5.8.05

Porquê o Brasil não foi um "espelho quebrado"?



RICARDO VÉLEZ RODRÍGUEZ escreveu recente artigo a destacar sobre UM PRECURSOR DO PENSAMENTO ESTRATÉGICO LUSO-BRASILEIRO: SILVESTRE PINHEIRO FERREIRA (1769-1846)
“Silvestre Pinheiro Ferreira foi quem pensou as instituições brasileiras, surgidas da confusão criada pela vinda da família real portuguesa ao Brasil, logo no final da primeira década do século XIX. Esse processo de nascimento de uma nova nacionalidade culminaria com a independência da colônia brasileira em face da metrópole portuguesa.
O processo de libertação em relação à Metrópole não significou, no caso brasileiro, esfacelamento da unidade do novo País-Continente, levando em consideração que a nossa Independência consolidou-se de dentro do Estado para fora, ao contrário do que aconteceu no universo hispano-americano, pulverizado em inúmeras guerras civis que terminaram retalhando o imenso Império Espanhol na América, sem que conseguisse ser criado oportunamente um pólo de unidade. A própria Monarquia foi, no Brasil, a realizadora da Independência e o pólo centralizador que possibilitou a construção do Estado Nacional. Esse enorme feito deve ser tributado ao pensamento estratégico de homens da lavra de Silvestre Pinheiro Ferreira. (...)
O efeito dessa magna obra criativa foi o Império do Brasil, uma nação organizada nos moldes do que Simon Schwartzman [1982] e Antônio Paim [1978] convencionaram em chamar de patrimonialismo modernizador ou neopatrimonialismo, em que a variável da democracia representativa constituía elemento essencial do processo, apesar do evidente centripetismo do Estado.
A marcha modernizadora do Estado patrimonial brasileiro no período republicano, em decorrência do primado exercido pela filosofia positivista, abandonou as preocupações com a democracia representativa e acirrou o centripetismo do executivo hipertrofiado, no modelo de ditadura científica implantado por Júlio de Castilhos e seus seguidores, no Rio Grande do Sul (entre 1891 e 1930) [cf. Vélez, 2000]. Esse modelo seria aplicado a nível nacional por Getúlio Vargas, a partir de 1930. As atuais ambigüidades da política brasileira, ainda às voltas com a síndrome arcaizante do estatismo que teima em se manter, explicam-se em boa medida pelo abandono da tradição liberal que o Império soube preservar, graças à têmpera de teóricos da talha de Silvestre Pinheiro Ferreira e de estadistas como dom Pedro II ou o visconde de Uruguai."