. Os Georgianos odeiam-no pelas suas provocações. " É um outro incidente de Khurcha [onde as forças Georgianas metralharamum autocarro cheio de eleitores na frente das câmaras de televisão no dia de eleição mas à escala internacional.
http://www.geotimes.ge/index.php?m=home&newsid=11796,
Agora que morreram centenas de soldados Georgianos e já não existe a maioria do equipamento e da infra-estrutura militares, a Geórgia depende mesmo do Ocidente! Mas a Rússia é o maior parceiro comercial; e onde vive 20% da população. Saakashvili tem de ser preso, julgado por um tribunal internacional e deixar que georgianos e russos façam a paz, consolidada em inúmeros interesses comuns.

9.8.08

Silly Season II

Já passou muito tempo desde que Mary Ann Evans " tinha de arranjar um nome de homem "George Eliot" para fazer passar os seus escritos fantásticos de mulher. Em estilo ligeiro, pungente mas igualmente maravilhoso é o que faz a jovem cantora francesa Rose. Tem estilo.

7.8.08

I - Apontamentos, por André Bandeira

1 - Leio "A Imitação de Cristo" e confesso ter medo de assumir aquilo tudo. Diz Tomás de Kempîs que "não te falta o bom conselho e a força", quando as coisas estão de feição. Mas mal "uma tribulação te bate à porta" já me sinto fraco...

2 - Na Missa tardia onde vou, há de tudo, claro, à entrada da Igreja acompanhando os passos de Jesus que cai e, muitas vezes, tenho de combater os pensamentos maliciosos ou atrevidos que me mordem como moscas. Reconheço que clips, videos, notícias, revistas e até livros fizeram em torno de nós, como que um "esqueleto nervoso" que se articula quando julgamos dominar-nos completamente. Não é nossa culpa mas não podemos ignorar. Tudo me é lícito, dizia S. Paulo. Mas nem tudo me convém...

3 -- À entrada da Missa tardia onde chego atrasado, segue uma mulher à frente e outra atrás. Dizem que a missa é lugar de mulheres. Eu sou responsável por uma e também por uma menina que o será, um dia. Num relance, tento perceber: a mulher da frente é uma belga que deve ter sido bonita, em tempos, guardou um toque "hippie" na sua clareza. A de trás é escura, emigrante. Refulge o seu olhar de marfim na sombra de ébano, com o brilho de medo rasando em volta. Lembro-me então: na missa se acolhe uma grande fragilidade humana, como nas horas de visita de um hospital e estas duas mulheres lembram-me que é grande fragilidade, desde tempos imemoriais, transportar dentro delas, esta casquinha de noz no oceano do universo, a que chamamos vida.

4 -- Relembro as mulheres orgulhosas, violentas, das ruas da minha civilização, mas não quero criticar, pois o mundo já está tão cheio de lágrimas. Lembro-me das pobres mulheres de Mogadischiu que estavam a varrer a rua, quando uma bomba as atingiu. Não faço raciocínios fáceis sobre quem pôs lá a bomba, nem tão-pouco, teorias da conspiração. Não há de certeza nenhuma crença que justifique a violência sobre esta coisa tão frágil que é a vida, sobretudo a vida destas pobres mulheres miseráveis que varriam a rua para ganhar uns tostões que uma Organizaçao internacional lhes oferecera.

5 -- Ouço o meu coração a bater, à noite, na solidão, como se tivesse um animalzinho aninhado ao peito. Parece que ele já não corre muito bem, como dantes usava correr. Lembro-me de um chavão: de tanto bater, um dia parou. Um coração a bater num ponto qualquer do Universo, que coisa tão frágil! Está certo que olhe para o chão, mesmo quando vou com pressa, para não pisar um insecto, fugindo em ziguezague à minha frente.

31.7.08

1º Master de Verão em Política


Foi concluído com êxito o 1º Master de Verão em Política do Instituto da Democracia Portuguesa.
Alguns resultados podem ver-se aqui.

O proximo MAster deverá ter como exórdio a personalidade de Salgueiro Maia como me lembraram hoje:



"Aquele que na hora da vitória
Respeitou o vencido
Aquele que deu tudo e não pediu a paga
Aquele que na hora da ganância
Perdeu o apetite
Aquele que amou os outros e por isso
Não colaborou com a sua ignorância ou o vício
Aquele que foi "fiel à palavra dada e ideia tida"
Com antes dele mas também por ele
Pessoa disse"

Sofia Mello Breyner

23.7.08

Capitão Ahab




A disciplina de Relações Internacionais ameaça tornar-se a preferida do Conselheiro Acácio.
A enorme massa de platitudes que infesta as revistas de geopolítica, relações internacionais e ciência politica, algumas transexuadas de jornalismo, é de fazer vómitos. Os ditos especialistas que se colocam em biquinhos dos pés para nos recitar como vai o mundo desde Vestefália e qual vai ser o próximo espirro de Condoleeza Rice ou o traque do novo senhor do Kremlin, são de enjoar; a suficiência bronca com que nos debitam cenários que nunca acontecem fora da cabeça deles, e de mais alguns centos de fotocópias da Universidade de Georgetown, é assustadora.
Para variar radicalmente gostaria de trazer o que ainda não vi nenhum embora decerto que uma pesquisa google o faça aparecer de tal modo é óbvio; ter modelos literários para analisar as relações internacionais.
O que me fez pensar nisso é o paralelo entre Moby Dick e o Terrorrismo, entre o capitão Ahhab e George (vai-se embora) W. Bush.
São bem conhecidas as análises de como o romance Moby Dick significa a externalização do mal; converte-se o mal no absolutamente outro para que o eu seja o bem. E nesse processo o capitão Ahab ( um nome elementar, básico, bushiano) perde a alma, os seus marinherios perdem a vida e tudo termina numa enorme tragédia como os acontecimentos contemporâneos do baleeiro Essex que inspirou o grande escritor americano.
Esta simplicidade de que só os grandes escritores são capazes para sondar a alma humana é decisiva para analisar George W. Bush. È muito mais verosímil do que os supostos actores, agentes, entrosamentos, redes, factores do potencial, cenários, e muitos outros pluses e minuses do jargão das RI. Perceber que por detraá das grandes causas que arrastam o mundo também ( ou sobretudo, isso é para debate) existem as pequenas causas da personalidade humana que nasce e morre sozinha. Mas pelo meio vive em comunidade e é a esta que deve prestar contas. Moral: Ler Moby Dick é ler o maior fantasma jamais concebido pela alma americana que renasceu com George Bush, é ler como melville profeticamente sabiaA uma certa América que caminha para o fim do império como sucedeu a outros impérios criados “como quem os desdenha”, ou seja, by default.

17.7.08

Pontos e vírgulas



O grande polemista Karl Kraus escrevia muito sobre a correcção do alemão por volta de 1901. E um dia disseram-lhe. "Então o senhor escreve sobre onde colocar pontos e vírgulas enquanto Pequim está a arder. ?" Decerto adivinham a resposta: " Se colocassem os pontos e vírgulas no sítio certo, Pequim não estaria a arder." Posto isto entregaram a Casa dos Bicos à Fundação Saramago

15.7.08

Margarida vai à fonte...!



A 15 de Julho de 2007, António Costa era eleito presidente da Cãmara nas eleições intercalares na Câmara Municipal de Lisboa.
Um ano depois, Margarida Vila-Nova, Mandatária para a Juventude de António Costa, numa sessão organizada pelo PS Lisboa veio afirmar corajosamente que "NO PASA NADA". E que eco teve nos OCS ? Que eco não lhe deram ? Afinal a direita dos interesses aliada à esquerda das palavras de ordem trata bem dos seus arranjinhos. Nem a explosividade sensual- política de Vila-Nova arrebenta com isso.
Eu que modestamente andei fazendo campanha pelo PT e que aprendi o que tinha a aprender de campanhas, saúdo este gesto de Margarida e por mim dou-lhe eco.

14.7.08

Barrilaro Ruas morreu a 14 de Julho de 2003



Tinha de ser. Tinha de morrer a 14 de Julho, o velho bardo da monarquia portuguesa com a memória exacta dos acontecimentos porque lhes conhecia o peso específico. No campo político, pela sua acção e livros contribuiu para o descomprometimento dos monárquicos com o salazarismo. Autor de obras sobre temas históricos, eclesiásticos, literários, pedagógicos, e de ensaio político, a que se junta uma vasta bibliografia dispersa por revistas, dicionários e enciclopédias, o essencial da obra de HBR foi o de chamar a atenção para os fundamentos das questões de identidade nacional como ressalta na sua monumental edição de Os Lusíadas que contém materiais indispensáveis para reconfigurar a interpretação da obra, como sejam o “discurso a D. Sebastião” que atravessa a epopeia, a «imagem pessoal» de Camões, ou os silêncios sobre a história de Portugal.
Muyito mais ele fez mas, por isso mesmo, apenas aqui deixo esta evocação
"Em todas as culturas ( ou civilizações) e apesar do espírito crítico e das revoluções da mentalidade, sempre a Monarquia guardou algum vestígio ao menos do revestimento (ou substância) do sagrado que deriva em linha recta da sua originária experiência religiosa"
H. Barrilaro Ruas - Do artigo Monarquia na Enciclopédia POLIS

13.7.08

Homenagem ao Bispo do Porto


Associo-me e pedi que me representassem nesta cerimónia! E há uns anos atrás escrevi, juntamente com o António Amaral sobre António Ferreira Gomes e a sua Carta.

HOMENAGEM DE COIMBRA AO BISPO DO PORTO D. ANTÓNIO FERREIRA GOMES NO 50º ANIVERSÁRIO DA CARTA A SALAZAR
Em 13 de Julho de 2008, próximo domingo, ocorre o 50º Aniversário da Carta a Salazar, escrita pelo Bispo do Porto D. António Ferreira Gomes.

Cidadãos de Coimbra, conscientes da importância política que teve na luta pela Democracia essa Carta, assinada um mês e cinco dias após as eleições presidenciais ganhas pelo General Humberto Delgado, surgida do interior de um dos pilares do Estado Novo, a Igreja Católica, a qual levou ao exílio do País o seu autor, entendem prestar Homenagem a quem teve tão profundo acto de coragem, que o Estado Democrático reconheceu ao atribuir-lhe a Grã Cruz da Ordem da Liberdade.

Convidam-se todos os que se queiram associar a esta Homenagem Cívica, a divulgá-la e a nela participar, sendo portadores das respectivas condecorações.

Dia – 13 de Julho, próximo domingo
Local – Monumento ao 25 de Abril, Rua Antero de Quental, praceta junto ao edifício da ex – PIDE/DGS

Início – 11h00
Intervenções –
11h15 – José Dias – colaborador da Fundação Inatel, Movimento Cívico Não Apaguem a Memória
11h30 – Amadeu Carvalho Homem – professor da Universidade de Coimbra, Alternativa Associação Cultural para o Desenvolvimento do Ser Humano
11h45 – José Manuel Pureza – professor da Universidade de Coimbra, Comunidade de Acolhimento João XXIII
Encerramento – 12h00


Nota – Carta a Salazar e biografia de D. António em www.fspes.pt
Coimbra, 08 Julho 07
Amadeu Carvalho Homem, José Dias, José Manuel Pureza

6.7.08

Novilíngua


O futuro ou já o presente?
Eu axo q os alunos n devem d xumbar qd n vam á escola. Pq o aluno tb tem direitos e se n vai á escola latrá os seus motivos pq isto tb é perciso ver q á razões qd um aluno não vai á escola. primeiros a peçoa n se sente motivada pq axa q a escola e a iducação estam uma beca sobre alurizadas.
Valáver, o q é q intereça a um bacano se o quelima de trásosmontes é munto montanhoso? ou se a ecuação é exdruxula ou alcalina? ou cuantas estrofes tem um cuadrado? ou se um angulo é paleolitico ou espongiforme? Hã?
E ópois os setores ainda xutam preguntas parvas tipo cuantos cantos tem 'os lesiades', q é um livro xato e q n foi escrevido c/ palavras normais mas q no aspequeto é como outro qq e só pode ter 4 cantos comós outros, daaaah.
Ás veses o pipol ainda tenta tar cos abanos em on, mas os bitaites dos profes até dam gomitos e a malta re-sentesse, outro dia um arrotou q os jovens n tem abitos de leitura e q a malta n sabemos ler nem escrever e a sorte do gimbras foi q ele h-xoce bué da rapido e só o 'garra de lin-chao' é q conceguiu assertar lhe com um sapato. Atão agora aviamos de ler tudo qt é livro desde o Camóes até á idade média e por aí fora, qués ver???
O pipol tem é q aprender cenas q intressam como na minha escola q á um curço de otelaria e a malta aprendemos a faser lã pereias e ovos mois e merdas de xicolate q são assim tipo as pecialidades da rejião e ópois pudemos ganhar um gravetame do camandro. Ah poizé. tarei a inzajerar?


Verdadeira ou falsa, esta composição de um aluno do CEF-9ºANO reflecte uma parte do ensino secundário na novilíngua que corresponde ao "fechamento da mente portuguesa". Eric Blair (aka George Orwell) analisou o fenómeno no "1984" em 1952. Anthony Burgess escreveu o mesmo em 1962 no Orange Clockwork que deu origem a um dos grandes fimes da história do cinema e de Stanley Kubrick. Allan Bloom em 1992 analisou o fechamento da mente americana. A crise há muito que anda por aí. Agora, até estamos no momento de catársis , de reconhecimento maciço do que se passa. A nossa época já não acredita em ideologias porque a ciência desmistificou os respectivos fundamentos unilaterais; mas - há sempre uma mas - continua a viver e pensar segundo categorias ideológicas sem um pensamento matricial capaz de acolher contributos dispersos por metodologias diversas.

3.7.08

Então, para que serve a Lusofonia ?


A nossa COMUNICAÇÃO SOCIAL ESTÁ DOENTE, com excepções. O grave não é só o dinossaurismo de Miguel Urbano Rodrigues e demais avantistas, bem referido por Jorge Ferreira. O grave é que estando em jogo a vida de um luso descendente pouco ou nada se preocupou durante cinco anos com os movimentos e petições que corriam, pela Lusoesfera nos Estados Unidos e na Venezuela e em Portugal.

Entre as noticias da libertação de Ingrid Betancourt veio agora o destaque do jovem luso-americano Marc Gonsalves, filho de Josephine Rosano e do luso-descendente George Gonsalves, descendente de emigrantes madeirenses por parte do avô e de açorianos por parte da avó. Estava refém desde 13 de Fevereiro de 2003 quando foi capturado pelas FARC- Colombia após ser abatido o avião no qual se deslocava numa missão de controlo do narcotráfico na província de Caquetá, na selva da Colômbia, durante uma operação de vigilância ao cultivo de coca - não sabemos se daquela que costuma desembarcar no aeródromo de Tires...

Mas houve quem se tivesse mexido antes e não foi noticiado. João R. Crisóstomo, reconhecido pela defesa dos portugueses radicados nos EUA, bem como dos Direitos Humanos – e que em 2004 liderou uma grande homenagem internacional a Aristides de Sousa Mendes –, lançou a ideia entre os clubes e organizações luso-americanas nos Estados Unidos de uma petição a 3 de Abril que foi entregue.  João Paulo Veracruz, presidente do Centro Social Madeirense de Valência, João Sidónio Rodrigues, presidente do Centro Marítimo de Venezuela, Fernando Silva, presidente da Casa Portuguesa da Arágua e o presidente do Centro Português de Caracas Juan Gonçalves, apelaram ao "Governo português a avançar com gestões para ajudar a este luso-descendente que está sequestrado e reforçar o apoio a qualquer português, do mundo inteiro" que eventualmente seja sequestrado. Tal como não se falou dos negócios de Américo Amorim na ida do primeiro ministro a Caracas, também não se falou destes pedidos a José Sócrates.

Agora o drama chega ao fim e Gonsalves volta a Casa.Devido a outros meios.  Fico contente.  MAs a Lusoesfera mexeu-se e em Portugal quase não se falou dela. É de esperar que fique a lição que não haverá mais silenciamentos quando houver capturas de outros portugueses ou luso descendentes por esse mundo fora. Mas então, para que serve a Lusofonia ?

2.7.08

Espaços Verdes




O jardim do Palácio Galveias em obras vai ser de novo visualmente tapado. Em vez de deixarem Sá Fernandes, o Vereador dos Espaços Verdes manter o jardim com um gradeado protector para o público o poder desfrutar visualmente, os serviços de Cultura de que depende a Biblioteca Municipal no Palácio Galveias impuseram que se refizesse o muro anteriormente existente, cortando aos olhos do público este espaço lisboeta. E assim se corre o risco de perder o que aos cidadãos pertence ...

30.6.08

c. O Monge-Guerreiro de Kamakura, por Eric Voegelin

A resposta ao post anterior mostra alguma incompreensão do que é luta. Remeto para duas fontes obrigatórias: Fernando pessoa e o seu peoma guerreiro -monge e a peça de igula título que sairá no nosso vol vol 03. cap. 4. c. de Voegelin que começa a entrar no prelo

vol 03. cap. 4. c. O Monge-Guerreiro de Kamakura

As ordens militares na sociedade ocidental tiveram de ceder o lugar à cidade e ao estado nacional. Contudo, o desaparecimento precoce não deve obscurecer a importância intrínseca do fenómeno. Em circunstâncias mais favoráveis, como por exemplo no Japão, na mistura do monge e dos ideais do guerreiro determinou durante séculos o carácter político da civilização. Por coincidência histórica, a introdução do budismo Zen no Japão, patrocinado pelo shogunato de Kamakura está em paralelo com a ascensão das ordens militares no Ocidente.

A fusão peculiar do misticismo e do esteticismo Zen com as virtudes guerreiras de lealdade, resistência e obediência deram forma à vida da classe governante guerreira de Kamakura porque a dinâmica da política japonesa naquele tempo seguiu um percurso oposto à do Ocidente cristão.[1] As ordens ocidentais sucumbiram porque as novas e fortes unidades políticas, emergiram a partir do campo feudal do poder. O ideal japonês do Monge-guerreiro venceu porque a vitória do clã de Minamoto e o estabelecimento do governo militar em Kamakura encerrou o período do governo imperial central moribundo, copiado das instituições chinesas, e iniciou a idade feudal japonesa (1192). As ordens militares do Ocidente, além disso, não podiam evoluir para uma elite governante porque o celibato monástico cortava a base vital que é a exigência inevitável para a continuação de um grupo secular governante; a atitude espiritual militar japonesa poderia crescer como uma força política estável porque a base vital era uma sociedade vitoriosa de um clã guerreiro.

 



[1] Sobre Zen veja Daisetz Teitaro Suzuki, Essays in Zen Buddhism, 1ª série (Londres: Luzac, 1927); 2ª série (Londres: Luzac, 1933); 3ª série  (Londres: Luzac, 1934). Reimpressão: Londres: Rider, 1970; e Teipei: Ch'eng Wen, 1971.

 

29.6.08

Peter Schlemihl....

Houve uma boa resposta ao post da Maria Luísa Guerra 
" P - Qual o futuro dos licenciados em filosofia, e de todos os licenciados em "humanísticas"? R - Call Centers."  
A pergunta seguinte é: Qual o futuro dos Call Centers? 
A questão é muito mais ampla do que emprego de uma classe; é de escolha de paradigmas de sociedade.  
Quando os vendedores de automóveis dizem " A minha filosofia de vendas é..." prestam homenagem ao conceito embora não percebam nada do conteúdo. Desvalorizar a filosofia, nos curriculos universitários, nos curriculos liceais, na aprendizagem ao longo da vida é esquecer que ela é a sombra da vida e que todos os nossos argumentos estão permeados de conceitos, valores, pressupostos.
Há quem queira viver sem a sombra, como o Peter Schlemihl. Por exemplo no debate do petróleo e dependência de combustíveis. Pode debater-se o preço do crude nos poços, o hedging nas refinarias, a distribuição, o ISPP, o IVA e a GALP, as sete irmãs e a Branca de Neve, se necessário também. Mas de nada adianta se não se colocar a condição prévia: por que razão escolhemos uma sociedade que depende de um produto cujo acesso não controla ?  
Curiosamente: lutar pela filosofia, tornou-se hoje lutar pelo bom senso.

28.6.08

Maria Luísa Guerra - O assassinato da Filosofia


Vai realizar-se no próximo mês de Julho, em Seul, na Coreia, o Congresso Mundial de Filosofia, organizado pelo FISF, organismo que concentra as sociedades dos professores de Filosofia do ensino secundário e do ensino universitário de todo o mundo. Tem a marca da globalização. É um encontro de tradições pedagógicas, de reflexão sobre a natureza e o papel da Filosofia na sociedade. Mostra o interesse dos vários países pelo problema. Mostra o que é evidente: o carácter vivo e actuante da Filosofia. O seu lugar insofismável na formação da mentalidade. Assim acontece no mundo.


E em Portugal? Em Portugal assiste-se ao inédito. Pela primeira vez em mais de um século (desde a reforma de Jaime Moniz, em 1895) destruiu-se decisivamente a Filosofia no ensino secundário. Podemos recuar mais atrás, a 1844, e mesmo aos Estudos Menores, criados pelo marquês de Pombal em 1799. Estudos onde figurava a disciplina de Filosofia Racional. Servia de acesso aos Estudos Maiores. Neste quadro de interesse global já referido, lembra-se também que a UNESCO instituiu o dia 15 de Novembro como Dia Mundial da Filosofia, congregando 36 nações. E em Portugal? Em Portugal desvaloriza-se o exercício do pensamento, o rigor da análise, a descoberta de paradigmas e de valores, a discussão de problemas, a formação do espírito crítico, a reflexão sobre a aventura humana, parâmetros específicos da Filosofia e do seu ensino.

Sabe-se que a finalidade do estudo em qualquer disciplina não é o exame. Mas também se sabe que, na prática, se não houver exame, os alunos não se interessam. Não estudam convenientemente. Residual e em vias de extinção a Filosofia no 12.° ano. Obrigatória no 10.° e 11.° anos mas não sujeita a exame nacional. "Para que serve?" pensam os alunos.

É uma disciplina decorativa. Sem importância. Morta à nascença. Ainda se rege Filosofia na universidade nalguns cursos, cada vez mais despovoados. Com este vazio no ensino secundário, acabará de vez.

O sucesso escolar não é gratuito. Depende de currículos apropriados, mas depende sobretudo de cabeças bem-feitas, treinadas numa apurada e progressiva ginástica mental, no exercício da abstracção, da comparação, do dissecar analítico. Esse exercício cabe especificamente à Filosofia.

No limite, pela depuração que exige e supõe, aproxima-se da Matemática. Não é por acaso que grandes filósofos de referência (de Pitágoras a Descartes, de Leibniz a Russell) foram matemáticos. Tirar aos jovens esta ginástica mental é criar o caos. Multiplica-se no mundo a presença e o interesse pela Filosofia. Em iniciativas globais. De Paris a... Seul. Em Portugal, desvaloriza-se até a morte. Original. 
[Público de 28/06/2008, sem link aberto ao público]

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23.6.08

VII-- Re(leituras), The End of Faith, de Sam Harris, por André Bandeira

Este livro de Sam Harris, mereceu, quase em circuito fechado, o seguinte comentário de Richard Dawkins, autor the "A desilusão de Deus" (ou ilusão): "Leiam o livro e acordem!". O livro começa por ser uma lufada de ar fresco contra o fanatismo religioso. Argumenta muito de uma forma lógica bivalente ( se se concede numa proposição que algo é, então, na segunda proposição, o seu contrário não é, ignorando que quando se muda de proposição, se muda também, muitas vezes, de contexto, e até se desvia, em vez de mudar realmente). Harris começa por descascar forte e feio no Islão, argumentando de um modo persuasivo que não há islâmicos "moderados" e que certas crenças são perigosas. Descasca depois no judaísmo e no cristianismo, invocando o Holocausto. Termina por propôr um orientalismo extra-mediterrânico (ilustrado até pelas pequenas percentagens de apoiantes dos atentados suicidas, registados na Indonésia) em que elogia e avulta toda a riqueza das tradições budista e hindu. Remata, na sua lógica bivalente -- descrita atrás -- por opôr Misticismo a Fé. "Fé", em Sam Harris, é algo que quase devia ser proibido, na medida em que vende os motivos, a acção e as consequências por atacado, enquanto o Misticismo tem regras como as de um manual. O livro perfila-se ao lado daquele de Dawkins e do outro, de Paul Berman ("Terror and Liberalism", 2003), que foi a grande tomada de posição da Esquerda Norte-americana contra o "islamo-fascismo", refundando-se na tradição liberal, e que será de certeza retomada por Barack Obama. Sam Harris, na sua criatividade vocabular, opõe ao pragmatismo norte-americano, o seu "realismo", o qual pretende jogar com a objectividade final dos valores éticos. Diz algo muito curioso, na sua arte de polemista (diga-se que um pouco "jovem"): quando os valores éticos são objectivamente agredidos, então ninguém se deve admirar que espectador racional deixe de ouvir ou conversar. Bom conselho...
Curiosamente, Sam Harris, que cita António Damásio e parece seguir a senda de Eric Kendal, na busca norte-americana de uma "Ciência da Consciência", acaba por se contradizer sem disso se aperceber, mesmo antes de partir para a etapa final: acaba por dizer que os valores éticos objectivos são construções que têm necessariamente de arrancar de "crenças" e, por conseguinte, negar o valor da crença é, mais que irracional...é inviável. Quer dizer: esta ou aquela crença repugnam-lhe mas não a crença em si, que prefere obter sob a forma de fluido, em vez de plasma, mergulhando em vez de acender. Enfim, parece-me que Sam Harris procura fundar a Fé por outras vias, que não o deslumbramento. O facto de ter sido publicado graças à sua desassombrada colecção de factos quanto a diversos fanatismos religiosos, fá-lo cair no erro em que nós, leitores de jornais, caímos frequentemente: o que parece óbvio -- porque o seu contrário parece obviamente falso -- tem um fôlego curto, a que a publicidade e as urgências da decisão pública, juntam uma certa cegueira própria do excesso de claro/escuro. Como se a Realidade fosse um fato de Pierrot, agitando-se constantemente, de todos os lados, à nossa volta.

15.6.08

A mensagem é:

Não preciso de perceber de futebol para considerar Luiz Felipe Scolari um cretino.
Quebrar uma dinâmica de vitória da Selecção A com uma Selecção B, como se os AA's estivessem muito cansadinhos é de "Sargentão" não é de "General". A mensagem é que não é preciso dar tudo por tudo. Deixa para lá: o Chelsea já contratou e ele dará tudo pelo Chelsea. Tive relutãncia até em ver o jogo. Vi alguns minutos. Parabéns À Suíça. Se até o moral dos pés vem abaixo, pobre Portugal no Verão.

14.6.08

Um Não que é um Yeah!

Para além dos gostos e desgostos eurofóbicos e luso-porreiristas, registo um facto geopolítico: nunca o Departamento de Estado norte-americano aplaudiu um único aprofundamento europeu ! Mas em todo o momento insiste no alargamento (Turquia, Ucrânia, Geórgia). É quase o mesmo que dizer a alguém: coma à vontade, que não precisa fazer ginástica! Quanta gente na Irlanda se chama Bush, Kennedy e Clinton ???? (admito que Obama deve haver poucos)... A comunicação social inundada por Reuters e IP nem tem tempo para indicar isto. Acordem, que o mundo é global e complicado! O Não da Irlanda, por 110.00 votos, também é um Yeah americano...

31.5.08

VI- (Re)leituras: " A World Restored " de Henry Kissinger, por André Bandeira

Esta é a Tese de Doutoramento, de 1964, daquele que foi o Ministros dos Negócios Estrangeiros de Nixon e lhe sobreviveu até hoje. Com mais de oitenta anos, Kissinger, filmou um spot publicitário a seguir ao ataque às Torres Gémeas de Nova Iorque em que corria e se atirava para o chão, naquilo que se chama "home run", do baseball, isto em homenagem à resistência da América ao Terrorismo. Mais recentemente, Kissinger, com George Schultz, William Perry e outros ex-Ministros dos Negócios Estrangeiros de ambos os grandes partidos norte-americanos, veio defender a abolição completa das armas nucleares. Sinais dos novos tempos que aí estão...
Que diz a Tese de Kissinger? A tese de Kissinger pode resumir-se em várias frases, como quem faz um holograma, onde, de todos os pontos de vista se vê sempre o conjunto todo. A mais famosa é a de que a legitimidade é precisamente aquilo de que não se fala e que funciona na mesma. Legitimidade não é justiça. Já o Direito diz que há a sucessão legítima e a sucessão legitimária, quando não se respeita a legitimidade, porque se esta não é respeitada, então faz-se respeitar, achemo-la ou não justa. E tem força de Lei mas tem muita mais força que isso.
Contudo, o que Kissinger exprime verdadeiramente neste livro é a diferença entre o revolucionário e o "legitimista", ou seja: o revolucionário exalta-se, o conservador qualifica-se. Mas, ao contrário do que se pensa, o revolucionário impõe-se, primeiro a si mesmo e, depois, aos outros, enquanto o conservador se legitima. Ora, se a legitimidade não é justiça, o que o livro quer dizer é que a justiça acaba sempre por perder.
O livro trata de Castlereagh, o lorde inglês que reprimiu a Irlanda pró-napoleónica e que foi um aliado menor de Metternich, o Príncepe austríaco que enterrou Napoleão mas também enterrou o Antigo Regime. Engraçado, não é? O homem conservador e da legitimidade acabou por aplicar Napoleão aos bocadinhos e a Europa acabou por ficar toda constitucional, o que quer dizer que se legitimou de outro modo e continuou injusta. O conservador não mudou algumas coisas para que tudo ficasse na mesma, mas manteve quase tudo para que de facto algo mudasse. Mas a Justiça não é mudança, é retorno, o que quer dizer "Revolução". Ou seja: o contrário de "mudança".
Kissinger declarou, não há muito tempo, na Alemanha que quem mais admirava era Bismarck, o unificador da Alemanha, aquele que dizia à sua mulher sentir-se como um anjo caído, com a beleza dos antigos anjos, mas sempre insatisfeito neste mundo, sem nunca encontrar paz. Kissinger é de origem austríaca. Ele e Bismarck esqueceram-se de dizer outra coisa sobre os anjos caídos: é que a Nostalgia é o nome da maior das suas dores. Quem tem nostalgia nunca perderá, ao contrário da Justiça que sempre se arrisca a perder, mas também nunca ganhará, como a Esperança, que só morre depois de morrermos. A nostalgia tira-nos da frente de batalha e as palavras estão todas trocadas. Há quem tenha prazer a pô-las todas no seu devido lugar, porque as palavras são apenas o início de uma conversa. Mas quem tem apenas prazer, é um patusco e as brincadeiras de uns fazem a dor de muitos.
Enfim: porque é que Castlereagh, um dos raríssimos britânicos que foi europeu, se suicidou? Porque quis repôr, em nome da Justiça, algo que não tinha que mudar mas que tinha apenas de se equilibrar e perdurar. Napoleão era sem dúvida um grande sedutor e Metternich fez-lhe o serviço. Kissinger faz-nos o serviço de dizer que só depois de Castlereagh se ter suicidado se revelou a sua enorme solidão, ao longo de toda a vida.
Pois é. Porque quem retorna em nome da Justiça não tem companhia. O abismo da solidão é o sêlo negro da Esperança, que é o contrário da Nostalgia. E assim caímos, como Homens e não como Anjos: caímos para cima.

9.5.08

Lançamento


Uma causa saborosa... acho eu...!

Não tenhais medo, por Pedro Cem

Lembro-me às vezes desta frase de João Paulo II. Está explicada por enquadramento, quando o Papa visitou a Polónia, ainda a do Pacto de Varsóvia e a gente, sempre católica, vinha falar com ele (até os dirigentes) exprimindo aquilo que desejavam mas não conseguiam fazer. Penso que foi, nesta altura, sobretudo quando ele se despediu dos dirigentes que sabiam ter um arma apontada à cabeça, que a frase lhe surgiu. Muitos a tinham dito, em diversas situações, aos berros numa batalha, numa barricada, a caminhar para o cadafalso, ao deitarem-se numa mesa de operações, ao compôrem o casaco antes de um encontro, ao alinharem em frente ao pelotão de execução, ao atrvessar um ermo escuro todos os dias, depois de um duro dia de trabalho. Não tenhais medo, repete-se dentro da minha cabeça.Não pergunto porquê. Como o meu amigo Mário Teixeira, frade fradinho, sindicalista e eremita e agente de viagens me dizia: tem confiança. Confiança em quê, perguntava eu e le dizia-me: só confiança. Mais nada.
E agora lembro-me a propósito de nada, outra coisa que me anda a bater na cabeça, o rumor de Roma, algures no séc. I D. C. quando toda a gente comentava que a bela Dama patrícia Lavínia tinha fugido com um pobre desafortunado gladiador, que lhe devia dar pelo ombro, o "Sergulo", e que se pode traduzir mais ou menos por "Serginho". E diz a lenda que nunca mais foram encontrados e que viveram felizes o resto da sua vida. Dizia ainda o rumor de Roma" Como era possível? O pobre Sergulo que tinha o corpo tão coberto de cicatrizes que parecia deformado e nem metade do nariz tinha, que lho tinham cortado num combate".

3.5.08

E não havia ninguém


Primeiro perseguiram os comunistas e eu nada disse - porque eu não era comunista.
Depois, perseguiram os socialistas e eu nada disse - porque não era socialista.
A seguir, perseguiram os sindicalistas e eu nada disse - porque não era sindicalista.
Depois perseguiram os judeus e eu nada disse - porque não era judeu.
Por fim perseguiram-me - e não havia ninguém para falar por mim. Martin Niemöller

22.4.08

V - (Re)leituras: "Das Spektrum Europas" de Keyserling, por André Bandeira

Hermann Von Keyserling escreveu em 1928 este perfil dos Povos da Europa, mas em 1931 acrescentou-lhe um capítulo sobre Portugal. Keyserling era tido como um ensaísta, um generalista que dizia muitas coisas gerais que pareciam verdade, todas pouco comprováveis ( e, talvez ouvindo falar de Colombo, dizia que Marco Pólo era português). Keyserling era considerado um Spengler mas sem pessimismo. Quando morreu, no Tirol, em 1946, este aristocrata báltico de cultura sueca, tinha visto a Europa toda,,de frente e de verso, e acreditava que ao mundo acontecia uma tragédia, de "quatro em quatro semanas", como as térmitas, mas que o futuro seria "ecuménico". Na aparência, que foi o seu Meio, teve razão. Sobre a sua comunidade, digamos que era daqueles da época de trinta a dizer que se tinha de combinar Sócrates com o Tao,ou Platão com Vivekaananda.
Sobre Portugal: começa por dizer que nunca viu tantos superlativos de cortesia como entre os Portugueses ( sic. Unamuno) tais como Excelência, "Vossa Senhoria", etc. Que ninguém falava tantas Línguas tão bem como os Portugueses. Que não havia nenhuma diferença entre Espanha e Portugal, excepto a negação total de Portugal feita a Castela,negação de resto partilhada pelos Galegos ( repete o episódio também ouvido das Invasões francesas, em que o Super-Poder do Duque de Alba entrando em Portugal, em 1580, numa ponte da fronteira, deparou como um indivíduo que de chapéu na mão lhe barrava o caminho e se aproximou dele dizendo " esteja tranquilo que eu não lhe faço mal"). Onde o castelhano era orgulhoso e brutal, o português era humilde e mesquinho. Também nunca vira tantos diminutivos, como numa canção em que a Morte era tratada por "a mortinha". A equação portuguesa era insolúvel, Portugal "uma varanda sobre o infinito". Nunca vira uma tão grande combinação de tipos raciais, onde todas as combinações e reaparições eram possíveis. O português era o mais explosivo dos caracteres europeus. Assim, Portugal só superou as suas contradições no Império, quando chegou ao máximo da combinação de um máximo de caracteres díspares. Só dois Povos, segundo Keyserling, se assemelhavam aos portugeses na Europa: os alemães, porque a sua "Sehnsucht" era a única coisa europeia comparável à Saudade, esse mecanismo para assentar em algo harmonioso, quando a desarmonia do Presente se reconhecia insuperável. E, acima de tudo, os Gregos: Portugal era grego ( Grécia qual, aliás, para Keyserling era o Sul da Rússia, acrescentando muito curiosamente que as discussões com Sócrates eram tão insuportáveis como aquelas que mantivera com estudantes de Moscovo -- só então me dei conta com a semelhança do busto de Sócrates com um velho russo). Portugal, como os Gregos, cultivava um passado eterno e glorioso, só para acabarem no total caos da realidade. Com uma diferença: os gregos acabavam no caos dos paradoxos intelectuais. Os portugueses, acabavam no caos dos paradoxos emocionais, o qual disfarçavam com um total virar das costas ao estudo do coração e um apêgo teimoso, mesquinho, ao Objectivo.
Keyserling tem muita razão e dá-nos porventura uma chave para o tempo horrível que Portugal atravessa: caos emocional.

19.4.08

Luís Filipe Meneses e o Cardeal de Retz





“Acredito firmemente que são necessárias maiores qualidades para ser um bom chefe de partido do que para ser um bom imperador”, disse Retz e mostrou-o Meneses.

Cardeal de Retz – Teoria da Conspiração 1ª parte
Perante a desconsoladora repetição dos comentadores políticos nacionais, vejo-me obrigado repetir clássicos. Não creio que seja presunção mas sim o efeito de revolta contra a presunção satisfeita e a miopia ideológica que ataca quase todos os nossos encartados e publicitados comentadores nacionais. Reduziram a política à ideia de manobra e conspiração. Mas será que conhecem mesmo os recantos desta visão teatral que tem um lugar indispensável mas subalterno na vida política? Acho que devemos todos reler o Cardeal de Retz.


Sainte Beuve dizia que só conseguia ler dois autores: Maquiavel e Retz. Porquê? Qual a razão de Paul de Gondi (1613-1679) coadjutor, e depois Arcebispo de Paris e Cardeal de Retz ter ganho um lugar na história das ideias políticas?

Retz entrou na história pela sua actuação no tempo da Fronda, a revolta contra a monarquia francesa, entregue então às mãos manipuladoras do Cardeal Mazarino. Eram tempos novos, de ruptura com a velha ordem. Está a terminar a harmonia medieval das autoridades difusas. E cada autoridade política quer definir os seus poderes, se possível por escrito. Era a revolução de Cromwell em Inglaterra, e as revoltas contra os reis Áustrias, das quais a única com sucesso foi a revolução de 1640 em Portugal. Richelieu morreu em 1642. Em 1647 o Parlamento de Paris recusou um édito de Mazarino. O crescimento da autoridade do estado e os problemas financeiros são os mesmos por toda a parte. E de um modo geral, vai falhar em toda a Europa a tentativa de estabelecer a monarquia limitada.

Retz é o conspirador que defende a velha monarquia limitada, apoiado no Parlamento de Paris. Este tinha o poder de aprovar as ordenações régias de natureza legislativa e financeira, a fim de adquirirem a força de lei. Era composto por cerca de 200 membros que formavam a cabeça de um corpo de 40 mil funcionários que reunia a magistratura judicial e financeira de toda a França. Organizadas em Câmaras mas reunindo em plenário para aprovação de assuntos de Estado, eram as cabeças das 40 mil famílias que representavam a França comercial e industrial.

Segundo Retz, a monarquia assentava num equilíbrio entre vários poderes, sendo virtuoso que os poderes do rei não estivessem fixados por escrito. Era uma monarquia temperada pelos costumes dos Estados Gerais e dos Parlamentos, uma monarquia que navegava entre a prepotência régia e a libertinagem popular. O “mistério do estado”, as prerrogativas do rei, não deviam ser rompidas. Não deviam , mas estavam a ser.

A teoria da conspiração de Retz assenta na criação de poder político através da imaginação. O poder do Parlamento, diz, assenta na imaginação: “Eles podem fazer o que acreditam que podem fazer, chegados a um certo ponto”. Contudo, a imaginação não trabalha por si própria; requer esforço e há um longo caminho a percorrer “ desde a veleidade à vontade, da vontade à resolução, da resolução ``a escolha de meios, da escolha de meios à sua aplicação”.

Se a imaginação se apoiar em acção pode ser fonte de sucesso. Neste sentido, Retz é o primeiro conspirador moderno, o agitador profissional que aprecia as jogadas políticas e as desenvolve como uma arte da manobra: “Acredito firmemente que são necessárias maiores qualidades para ser um bom chefe de partido (chef de parti) do que para ser um bom imperador”.

13.4.08

a voz portalegrense

Chamada de Atenção para A Voz Portalegrense, de Mário Casa Nova Martins , um excelente blog de actualidade cultural e política, irradiando do Alentejo

9.4.08

Coragem e Solidariedade

Posso não gostar de touradas mas gosto da Coragem e Solidariedade dos Forcados

3.4.08

IV- (Re)leituras. A Paixão, de Mel Gibson, por André Bandeira

"A Paixão", do realizador e actor australiano Mel Gibson tem alguns truques conhecidos. O uso, porventura das línguas originais, a caracterização dos legionários romanos como alguns lúbricos solteirões italianos, a possível piedade da mulher de Pilatos por Nossa Senhora e Maria Madalena, o grande traço que Jesus desenha na areia durante o episódio da condenação da mulher adúltera, a exclusão de Barrabás, os dois ladrões demasiado caracterizados, o Diabo como uma bruxa irlandesa e seu filho careca. O costume é dizer que Mel Gibson está cheio de referências àquelas coisas que algumas seitas preferem acrescentar ao Evangelho.
É possível que sim. Mas, por trás dos efeitos especiais, há o traço pessoal de Mel Gibson. O traço pessoal de Mel Gibson está na caracterização de um Jesus fisicamente forte, de um Jesus que parece desses australianos que bebem até cair, aos fins-de-semana, na Austrália, que vê tudo ao contrário quando é arrastado (sendo que faz parte do "ver ao contrário", recordar-se dos episódios da Sua Vida), que consegue sobreviver a todos os golpes até enfrentar a Morte. O desespero do Diabo passa-se num deserto sêco como o da Austrália, o desespero de Judas passa-se ao pé de um cadáver de cavalo, como os limites da colonização anglo-saxónica no deserto aborígene.
O plano da ressurreição de Jesus é bonito até se O ver sair, ao nível das pernas, da sepultura, no plano final. Há nisto tudo muito de um Mel Gibson idolatrado pelas mulheres, conhecido pela sua timidez irreparável ( Mel Gibson -- que é famoso pela candidez das suas declarações -- casou-se apenas graças a uma Agência, tendo sempre repetido que era incapaz de falar a uma mulher de quem gostasse), envolvido quando era mais novo em tareias de bar monumentais e finalmente nu, num leito de pedra.
E agora, por trás de todas estas marcas pessoais, que demonstram o Cristo que há em nós e também em Mel Gibson, o filme "a Paixão" não deixa de nos recordar, a uma segunda leitura, que para além dos que as palavras significam num texto, há uma condição comum a todos nós que é aquela da Paixão de Jesus. Por isso, para além de tudo aquilo que um filme de um ano deixará evaporar-se no éter, há uma mensagem bem humana, sobretudo naquele "flashback" ao Sermão da Montanha em que Jesus diz que "ao contrário, eu digo-vos que rezeis pelos vossos perseguidores", porque de outro modo "não haveria nenhum mérito". O possível para os Homens, o impossível para Deus.

2.4.08

Uma carta à América




David Boren, actual presidente da Universidade de Oklahoma, e ex senador e, governador acaba de publicar Carta à América, com 112 páginas para responder à pergunta, "Durante quanto tempo podem os EUA permanecer o super poder mundial?" e para que os americanos não se tornem em " nação de especialistas bárbaros."
Embora optimista, Boren acha que os problemas só podem ser resolvidos se desaparecer o partidarismo que domina a vida política americana. Tempos houve em que dominava o bipartidismo de Arthur Vanderburg e Mike Mansfield .
Actualmente, somente quatro ou cinco senadores em cada partido são moderados num total de 100. E há o cinismo crescente do público.
Em 1976 o custo da campanha presidencial era $67 milhões. Em 2000 era de $344 milhões e, em 2004, $718 milhões. O custo médio de uma campanha para Representante era de $53.000 em 1974, e de $773.000 em 2004. O custo médio de uma campanha para senador era de $437.000 em 1974 e $5.4 milhões em 2004. E os candidatos recebem mais de metade do dinheiro dos comités de acção política (PACs). O livro contém outras observações sobre o déficit, a instrução, a política externa, a classe média, o ambiente e a necessidade de conhecimento da história

30.3.08

Situação no Iraque

Na semana em que se desencadearam
as guerras intra shiitas, Bagdad está a tremer que Bassorah comece a arder.
Os 4100 britânicos no aeroporto de BAssorah são um alvo mas não servem para fazer a diferença. Será a Operação Assalto Final do presidente Maliki um erro tremendo porque não permite recuo e a ser derrotada é o descrédito sem apelo ? Ou será um golpe de poker bem jogado, agora que Bush já nada tem a perder. A operação "vietnamização da guerra" tem a marca de Richard Cheney e dos neocons. Deverá acabar do mesmo modo.

28.3.08

Conhecer pelo andar...!

De Luís Brum
http://bagosdeuva.blogspot.com/2008/03/conhecer-as-mulheres-pelo-andar.html

Um antigo jornal espanhol apreciava assim a mulher pelo andar:
A que bate com os tacões, deitando o escritório a baixo, tem um génio a quem o demónio resiste.
A que anda nos bicos dos pés, é zelosa, curiosa, viva, impressionável e algumas vezes impertinente.
A que assenta a planta do pé é descansada, alegre, risonha e de bom carácter.
A que mete os pés para dentro, é maliciosa, pouco animada e pouco sincera.
A que deita os pés para fora, saracotando-se com desenfado, é capaz de comer uma vitela e negar até que o sol dá luz.
A que anda de peito saído e apertada de cintura, é dominante, presumida e não se impressiona com coisa alguma.
A que anda de cabeça baixa olhando para o chão, está disposta a enganar pai, mãe, irmãos o mundo inteiro.
A de cabeça levantada tem a massa encefálica empoeirada e o coração cheio de estopa.
A que se balanceia para um e outro lado, não conhece a modéstia nem ao menos pelo avesso.
A que pela rua se vai mirando, só gosta dela mesmo.A que é simples e só olha quando é necessário, sem fixar demasiadamente, que não anda depressa nem devagar, nem direita nem curvada, sem demasiados enfeites, é uma grande mulher.
Esta legislação minhas senhoras é claro que vigorou só na Espanha...Nada de sustos...Antigamente em Espanha conheciam as mulheres pelo andar.Em Portugal, em 2008, como conhecer as mulheres?

20.3.08

Dois Pensadores

Hoje, dia dos tambores de guerra do Iraque, quero comemorar Agostinho da Silva, um profeta da paz messiànica. E porque ele não está isolado, vou buscar o que já escrevi em Aproximação e um outro avatar da sabedoria ocidental - Bernnard Lonergan"Homenagear Agostinho da Silva é combater este apartheid entre filosofias e entre filosofias e outros saberes. E em homenagem a Agostinho da Silva proponho-me aproximá-lo a um outro grande pensador, Bernard Lonergan, também à margem da tradição académica dos professores de filosofia e dos filósofos profissionais. Ambos são provocadores de ideias mais do que doutrinadores, e ambos assumem a tradição originária de apelo à sabedoria que é inseparável da experiência humana.São dois pensadores com percursos muito diferentes ­- dir-se-ia o dionisíaco e o apolíneo - mas também com muitos paralelos. O português que vai para o Brasil que é “Portugal à solta” e que regressa ao solo físico da pátria de onde nunca saiu espiritualmente. O canadiano que vem para a Europa em Inglaterra e Roma, onde adquire o saber que levará de volta para as Américas. O leigo que faz figura de profeta espiritual e o sacerdote que escreveu uma melhores hermenêuticas das ciências humanas. E nas suas diferenças, ambos peregrino por uma verdade maior.Sobre Agostinho da Silva creio que, neste Congresso, nada é preciso acrescentar mais que uma sua conhecida e deliciosa auto-definição: «Claro que sou cristão; e outra coisas, por exemplo budista, o que é, para tantos, ser ateísta; ou, outro exemplo, pagão. O que, tudo junto, dá português, na sua plena forma brasileira».Sobre Bernard Lonergan cuja obra Inteligência; um ensaio sobre o conhecimento humano, aqui anuncio como em vias de ser publicada em português, introduzo-o de uma forma ingrata às reputações contemporâneas: um sacerdote jesuíta, um professor da Universidade Gregoriana, um canadiano formado na velha Europa mas que pede que cada um de nós pense por si mesmo. "