27.9.09

XXX - (Re)leituras - As Identidades do Brasil 2 - De Calmon a Bomfim. A Favor do Brasil: Direita ou Esquerda?, de José Carlos Reis, por André Bandeira

Este livro do historiógrafo de Minas Gerais José Carlos Reis é uma boa introdução a quem quer aprender a identidade do Brasil. O livro analisa a identificação feita do Brasil por Pedro Calmon (romântico e cristão); Afonso Arinos («pessimismo ultra-conservador»);Oliveira Vianna (proto-facismo); Manoel Bomfim (esquerdismo zapatista). A análise estende-se ao longo do Século XX.
Uma coisa há a dizer, seguramente: a questão da raça e das maldições que o conceito acarreta, desde logo a quem não pode deixar de a considerar como critério, são uma constante tão viva na identificação do Brasil, que nem um analista esforçado, como é José Carlos Reis, a pode evitar. Sem o saber, parece-me que o autor é um mendeliano, sempre a reparar em caracteres (origem, costumes) que vão reemergindo aqui e ali, sem obedecerem a «forma» ou evolução. Não admira, por isso, que um dos autores estudados, Oliveira Vianna, defendesse o constrangimento das «raças inferiores», nomeadamente os negros, num país multirracial a que ele pertencia por inteiro, sendo que o seu isolamento pessoal não era o de um misógeno, mas o de um erudito.
Um outro aspecto curioso é o de Bomfim, o qual, de simpatias socialistas libertárias, não é um utópico, num país onde não se pode passar muito tempo fechado. A Esquerda brasileira ignora-o desculpando-se com o seu tom apaixonado, o qual só o é, porque Bomfim é do melhor que o Pensamento do Séc.XX pode articular e a Inveja existe. A Esquerda brasileira ignorou-o porque Bomfim é o elo perdido entre Extrema-Esquerda e Extrema-Direita, a qual funcionou em muitos mais lados do que na América latina e que não existe porque os extremos se tocam, mas porque os extremos não se tocam, antes divergem dum mesmo ponto como a ponta de uma navalha corresponde à adaptação de um projéctil.
Esta obra de José Carlos Reis deixa, contudo, uma coisa bem clara: não há Brasil sem Portugal. Mesmo que Portugal desaparecesse, mesmo que a encosta ibérica, do extremo ocidental do arquipélago luso desaparecesse -- por exemplo vendida a Espanha -- ficaria qualquer coisa que não pertence a Portugal, o Português, género e Língua, o qual não é bom nem mau, mas que teve uma arte e um labor tais, que o tornaram uma das grandes facetas da Humanidade moderna. E esta?... o Português como um «gene» não é fácil de apreender. Se calhar é o segredo dos genes para sobreviverem: não e deixarem apreender. Poder-se-ia dizer mesmo que não é «Português» quem quer...

2 comments:

Sergio de Camargo said...

Já é mais do que tempo de terminar com esse doentio narcissismo de pensar e repensar a identidade do Brasil, à maneira de um esquizofrênico. O Brasil tem que entrar na maturidade intelectual, se quiser ter alguma pretensão mundial. É só no contributo para o pensamento universal que o Brasil se poderá afirmar um dia como verdadeira potência. E longe de nós falar de raça ou coisas do gênero, o que apenas é a prova substancial do servilismo e atraso mental de quem não quer aceitar-se como é.

mch said...

Sergio,

Do que li -- e o autor parece-me muito atento -- as quatro tendências analisadas acabam por deixar (o autor) um bocado exasperado. No que ele lê, apesar dos exageros dos autores estudados, não deixa de haver uma grandeza de um país bem identificado mas também sementes de violência. Por isso ela acaba por dar razão a Gilberto Freyre, considerando este último o mais sensato. O problema é que, nos quatro autores estudados, assim como em algumas passagens do próprio José Carlos Reis, há uma série de seduções poderosísssimas, que desviam a atenção da sua análise e que parecem ainda ser um problema. Uma dessas seduções é a da raça e eu temo que o mau nacionalismo, num mundo globalizado, venha a ser substituído por um racismo subtil, em que ninguém estará tranquilo em nenhum lugar.

Obrigado pelo comentário,

André