27.9.06

Reconciliação, por André Bandeira



Estive a ver uma entrevista de Brigitte Bardot, no canal Le Monde, Vies Publiques, Vies Privées. Parece que faz hoje 72 anos.
Que bonita que é Brigitte Bardot, agora. E que bonita que é por dentro.
É bom que se saiba que, nem tudo na entrevista parece verdadeiro, e que Brigitte Bardot nos apresenta uma vida falhada. Sim, falhada...
B.B. diz-nos que sabia desde pequena que era uma mulher só. E sabia-o muito bem ( eu demorei a saber e não o sei bem ainda, ou não quero). Mulher de coragem extraordinária, não deixou por isso de tentar a sorte que sabia não ter. Foi ríspida, à medida que via a sorte fugir exponencialmente, deixou alguns homens magoados a fundo pelo meio, sabendo que ela se iria ainda magoar mais, mas poupando contudo a dor toda de uma vez só, pelo dever que tinha de viver. Foi egoísta mas não foi trágica. Reconhece-se que é ainda muito sensível, depois de trinta anos de solidão que disse ter dedicado ao sofrimento dos animais. Vendeu a casa para a sua Fundação, parece que Mitterrand lhe deu algo que a permite viver num apartamento. Dá dinheiro a outras causas como, por exemplo, a de um negro americano, Farley Hetchett, que foi executado, no Texas, no passado dia 12. É contra a pena de morte mas acha que os que assassinam crianças devem ser executados e admite a contradiçao ( B.B. nunca conseguiu ser mãe). Elogiou Lionel Jospin e lutou por Le Pen. É de Direita porque foi educada assim. Ainda se levanta às vezes a chorar e lamenta o seu envelhecimento. Disse que, algumas vezes, o desespero foi tão grande que roçou o suicídio. Mas escolheu viver (quando me lembra da notícia de há uns anos -- que suscitou a intervenção de Mitterrand -- de que B.B. fôra detida, zonza, pela estrada, na Côte d'Azur, a tentar comprar serviços de homens, já não me envergonho dela). Disse muitas coisas contraditórias mas afirma que a vida é impiedosa e duríssima, pelo que não a chega a amar mas detesta a morte. Avisa contra a celebridade que diz que faz os outros estabelecerem relações artificiais connosco, as quais depois se pagam e, segundo, B.B., tudo se paga na vida.
Esta mulher teve a enormíssima sorte de poder pagar. E está a fazê-lo, porque teve a coragem de enfrentar o seu próprio destino.
Espero que as mulheres que amei e que conheci, ou talvez as que queira amar ainda, as veja agora como Brigitte Bardot nos ensina, ou seja que uma Mulher ou um Homem, antes do legítimo direito ao Amor e à Felicidade, tem o direito a ser eles próprios. E que ignorar quem somos, em nome da Felicidade, é egoisticamente trágico. A Tragédia que nos pode aparecer se decidirmos viver, ao menos não será nem cega, nem egoísta.
Reconcilio-me hoje, um pouco, com a minha infelicidade.
A minha infelicidade como a de muitos dos que me lêem, é bonita como Brigitte Bardot, porque é uma dádiva. Deus deu-nos ao Mundo, a ti e a mim, como a deu a ela.

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