19.4.08

Luís Filipe Meneses e o Cardeal de Retz





“Acredito firmemente que são necessárias maiores qualidades para ser um bom chefe de partido do que para ser um bom imperador”, disse Retz e mostrou-o Meneses.

Cardeal de Retz – Teoria da Conspiração 1ª parte
Perante a desconsoladora repetição dos comentadores políticos nacionais, vejo-me obrigado repetir clássicos. Não creio que seja presunção mas sim o efeito de revolta contra a presunção satisfeita e a miopia ideológica que ataca quase todos os nossos encartados e publicitados comentadores nacionais. Reduziram a política à ideia de manobra e conspiração. Mas será que conhecem mesmo os recantos desta visão teatral que tem um lugar indispensável mas subalterno na vida política? Acho que devemos todos reler o Cardeal de Retz.


Sainte Beuve dizia que só conseguia ler dois autores: Maquiavel e Retz. Porquê? Qual a razão de Paul de Gondi (1613-1679) coadjutor, e depois Arcebispo de Paris e Cardeal de Retz ter ganho um lugar na história das ideias políticas?

Retz entrou na história pela sua actuação no tempo da Fronda, a revolta contra a monarquia francesa, entregue então às mãos manipuladoras do Cardeal Mazarino. Eram tempos novos, de ruptura com a velha ordem. Está a terminar a harmonia medieval das autoridades difusas. E cada autoridade política quer definir os seus poderes, se possível por escrito. Era a revolução de Cromwell em Inglaterra, e as revoltas contra os reis Áustrias, das quais a única com sucesso foi a revolução de 1640 em Portugal. Richelieu morreu em 1642. Em 1647 o Parlamento de Paris recusou um édito de Mazarino. O crescimento da autoridade do estado e os problemas financeiros são os mesmos por toda a parte. E de um modo geral, vai falhar em toda a Europa a tentativa de estabelecer a monarquia limitada.

Retz é o conspirador que defende a velha monarquia limitada, apoiado no Parlamento de Paris. Este tinha o poder de aprovar as ordenações régias de natureza legislativa e financeira, a fim de adquirirem a força de lei. Era composto por cerca de 200 membros que formavam a cabeça de um corpo de 40 mil funcionários que reunia a magistratura judicial e financeira de toda a França. Organizadas em Câmaras mas reunindo em plenário para aprovação de assuntos de Estado, eram as cabeças das 40 mil famílias que representavam a França comercial e industrial.

Segundo Retz, a monarquia assentava num equilíbrio entre vários poderes, sendo virtuoso que os poderes do rei não estivessem fixados por escrito. Era uma monarquia temperada pelos costumes dos Estados Gerais e dos Parlamentos, uma monarquia que navegava entre a prepotência régia e a libertinagem popular. O “mistério do estado”, as prerrogativas do rei, não deviam ser rompidas. Não deviam , mas estavam a ser.

A teoria da conspiração de Retz assenta na criação de poder político através da imaginação. O poder do Parlamento, diz, assenta na imaginação: “Eles podem fazer o que acreditam que podem fazer, chegados a um certo ponto”. Contudo, a imaginação não trabalha por si própria; requer esforço e há um longo caminho a percorrer “ desde a veleidade à vontade, da vontade à resolução, da resolução ``a escolha de meios, da escolha de meios à sua aplicação”.

Se a imaginação se apoiar em acção pode ser fonte de sucesso. Neste sentido, Retz é o primeiro conspirador moderno, o agitador profissional que aprecia as jogadas políticas e as desenvolve como uma arte da manobra: “Acredito firmemente que são necessárias maiores qualidades para ser um bom chefe de partido (chef de parti) do que para ser um bom imperador”.

2 comments:

Anonymous said...

Muito interessante a afirmação do Cardeal de Retz que diz que o poder (do Parlamento) asssenta na imaginação. Isso a meu ver deve-se contrastar com a afirmação de Maio 68 (afinal válida para qualquer partido) "l'imagination au pouvoir."

Quem diria que o antepassado de um dos grandes slogans de Maio 68 era o Cardeal de Retz?

Nulle novo sub sole?

Quanto a Meneses não tinha carisma nenhum e quanto a ideias... enfim,nada de exaltante. Nem os que aí vem, seus sucessores eventuais todos muitos certinhos, hábeis nos golpes de rins dos bastidores da política prometem seja o que fôr. Uns desolam, Ferreira Leite (voz horrível, de esgoto, um político precisa de um quantum de beleza, de energia...)- Outros são os históricos fossilizados... Vamos infelizmente por falta de iamginação ter mais do mesmo no imenso, amorfo e xanaxado centrão que abrange praticamente todo o espectro político.

Como bem diz o MCH: os clássicos! leiam primeiro os clássicos! Eu também aconselharia aos putativos delfins a leitura de O Príncipe , de Maquiavel (Blair leu-o, Napoleão anotou-o) e de Bellum Galia, de Júlio César. Aos nossos aspirantes falta-lhes de modo gritante uma cultura histórica mínima, e é sobretudo por isso que não são capazes da verdadeira e nova novidade, a que empolga e transforma.

Ou seja, no tocante a dirigentes políticos em Portugal, temos mais mortos! A juntar aos que reinam. Se as coisas continuarem como estão que coisa mais deprimente. O cemitério no poder.

O que irrita, porque há gente muito interessante em Portugal, capaz de fazer a diferença. De fazer Portugal que atravessa agora um dos seus quase cíclicos e clássicos eclipse das suas reais capacidades de formaçao histºorica mias antiga da Europa.

Havemos de sobreviver claro, e com uma certa ponta de cinismo, "de rigueur", até é divertido ver o espectáculo dos compères do jogo político. O pior é que estão a comprometer anos decisivos a tantos de nós.


Cumps,

Alexandre Paim

mch said...

Obrigado AP, creio que ampliou as minhas sugestões. De facto o Cardeal de Retz é um dos teoricos da conspiração em que mais piada e realismo de 3º nível encontro. A descrição dele da eleição do papa nos 1650's é mais divertida que um número de circo