31.1.06

1 de Fevereiro - O Regicídio. Tem a palavra o sr. deputado Borges de Carvalho!

IV LEG. 02 SESSÂO


1987-01-29

O REGICÍDIO

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Momentos há na história que marcam profundamente a vida e o futuro das nações.
Momentos altos, admiráveis e para sempre admirados uns, momentos outros que, ao invés, marcam a existência, sempre tenebrosamente presente, da bestialidade e da ignomínia, lembram que a memória colectiva não é só cheia de glória mas também cheia com vergonha, que o sono da razão engendra monstros, que a injustiça, a estupidez e a brutalidade são também ingredientes da história dos povos.

Voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O regicídio de Fevereiro de 1908 - faz no próximo domingo 79 anos - é um desses momentos infaustos em que a inteligência é vencida pela brutalidade, em que a história e a nobreza de um povo são espezinhadas, em que a lógica infernal das alfurjas leva de vencida a limpidez e a honra dos homens e das instituições, em que a inveja bate a dignidade, a cobardia ganha à coragem, os instrumentos da tirania vencem a legitimidade e a história.
«Quando ao sol poente daquele dia - cito livremente Sousa Tavares - a antinação assassinou o rei e o príncipe real,
caíram por terra, na pedra batida ali do arsenal, dois homens, uma Pátria, o carácter de um povo e um princípio secular de soberania.
Aqueles tiros de espingarda atingiram em cheio o objectivo marcado. Mais do que um rei, mais do que um homem na perfeita e total acepção da palavra, era o carácter de um povo que caía na rua, e com ele um fecundo sistema de aliança e de legitimidade do poder.»
Um ano antes, escrevia D. C
arlos, talvez em lógica premonição: «Seja como for e suceda o que suceder, temos de caminhar para diante, ainda que a luta seja áspera e rude (e espero-a), porque aqui, mais do que nunca, parar é morrer, e eu não quero morrer assim.»

D. Carlos de Bragança não morreu, de facto, por ter parado, por ter desistido. Morreu porque lutou, no desvario dos tempos e das vontades, fiel à missão que assumia e à legitimidade que encarnava, fiel às franquias e liberdades dos Portugueses, consciente do sentido ocasional e restaurador que, porventura erradamente, atribuiu à ditadura, ele que disse e escreveu que «a força da nossa obra é governar com o Parlamento», ou que «fizeram-se as eleições com ordem e liberdade, ordem e liberdade em que é absolutamente necessário não só entrar agora, mas prosseguir».
Sobre o sangue derramado na calçada por D. Carlos e D. Luís Filipe de Bragança erigir-se-ia a República e, em cortejo, os seus anos de instabilidade e ditadura
Acrescento hoje o http://www.blogda-se.blogspot.com/. Um abraço ao Carlos Narciso

Tem a palavra o sr. Deputado Barrilaro Ruas!


II Legislatura - 1981-02-03

O Sr. Barrilaro Ruas (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Noventa anos depois da revolução do 31 de Janeiro, julga o PPM que é tempo de tentar esclarecer o exacto significado histórico e político desse movimento. E o único modo de o fazer é renunciar aos pontos de vista ideológicos, substituindo-os pela perspectiva nacional. Por uma coincidência que se diria preparada, o dia da revolta militar do Porto é imediatamente seguido, no calendário, pela data do regicídio. E algum reflexo deste crime sobre o acto romântico que anunciou a República vem ajudar o historiador no esforço de interpretação.
Vem de longe o respeito dos monárquicos mais conscientes pelos homens que fizeram o 31 de Janeiro, ou que o prepararam no campo das ideias. Um dos livros mais famosos de António Sardinha presta homenagem ao patriotismo e à isenção desse punhado de revoltados e vê neles o propósito de fazer da política alguma coisa mais que o serviço de interesses ou a ridícula fachada de convenções sem conteúdo: vê neles o novo arranque nacional para uma obra concreta de amor fecundo pelas comunidades, o apelo às raízes, a entrega ao bem geral. E é inegável essa faceta da revolta do Porto. A envolvê-la, dando-lhe o ardor e o fogo das grandes horas colectivas, havia o sentimento da honra ferida. Para o homem comum, o 31 de Janeiro foi o gesto heróico de um povo que acabava de sofrer o insulto e o esbulho por parte de uma das duas superpotências da época. Neste ponto, porém, importa recordar que também nos arraiais da monarquia houve o mesmo sobressalto de indignação patriótica, a começar pelo rei, que logo devolveu à rainha Vitória de Inglaterra as condecorações com que o agraciara. Ainda hoje, porém, sobressai naturalmente na história desses meses e anos dramáticos o protesto -tanto mais forte quanto mais alimentado por motivos partidários - que, por toda a parte deu cor republicana ao patriotismo magoado.
"Republicana"? Ou antes socialista? O maior nome que subscreveu e adensou o protesto, dando-lhe forma a um tempo racional e épica, foi o de Antero de Quental, com quem entrava no País, em ritmo de perfeita arte (de pensar, de escrever, de viver), o socialismo de Proudhon. Em Antero, a República era mais uma fórmula que uma convicção, mais uma roupagem que um regímen.

E, quanto ao "patriotismo magoado"... Como não lembrar que os ideólogos do 31 de Janeiro se batiam (na esteira de alguns vintistas e, sobretudo, de Félix Henriques Nogueira) pelo mais declarado liberismo?
Esse liberismo, no entanto, nascia -para esses homens- da mesma fonte que o patriotismo. As reminiscências clássicas e o culto romântico pelas estruturas tradicionais levavam os investigadores da Portugália à afirmação de valores comunitários que antecediam a zona histórica em que as fronteiras se tinham fixado dentro da Península e as dinastias nacionais começaram a desempenhar o seu papel de símbolos. Assim, o patriotismo dos revolucionários do 31 de Janeiro fazia curto-circuito: porque, sobrevoando séculos e milénios, reunia num só amor essas antiquíssimas raízes e o sentido imperial da Lusitânia desembarcada em África. Não nos escandalizemos ao ver boa gente portuguesa -daquela que a história de sete ou oito séculos ensinara a ser portuguesa - estremecer de horror diante da miragem do federalismo ibérico, que fazia as delícias (e o martírio) de um Antero de Quental, de um Oliveira Martins, de um Teófilo Braga, de um Basílio Teles, de um Anselmo Braamcamp Freire.
E houve momentos em que o conflito dos dois patriotismos - o que se revia na Restauração do 1.º de Dezembro, e o que a repudiava - se tornou sangrento e fratricida. Sucessivamente, o 31 de Janeiro de 1891, o 1.º de Fevereiro de 1908 e o 5 de Outubro e 1910 provaram a força das ideias e que essas ideias, quando se transformam em ideologias, são inimigas das pátrias e dos homens.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Muito bem!
O Orador: - O ideal que desencadeou as duas revoluções: - e que, na sua forma degradada, mofou D. Carlos e D. Luís Filipe - tinha, certamente, uma face pura: aquela em .que se reflectia o amor autêntico das pessoas e das comunidades, o apego às liberdades municipais e também o espírito crítico e o sentimento da indignação e da revolta sem o qual o homem é um ser incompleto. Mas, passados noventa anos sobre o 31 de Janeiro, setenta e três sobre o regicídio e setenta sobre a implantação da República, parece legítimo reconhecer que esse ideal se deixou contaminar pelo vírus totalitário do absolutismo ideológico e impediu os políticos responsáveis de encarar com lucidez as realidades nacionais.

É hoje evidente - como o era já em qualquer desses anos relativamente próximos, de que todos ainda sofremos- que a Nação Portuguesa sofria de gravíssima doença moral e política, que é possível descrever, aproximadamente, como crise de identidade, crise de valores comuns, crise nas relações do Poder com o povo-crise, portanto, de representatividade das instituições. Mas, perante essa crise dissolvente, os políticos precipitaram-se no diagnóstico mais fácil. A instituição das instituições, o fulcro da história política, era certamente a dinastia, era o rei, na sua imagem constitucional e, sobretudo, na imagem tradicional que ainda vivia na alma do povo. Pois bem: o remédio de tantos males estava afinal à mão do primeiro revoltado... Ninguém pode negar que o regicídio foi preparado longamente, pacientemente preparado, em mil campanhas de imprensa, escrita e desenhada, discursos de comício ou do Parlamento, até poemas de líricos da moda.
E, para tantos males de que sofria o povo, o remédio não veio da revolta vencida, nem do crime afinal impune, nem da revolução acidentalmente vitoriosa. O remédio está ainda para vir. Porque não é bastante a estrutura democrática que a Constituição nos assegura, enquanto não houver uma instituição que, sendo a mais popular de todas, seja simultaneamente a menos dependente do critério volúvel dos interesses, ou das ideologias.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez seja para bem de todos os portugueses a lição a tirar destas datas históricas. O PPM quer, em qualquer caso, deixar bem expressa e nítida uma palavra de homenagem àqueles que, no 31 de Janeiro, se sacrificaram a um ideal e àqueles que, carregados de história, caíram, no Terreiro do Paço, vítimas de uma audácia assassina - e também de um diagnóstico profundamente errado.

29.1.06

Visconde de Santarém, -17 Janeiro

Comemoro aniversário duplamente atrasado, no dia de calendário e no ano. A 17 de Janeiro de 2005, cumpriram-se 150 anos da morte do 2º Visconde de Santarém. 18 de Novembro de 1791. f: 17 de Janeiro de 1855.
Historiador e estadista, foi o cultor da cartografia, criando o termo numa carta de 8 de Dezembro de 1839, de Paris, ao historiador brasileiro Francisco Adolfo de Varnhagen. Acompanhou com 16 anos o Príncipe Regente na viagem para o Brasil de 1807-08 e deixou uma das melhores biografias do rei. Ao contrário da lenda negra que o dava com "frangos nos bolsos" e repimpado a ouvir canto-chão" D. João era um hábil governante de cujo inventário de meios constava o fazer-se passar por estúpido. Quando o 2º Visconde de Santarém reproduz a frase que escutou ao rei, a bordo da nau, à partida de Lisboa "Preferia morrer naufragado que deixar-me capturar por Napoleão", vemos o quem era o Bragança. E após a chegada ao Brasil repetia "eu não emigrei; transferi minha Corte de uma parte do meu reino para outra" pelo que percebemos o alcance desse acto.
Após 1820 foi um dos poucos apoiantes cultos da orientação política de D. Miguel, juntamente com Ribeiro Saraiva e Acúrsio das Neves. Ministro dos Negócios Estrangeiros de D. Miguel, era favorável a um entendimento com os liberais, mas foi demitido por D. Miguel para, meses depois, ser despedido de Guardião da Torre do Tombo pelos liberais triunfantes. Exilou-se em Paris e aí viveu até à morte, trabalhando sempre na história portuguesa, fazendo estudos para sustentar e apoiar a Política Ultramarina dos Governos Liberais, frequentemente a pedido destes. Em 1842, o governo aproveitou o seu talento e para o encarregar de publicar uma das suas obras principais, o “Quadro elementar das relações políticas e diplomáticas em Portugal com as diversas potências do mundo”. Em 1855 escreve “Demonstração dos direitos que tem a corôa de Portugal sobre os territorios situados na costa Occidental d'Africa, entre o 5.º grau e 12 minutos e o 8.º de latitude meridional. Sá da Bandeira pediu-lhe que regressasse a Portugal; nunca o fez. António Sardinha, no auge do Integralismo Lusitano, prefaciou-lhe as “ Memoria para a historia e theoria das Côrtes geraes, que em Portugal se celebraram pelos tres estados do reino; ordenadas e compostas no anno de 1824, Parte I, Lisboa, 1827; Parte II, 1828

Duas acções

Defesa e Estrangeiros no EUA reforçam acção directa
Condeleeza Rice In a speech at Georgetown University's School of Foreign Service, where students are deformed into diplomats, cancelled the tea party.
Crucially, Condi named China, India, South Africa and Brazil as countries of the future while declaring that an initial 100 diplomatic slots would migrate from Europe immediately to countries that actually matter. More reassignments will follow, with even Moscow demoted to the international enlisted ranks - while Indonesia gets promoted (Double ouch!). *

Sunday, January 29, 2006; A10

Congress has granted unusual authority for the Pentagon to spend as much as $200 million of its own budget to aid foreign militaries, a break with the traditional practice of channeling foreign military assistance through the State Department. The move, included in a little-noticed provision of the 2006 National Defense Authorization Act passed last month, marks a legislative victory for Defense Secretary Donald H. Rumsfeld, who pushed hard for the new powers to deal with emergency situations.

China's Global Reach, by George Zhibin Gu

Author Interview:
China's Global Reach
Q. "George, you grew up in China during a very difficult time, especially during the Cultural Revolution. How has this impacted your thinking today in terms of how you view China?

A. GEORGE ZHIBIN GU: Well, while I was growing up in China, China experienced a cultural revolution, aswell as people's communes in the countryside. It was chaotic, it was characterized by abusive government power which was expanding into everybody's lives. What is more, it was an entirely closed society. Inother words, every citizen had to work for the government to make a living. So the government exactly demanded the servitude of citizens, but today everything has changed fundamentally. So, in my mind two things are most crucial for modern society and progress, that is, having an open society is a must; secondly, private initiatives; people must rely upon their own efforts for progress and prosperity. That is exactly what has been happening for the last 25 years. This makes all the difference. The third one is that international participation in any country's development is a necessity, otherwise development slows down tremendously. So, the situation in China and India shows [this is] the case.
( Texto da World Association of International Scholars)

28.1.06

28 de Janeiro, nasce Tomás de Aquino

A obra de Tomás de Aquino (1225-1274) absorveu-o porque morreu exausto antes de perfazer 50 anos - e absorveu-o porque foi a expressão de uma vida ao serviço da investigação e ordenamento dos problemas da sua época. Sabia aplicar a sua mente imperial à multiplicidade de assuntos que o atraíam e distinguia-se por ter uma personalidade enérgica. A vontade de ordenamento e a grande receptividade combinaram-se num sistema que assinala o impulso de divinopara o mundo através da causalidade criadora, e do mundo para o divino através do desiderium naturale:

A origem desta combinação deve-se à experiência da identidade entre a verdade de Deus e a realidade do mundo. "A ordem das coisas na verdade é a ordem das coisas no ser". Esta frase da Summa Contra Gentiles significa que o intelecto divino está impresso na estrutura do mundo; que a descrição ordenada do mundo resultará num sistema que descreve a verdade: que cada ser tem a sua razão e sentido ; que cumpre a finalidade da existência ordenando-se ao fim último. A frase também se aplica ao homem individual. Ontologicamente, o intelecto humano veicula a marca do intelecto divino. Metodologicamente, o uso do intelecto revela a verdade divina manifesta no mundo. Praticamente, a tarefa do pensamento significa a orientação da mente para o divino.

27.1.06

MPALABANDA

MPALABANDA, ASSOCIAÇÃO CÍVICA DE CABINDA
DIZERES DA MARCHA, SUMULAMBUCO 2006
A Marcha foi proibida pelo Governador geral de Cabinda, José Aníbal Lopes Rocha, por "prescrever fins atentatórios à Consitutição e à Soberania Nacional"
Diálogo, Diálogo e só Diálogo para Cabinda
Trocar as AKMs pelo Diálogo
Não às AKs e às Baionetas
Dai-nos mais Diálogo
Eleições em Cabinda só com Diálogo
Paz para Cabinda, Diálogo a Única Via
Basta de Guerrear
2006, Por uma Cabinda Sem Guerra
Simulambuco, a Consciência da uma Identidade
Simulambuco, a Esperança das Gerações
Simulambuco, uma Homenagem à História Binda

26.1.06

Tem a palavra o sr. deputado Gonçalo Ribeiro Teles


Após, o 25 de Abril, os partidos monárquicos nasceram de clandestinidade. Tratava-se de um conflituosa época de transformações que exigia a presença monárquica na cena política, portuguesa. Alguns dos seus membros dissolveram-se nos quadros de grandes formações partidárias, abdicando ou não das suas convicções mais íntimas.

Embora a ideia monárquica seja por natureza transpartidária, a delicada situação política de então exigia a criação de um partido monárquico moderno, adaptado às exigências sociais de um regime democrático, evitando desta modo a dissolução e o colapso completo da causa monárquica. Por mais polémica que aparente ser a decisão de criar um "partido monárquico" adaptado a um enquadramento político republicano, é bom relembrar que tal decisão se tornava imperativa no quadro de uma atmosfera social em que intervenção político-social era sinónimo de organização partidária. O Partido Popular Monárquico preencheu este requisito; produziu por um lado, a ambição de um partido democrático, socialmente empenhado, sem contudo deixar de reconhecer e lutar por um ideal transpartidário, que a natureza da causa monárquica reclama.

Para quem entrever que uma forma­ção partidária desta natureza constitui mais um "fóssil" do passado do que um projecto o futuro, Ribeiro Telles lembra a pertinência dos objectivos do partido popular monárquico como os que melhor se adequar ao desejo global de dignidade do povo português. Num contexto internacional em que o "economicismo" se tornou a única linguagem, ecuménica, e o "consumismo" a sua expressão prática, urge acentuar os padrões axiológicos que elevam a "personalidade moral" e de que o sistema representativo é a sua melhor tradução socio-política.
Congresso Monarquia e Constituição 1990, Lisboa

25.1.06

Um Rei Exorcista, por André Bandeira


Estranho título este. Ficava mais elegante chamar-lhe taumaturgo. Assim, parece uma mistura de irredentismo miguelista com aquele filme que passou nos cinemas há uns anos. Dizem-me que tenho a mania do Diabo, mas não falo agora de mim.

Sim, um rei exorcista que exorcizasse o mal-estar, a secura e a falta de esperança a que chegou a política portuguesa, que dissesse que o céu não é o único limite a qualquer louco ambicioso. Um Rei que nos protegesse dos excessos da política, em quem um acontecimento familiar fosse como um momento à lareira da alma que é o Presépio, mesmo para aqueles que nunca terão um família ou que nunca a tiveram.

Sim, um Rei que nascesse e morresse como uma Era da Pátria, que não passasse à tangente, um Rei que nascesse e morresse como um longo dia de Verão. E um Homem ou uma Mulher que soubessem caber dentro desse nome de Rei.

Um Rei que ensinasse que não vale tudo para conquistar e manter o Poder e que por mais que se lavre, há que deixar repousar umas árvores antigas ao lado do campo. Um Rei levado em ombros, mesmo que o povo da aldeia tivesse que ir buscar uma velha árvore arrancada pelas necessidades do desenvolvimento e a voltasse a plantar no mesmo sítio, esperando pacientemente que ela voltasse a florir. Para que os amantes desavindos, quando passassem por lá, se lembrassem que, um dia, tinham lá gravado um coração, com o nome de um, à direita, e o nome do outro, à esquerda. Para que o velho burro se lembrasse que aquela era a árvore ao lado da estrada, pouco antes da velha Igreja, a uns passos da velha casa em ruínas.

Si, um Rei Exorcista, pelo qual valesse a pena morrer de boca aberta a cantar, ou sentar-se na cadeira de torturas e, mesmo sem dentes, nem olhos, não abrir a boca para nunca pronunciar o doce nome dos camaradas, como sombras antigas duma recordação de infância.

Um Rei por quem Zé do Tilhado e João Brandão, saíssem da fila, com um passo em frente, barbados e sujos, resplandecendo ao sol.

Um Rei, que como todos os escravos, no chão, disseram " Eu sou Spartacus".

Sim, um Rei que me atasse ao leme, mais forte que o monstrengo que minha alma teme e dizer "El-Rei", ou "Ré", fosse tão doce como dizer " Liberdade".

"Chega!" ...fora de tempo!

Há Comissões e Comissões. A CAVR faz parte do pequeno número das insuspeitas. Confere peso ao que se sabia, que cinco administrações americanas facilitaram o genocídio em Timor. Aqui Ana Gomes tem razão, como tem razão o nosso André Bandeira a quem a Noruega condecorou pelo que fez pelos direitos humanos em Timor. As estimativas da CAVR são de 100.000 a 180.000 mortos por fome e abate. Mas outros estão no rol dos culpados. A novidade é exigir reparações das empresas de armamento que concorreram para o massacre.

National Security Archive Update, January 24, 2006
The Commission report, entitled "Chega!" ("Enough" in Portuguese), estimates that up to 180,000 East Timorese were killed by Indonesian troops or died of enforced starvation and other causes resulting from the occupation between 1975 and 1999. The "Responsibility" chapter details the primary role of the Indonesian military and security forces, as well as the supporting roles played by Australia, Portugal, the United States, the United Nations, the United Kingdom, and France.The report (p. 92) finds that "U.S. supplied weaponry was crucial to Indonesia's capacity to intensify military operations from 1977 in its massive campaigns to destroy the Resistance in which aircraft supplied by the United States played a crucial role." Moreover, "U.S. Administration officials refused to admit that the primary reason that East Timorese were dying in their thousands was the security policies of the Indonesian military."The CAVR used more than 1,000 formerly secret U.S. documents provided by the National Security Archive's Indonesia and East Timor Documentation Project, which published on the Web in November 2005 several of the key documents detailing U.S. support for the invasion and occupation of East Timor across five U.S. administrations.T

"Responsibility" chapter published on Web by National Security Archive
For more information contact:Brad SimpsonDirector, Indonesia-East Timor Documentation ProjectPhone: 443-845-4462simpson@umbc.edu
http://www.nsarchive.org

24.1.06

Don't underestimate Ahmadinejad , by Tom Porteous (UK)

Tom Porteous, who worked for the BBC and the UK Foreign and Commonwealth Office, has just returned from Iran. He has written an interesting account titled "Don't underestimate political acumen of the Iranian president" (San Francisco Chronicle, 1/22/06). Mahmooud Ahmadinejad makes provocative speeches which infuriate the West, but are carefully calculated in terms of Iran's domestic politics. He is the first nonclerical president of the new Iran, and it is not certain that he could survive an effort to overthrow him by the more powerful mullahs. Despite denunciations of them, it is surprising how much power Islam has over the Iranian people. There is talk of the return of the Mahdi, Shiite Islam's last imam, who disappeared a little over 1,000 years ago. Many Iranians believe his return will herald an age of universal justice. Porteous concludes: The confrontation between the West and Iran may assist the consolidation of radical Islamist `politics in Iran and provide Tehran with incentives not only to develop nukes but to use them.

23.1.06

Contra a Superstição, por André Bandeira

Que bom-senso se pode exigir de um condenado à morte, prestes a ser executado? Nenhum. O bom-senso abandonou quem o condenou à morte e, portanto, não há nada a fazer, no capítulo do bom-senso.

Claro que há aqueles que têm consciência de que não há piedade para si e tomam a morte como uma espécie de alívio em que os homens todos se somam ao Eu exteriorizado do condenado, fechando a porta no escuro ao que resta - o Homem interiorizado - o qual só deseja que se abra uma luz qualquer, mesmo se ela brilhar para além da Morte.

Depois, porque a vida é feita de ritmos e, às vezes, a curiosidade é mais forte que o próprio instinto de conservação.

Reparei como, no Domingo, o Mundo se tornou sêco. E tão vazio e tão sêco, que, melhor que ele, só mesmo o dia de trabalho. Ora, se o Domingo é assim, não admira que as Igrejas se encham de rituais para ao menos podermos cantar ( há pessoas cujo único momento em que podem cantar, é, de facto, na Igreja) e reconstruirmos, de pé e de joelhos, os movimentos básicos da existência social.

Que quero dizer com isto? Quero dizer que o nosso tempo livre se tornou tão sujo e ritmado pelas pressões do consumo e o nosso dia seguinte ficou tão poluído pela "Imprensa Livre", agarrada ao microfone a anunciar a próxima novidade, que já nem sabemos quem somos. Sonhamos até com o que nos mandam sonhar. E, por todo o lado, corre um frenesim elétrico de urgência, de "última oportunidade".

Ora, com isto tudo, não admira que o Ontem seja igual a Hoje e o Hoje seja igual ao Amanhã. Isto tudo, até a velhice e o cansaço nos fazerem tropeçar para cima de um automóvel em movimento.

Alguém que nos lembre esta monotonia, lendo as linhas da mão, as linhas do astros ou os nossos lábios e, por isso, cobre dinheiro, só tem mesmo possibilidade de enriquecer e até chegar a dirigente político. Há muitos caminhos que levam lá: uns escuros como o de Hitler, outros mais claros como os de Ronald Reagan, outros nem escuros, nem claros, como os da "Terceira Via"".

Porque a vida é curta e como somos ainda uma espécie tão atrasada nas entrelinhas, parece óbvio que uma só boa intenção, precise de passar de mão em mão, por várias gerações, até conseguir um pouco de realização.

São poucos os que não testemunharam a beleza divina da sua própria juventude, são muitos os que se admiram de rever uma pessoa a quem a vida transformou completamente até se tornar irreconhecível e são menos, mas mesmo assim bastantes, os que encontram alguém numa situação de circunstância e se lembram de o ter ao lado a fazer juras eternas de amor. Por isso, a infância, a juventude e até o Passado de um país submergem na História, inteiros, a uma luz eterna de meio-dia, como as cidades de Pompeia. O seu reaparecimento periódico nas nossas mentes, chama-se Saudade. A Saudade é um pensamento que se continua a pensar, mesmo depois de o termos, há muito, mandado calar.

Não admira, portanto, que o que já se se esqueceu, se venha a realizar no futuro e descubramos, abismados, que se realizou ponto por ponto, inteirinho, conforme tínhamos recordado, sonhado, ou alguém mais observador nos houvesse dito.

O problema é que, cada vez mais coisas se realizam mais depressa e mais predições se confirmam. E, tudo isto é porque estamos de tal modo automatizados que até, de olhos abertos, vamos em sonambulismo, caminhando se possível para o abismo, porque cumprir a bruxaria - e quanto antes - acaba por ser a única esperança de nos libertarmos dos encantamentos.

Entretanto, os astrólogos, os operdores de sondagens, mas também os patifes e programadores, vão dizendo B para conseguirem A e conseguindo A para terem C.

Perante isto tudo, há que ter coragem de ter Fé e de Pedir como seres livres, para que o que pedimos - como diz o Evangelho - nos seja concedido. Não, não se trata de de Pedir apenas como ser livre mas de ser puro para pedir, pois a Pureza é o único conteúdo possível da Liberdade, palavra para a qual os filósofos, não encontraram nenhum conteúdo.

Quem é capaz de Pedir? Quem é capaz de solicitar abarcando com todas as consequências disso?

Só aquele que for livre - quer dizer, puro - aquele que sem pestanejar se libertou duma vez da escravidão dos sentidos, venham eles estimulados pela TV, pelo simples olhar ou pelos vigaristas da superstição, seja ela científica ou tradicional.

E veja-se qual é o mecanismo desta Agressão quotidiana, por aí solta, à desfilada: a divisão dos nossos sentidos obriga-nos a um tal exercício de memória que as poucas vezes em que conseguimos ser precisos, é quando nos obrigam a tal, muitas vezes à ponta de pistola.

Ou seja: nunca somos exactos quando queremos mas quando nos dão a oportunidade. Revoltados, cada vez ficamos mais dependentes dos oportunistas, uma vezes chamados pelo seu "sentido de oportunidade".

Somos os nossos próprios bruxos, não porque possamos definir o nosso próprio Destino ( frase que nos depressa queima a língua) mas porque nos embruxámos deliberadamente, ao querermos desenhar o Destino.

23 JAneiro 2006 – As Minhas Contas e Leituras

As percentagens do STAPE são como os vencimentos antes dos Impostos.
37,4% é alta abstenção e foi a terceira maior de sempre na III República.
Atenção ao que pode ser uma maioria absoluta em democracia! Cavaco Silva é eleito com 31% dos inscritos e 26% da população. Terá que se lembrar que foi eleito à tangente. Conta tanto como ser à 1ª volta. É o vício de querer um "Presidente da República de todos os Portugueses"
Manuel Alegre é movimento despartidário, transversal a Esquerda e Direita
Votos Líquidos exprimem também o apelo directo de partidos e áreas políticas dada a configuração desta campanha de 2006.
Eu votei! Voto sempre ! Sou contra o Abstencionismo!

Percentagens Líquidas ( relativas a inscritos ) Voto Ilíquido
Cavaco Silva 31 % Centro Direita 2745491

Manuel Alegre 12,7% Esquerda+Direita “Despartidárias” 1124662

Mário Soares 8,8% Partido Socialista 778389

Jeronimo de Sousa 5,2% PartidoComunista 466428

Francisco Louça 3,2% Bloco de Esquerda 288224

Garcia Pereira 0,26% MRPP 23650
Inscritos 8830706 Votantes 5529117 62,61% Brancos 58868 1,06% Nulos 43405 0,79%
População 10.529.255 pessoas (estimativa INE a 31 de Dezembro de 2004),

21.1.06

22 de Janeiro de 1808 - O Portugal Americano













Fotos de 1906 e de 1998 do Rio de Janeiro, que mostram na Rua Primeiro de Março, o Convento dos Carmelitas iniciado em 1619. Aí morreu D. Maria I, mãe de D. João VI, consolidador do Portugal Americano.


À partida de Lisboa em 29 de
À partida de Lisboa em 29 de Novembro de 1807, o Príncipe Regente D. João, dissera ao almirante Cunha, conforme testemunho do futuro 2º Visconde de Santarém: “Preferia perecer num naufrágio a cair nas mãos de Bonaparte. A 22 de Janeiro de 1808,e após percalços no mar que levaram à dispersão da Frota Portuguesa, D. João, seus filhos Pedro e Miguel, e a rainha, chegavam ao Brasil, a bordo do navio Príncipe Real com 1.054 pessoas, fundeado em S. Salvador da Baía, após 54 dias no mar. Alguns dias antes, a 17 de Janeiro, os navios que tinham velejado directamente de S. Tiago de Cabo Verde entraram no Rio de Janeiro. No dia 28 do mesmo mês, uma ordem real abriu os portos do Brasil à

21 de JANEIRO - Previsão Exactíssima!


Cinco candidatos presidenciais vencidos, um vencedor, e um "universo eleitoral" que não é "um povo unido pela comunidade das coisas que ama!"

20.1.06

20 de Janeiro - January 20 - Bush Has Crossed the Rubicon, by Paul Craig Roberts

Nem de propósito, após a data da fundação do império romano Paul Craig Roberts diz o que pensa sobre um "império sem ideologia". Poderá parecer exagerado o ataque do conservador Graig Roberts, antigo Secratário Assistente do Tesouro de Ronald Reagan. MAs cuidado com as imitações... de conservadores que se fazem chamar neo-liberais porque querem fazer esquecer a justiça social . Neste dia de inaguração presidencial para os americanos, que se passa com o que Raymond Aron chamava a "república imperial?"

"In this first decade of the 21st century, the United States regards itself as a land of democracy and civil liberty but, in fact, is an incipient dictatorship. Ideology plays only a limited role in the emerging dictatorship. The demise of American democracy is largely the result of historical developments.
Lincoln was the first American tyrant. Lincoln justified his tyranny in the name of preserving the Union. His extralegal, extra-constitutional methods were tolerated in order to suppress Northern opposition to Lincoln's war against the Southern secession.
The first major lasting assault on the U.S. Constitution's separation of powers, which is the basis for our political system, came with the response of the Roosevelt administration to the crisis of the Great Depression. The New Deal resulted in Congress delegating its legislative powers to the executive branch. Today when Congress passes a statute, it is little more than an authorization for an executive agency to make the law by writing the regulations that implement it.
Prior to the New Deal, legislation was tightly written to minimize any executive branch interpretation. Only in this way can law be accountable to the people. If the executive branch that enforces the law also writes the law, "all legislative powers" are no longer vested in elected representatives in Congress. The Constitution is violated, and the separation of powers is breached.
The principle that power delegated to Congress by the people cannot be delegated by Congress to the executive branch is the mainstay of our political system. Until President Roosevelt overturned this principle by threatening to pack the Supreme Court, the executive branch had no role in interpreting the law. As Justice John Marshall Harlan wrote: "That Congress cannot delegate legislative power to the president is a principle universally recognized as vital to the integrity and maintenance of the system of government ordained by the Constitution."
Despite seven decades of an imperial presidency that has risen from the New Deal's breach of the separation of powers, Republican attorneys, who constitute the membership of the quarter-century-old Federalist Society, the candidate group for Republican nominees to federal judgeships, write tracts about the Imperial Congress and the Imperial Judiciary that are briefs for concentrating more power in the executive. Federalist Society members pretend that Congress and the judiciary have stolen all the power and run away with it.
The Republican interest in strengthening executive power has its origin in agenda frustration from the constraints placed on Republican administrations by Democratic congresses. The thrust to enlarge the president's powers predates the Bush administration but is being furthered to a dangerous extent during Bush's second term. The confirmation of Bush's nominee, Samuel Alito, a member of the Federalist Society, to the Supreme Court will provide five votes in favor of enlarged presidential powers.
President Bush has used "signing statements" hundreds of times to vitiate the meaning of statutes passed by Congress. In effect, Bush is vetoing the bills he signs into law by asserting unilateral authority as commander in chief to bypass or set aside the laws he signs. For example, Bush has asserted that he has the power to ignore the McCain amendment against torture, to ignore the law that requires a warrant to spy on Americans, to ignore the prohibition against indefinite detention without charges or trial, and to ignore the Geneva Conventions to which the U.S. is signatory.
In effect, Bush is asserting the powers that accrued to Hitler in 1933. His Federalist Society apologists and Department of Justice appointees claim that President Bush has the same power to interpret the Constitution as the Supreme Court. An Alito Court is likely to agree with this false claim.
Bush Justice Department official and Berkeley law professor John Yoo argues that no law can restrict the president in his role as commander in chief. Thus, once the president is at war – even a vague, open-ended "war on terror" – Bush's Justice Department says the president is free to undertake any action in pursuit of war, including the torture of children and the indefinite detention of American citizens.
The commander in chief role is probably sufficiently elastic to expand to any crisis, whether real or fabricated. Thus has the U.S. arrived at the verge of dictatorship.
This development has little to do with Bush, who is unlikely to be aware that the Constitution is experiencing its final rending on his watch. America's descent into dictatorship is the result of historical developments and of old political battles dating back to President Nixon being driven from office by a Democratic Congress.
There is today no constitutional party. Both political parties, most constitutional lawyers, and the bar associations are willing to set aside the Constitution whenever it interferes with their agendas. Americans have forgotten the prerequisites for freedom, and those pursuing power have forgotten what it means when it falls into other hands. Americans are very close to losing their constitutional system and civil liberties. It is paradoxical that American democracy is the likely casualty of a "war on terror" that is being justified in the name of the expansion of democracy.

Paul Craig Roberts IS a former assistant secretary of the U.S. Treasury. He is the co-author of The Tyranny of Good Intentions.

19.1.06

19 de Janeiro, Jan Palach - Morrer pela Pátria


19 de Janeiro de 1968 - O estudante Jan Palach morreu três dias depois de se ter imolado pelo fogo na Praça Venceslau em Praga, para protestar contra a invasão da Checoslováquia pela URSS. O funeral foi ocasião de um protesto maciço contra o regime comunista. O evento correu mundo e em Portugal José Campo e Sousa, o trovador monárquico, compôs sobre o tema uma das suas grandes baladas com letra de José Valle de Figueiredo. (Agradeço a correcção de O Sexo dos Anjos)
Outros decidiram-se transformar-se em tochas vivas após Palach. Jan Zajic, o “archote nº2” em 25 de Fevereiro 1969 - o aniversário do golpe comunista de 1948. Evzen Plocek, o archote nº3 na praça principal da cidade de Jihlava, em 4 de abril 1969. Entre Janeiro e Abril 1969, 26 checos imolaram-se pelo fogo; sete deles morreram. A memória dos que decidiram pôr a sua morte ao serviço da verdade guiou o povo checo durante as duas décadas. entre 1969 e 1989. de resistência à ditadura comunista. Sem eles, não haveria a “Revolução de Veludo.
Foram precisos mais de vinte anos para cair o "socialismo real". Mas caiu mesmo ? O comentário mais duro e mais verdadeiro que conheço sobre a queda do comunismo deve-se ao filósofo italiano Adriano del Noce, tradutor de Eric Voegelin em Itália e autor de "Revolta contra o mundo moderno". Quando lhe perguntaram o que pensava de 1989, respondeu: "O comunismo caiu no Leste porque triunfou no Ocidente!" O ponto critico desta resposta está no facto de que a ideologia do materialismo económico ficou reforçada na sua versão capitalista. Isto não exclui que a economia de mercado é superior à planificada. Apenas afirma que os sonhos terrenos do capitalismo segundo Adam Smith ou Cavaco Silva são muito semelhantes à visão do proletário emancipado de Karl Marx ou de Leonid Brejhnev. Jan Palach morreu pela pátria, coisa sem preço.

18.1.06

16 de Janeiro 27 a.C. Início do império romano

16 DE JANEIRO. A data marca o início oficial do Império romano em 27 a. C. quando Octávio recebe o título de Augusto pelo Senado. Mas Roma tomou todas as precauções para que a posição do imperador fosse oficialmente uma restauração da república. Qualquer tentativa de regresso à monarquia poderia gerar ressentimentos. O nome Augusto, que significaria sobrehumano refere-se a Rómulo que fundara Roma "augusto augurio." Mas o novo César Augusto referia-se a si mesmo como "princeps", uma instituição
republicana que designava qualquer cidadão com influência social baseada no número e qualidade dos seus clientes com os quais tinha uma ligação de lealdade. Arranjava-se clientes mediante ajudas, empréstimos, doações. Tibério Graco chegou a aparecer em público com 2 a 3 mil clientes, guardas de corpo que forma úteis nos conflitos civis. Octávio começou a carreira contra Marco António com a Ajuda da clientela de Júlio César.
O fim da república é assinalado quando César passa o rio Rubicão, na noite de 10 de Janeiro de 49 a.C. Na carreira de César, o homem e as suas acções valem mais do que meros factos históricos; são símbolos políticos. Nos cinco anos entre 49 e 44 a.C. surgiram vivos e em acção os mitos do império e do governo. O cruzamento do Rubicão é, até hoje, o símbolo da decisão que marca o fim e o começo de uma idade. E depois vem a série grandiosa, e impiedosa, das batalhas contra o rival ao poder imperial, numa perseguição em torno do Mediterrâneo: Lerda em 49, Farsália em 48, a morte do Pompeu Magno no Egipto em 47, a derrota do filho em Thapsus em África em 46, e o destroço final dos Pompeus em Munda em Espanha em 45, fechando assim o círculo em torno do mar. Esta não era a conquista de um Alexandre sonhador, tentado por horizontes desconhecidos; aqui estava um dominador que vagueava pelo orbis terrarum, apoderando-se do mundo conhecido. Enquanto Cícero se orgulhava de Roma como res publica, César tornou o mundo em res privata.

Na Quarta Écloga de Virgílio, o ciclo das idades é encerrado, e depois da idade do ferro, começará agora um ciclo novo com o tempo de Saturno. Uma raça de ouro seguir-se-á à raça do ferro, e o criador será uma criança ainda não nascida. A profecia parece referir-se, por ocasião do casamento de António com a irmã de Octávio, ao esperado filho de ambos. Mas a criança foi uma menina, e depois António apaixonou-se por Cleópatra. O casamento de ambos originou uma nova série de símbolos imperiais e dois filhos gémeos, chamados Alexandre Hélios e Cleópatra Selene. O nome Hélios retoma a profecia Sibilina do governo de Hélios que precede a idade de ouro, sugerida pela Quarta Écloga; reflectia, além disso, o simbolismo faraónico do sol (Cleópatra, como governante do Egipto, era filha de Re); e finalmente o nome reivindicava o simbolismo Persa e Parto do sol. António seria o governante do império com Cleópatra como imperatriz romana. Consequentemente, as relações com Octávio e o Ocidente deterioraram-se em 32; a guerra, oficialmente conduzida pelas províncias ocidentais contra Cleópatra, terminou em 31 com a batalha de Actium. Cleópatra cometeu suicídio, Em 29, o templo de Jano foi fechado como um sinal que Roma já não estava na guerra com qualquer povo, o que acontecera somente duas vezes na sua história. Em 16 de Janeiro de 27 começou o império.

16.1.06

Sobre a Superstição, por André Bandeira

Penso que as superstições, hoje em dia, estão organizadas como estímulos psicológicos televisivos. Há muitas. Podemos vê-las sem chegar ao fim. Transmitem-nos o que queremos e relaxam-nos a mente.
A última versão do Catecismo Católico não as considera satânicas mas assevera que são boas portas para conduzirem a essas esferas. É um aviso seguro. Outro dia apanhei a minha filha, que segue a moda do Harry Potter, a dizer que as pessoas malucas se deviam queimar como antigamente. Quando lhe disse que alguns dos maiores “ sábios antigos’’ foram queimados porque as pessoas da altura os achavam malucos – quando eles estavam era adiantados para a época – a minha filha concordou mas só porque isso também vem nos sortilégios da “cultura Harry Potter”.
Em Viena li obras de Psiquiatras que utilizavam a Astrologia ( como quem utiliza uma “linguagem privada”que já se sabe que não existia para Wittgenstein, mas Ludwig não sabia tudo) para curarem ou melhorarem a vida aos pacientes. Mas sei que muitos políticos vão lá, muitos daqueles cuja opinião “conta” ( a sua e a minha ficam nos Blogues) acreditam nela. Ronald Reagan, que era razoável e inteligente, ouvia mais Astrologia que notícias. A CIA já chegou a mobilizar videntes. Digo como o Padre Evaristo de Vasconcelos: estas coisas existem mas não têm ciência. Ora muitas coisas da Fé também não têm ciência. Mas aqui faço um outro “voto de ignorância”, como fiz a um único Deus, na Universidade Católica, em Julho de 2005: muitas vezes a necessidade de um linguagem privada faz das crendices um verdadeiro canal de comunicação. Herman José foi avisado de que ia ter problemas por uma vidente que convidou para o programa. Qualquer bom detective sabe a utilidade de ter contactos nestas psiquiatras sociais que não estão vinculadas pelo juramento de Hipócrates. Digo mesmo - e S. Martinho de Dume - nos perdoe, mas, às vezes não temos outro modo de comunicar humanamente numa Realidade tiranizada por escolhas livres transformadas em teimas, que não seja por meio de crendices. Será feminino mas é bom que aceitemos também o que há de feminino, de poder do afecto concreto, em nós.
Um excesso de “electio” torna-nos em orgulhosos e angustiados Priscilianos. Há que acreditar no eterno Amor de Deus e na Providência que de todas as formas se manifesta. Isso implica uma alternativa dura às crendices: a aceitação de uma inevitável derrota nesta existência corpórea mas – porque isso não serve para descansar – também uma compassividade sem fim, até com as crendices que muitas vezes manifestam a voz real, inaudível, das pessoas. De resto S. Paulo disse que Deus dotou pessoas com diversos dons, como o de lhes falar pelos sonhos, outros de curar com as mãos, etc. O bom disto é que nada se pretendia como a profecia marxista ou o pragmatismo norte-americanos, mas como simples sinais duma realidade pensante e sentiente, duma Natureza habitada pelo Espírito que não podemos descodificar inteiramente. Não há ciência disto, senão a do Amor, às vezes até tolerando as crendices com que pessoas simples ou ilustres como Ronald Reagan vão tentando seguir um calendário. Sim, até a crendice de que há uma Justiça Social, num todo, a Sociedade, que é mais ilusão que realidade, assim como uma justiça poética para a qual tivemos de inventar um Tribunal.

15.1.06

Blogosfera

Da comunidade da blogosfera adicionei hoje os seguintes links

Operação Excel, por José António Barreiros

Atónito, como qualquer ser pensante e livre, segui na televisão o rato parido pela montanha do pseudo-escandâlo das listas telefónicas. Afinal tudo se resumia em aproveitar a burocratite de um funcionário da PT ( não sabemos se ingénua ou paga), numa manipulação conduzida para abater Souto Moura e deixar inquéritos proibidos cairem no fosso, como o caso da CAsa Pia. Felizmente não estou só nesta apreciação , como mostra o blog de José António Barreiros que aqui reproduzo.

"A operação pela qual se conseguirá, enfim, o descrédito definitivo do Ministério Público e o fundamento para a substituição do Procurador Geral foi conduzida com mestria. A meio da manhã era um monumental e gravíssimo escândalo de escutas telefónicas a altas figuras do Estado, ao começo da noite era já só um raquítico lapso de um funcionário da PT. A noite permitiu, porém, corrigr a manobra: pela hora do jantar já se sabia onde tudo iria parar: se a culpa parecia ser, afinal, a dos procuradores que não sabiam ver coisas escondidas em CD's, o objectivo, que não podia perder-se era o PGR, sem perdão, ter de ir à mesma para a rua, e já! Estão de parabéns todos os que contribuiram para o efeito! O resultado está alcançado! Julgo saber que os magistrados vão deixar de ter um magistrado como PGR. Um novo mundo se aproxima. O Dr. Souto Moura é um homem bom e sério. Mas como tudo isso se tornou ridiculamente irrelevante no país em que vivemos e para o cargo em que ainda está!."

Astrologia e má desmarxização

Cá estamos no dia em que nasceram Afonso V "o Africano", (1438-1481), Martin Luther King Jr, Aristóteles, Onassis, e Molière. Boa ocasião para pensar na farsa da astrologia, apesar dos muitos ascendentes, quadrantes e oposições que se apresentem para corrigir os signos no nascimento de gente tão diversa. Certo é que a inteligência dos séc. XVI e XVII condenava os horóscopos não por serem falsos mas por atentarem contra a liberdade humana. E nisto concordavam Savonarola e a a Santa Sé. O que Pico de Mirandola fez para intelectuais, Savonarola quis dizer ao povo de Florença e de Itália no seu “Apologeticus interpretis”; a astrologia negava a “electio”, a escolha pessoal de vida; a causalidade é aceitável para assuntos contingentes, como Galileu iria demonstrar, mas o futuro humano não pode conhecido pelo intelecto humano. Também a constituição papal de 1586 condena a “astrologia judicial” como incompatível com a humildade do cristão. A segunda constituição de 1631 ataca a “astrologia política” que prevê a morte de princípes, devido às perturbações que causa, não pela impossibilidade da previsão.
O assunto tem curioso paralelo com as sondagens de opinião actuais e com o facto de muitos políticos conhecidos "irem à bruxa". Miterrand e Madame Soleil é apena a ponta do iceberg que se repercute em terras lusitanas lá para os lados da Lapa

Hoje é também o dia em que foram assassinados Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, os terríveis revolucionários Marxistas alemães cujo Spartakismo não chegou a lado nenhum. Em Portugal tivemos uma péssima desmarxização nos anos 80; a ideologia do materialismo económico – sem marxismo - transitou direitinha das mãos dos marxistas para a dos liberais, que em muitos casos eram as mesmas pessoas e que até chegaram aos altos cargos da governação nacional e internacional. Entretanto a utopia da justiça social ficou perdida, para ninguém.

14.1.06

Porque permanece Hugo Chavez ?


Em ano (2006) de sucessivas eleições presidenciais sul-americanas, há conclusões a tirar. O novo capítulo das élites políticas etnonacionalistas sul-americanas foi inaugurado por Hugo Chavez em 1998. Quatro anos depois do contra-golpe vitorioso de Chavez, a sua permanência no poder não é apenas um reflexo do aventureirismo de esquerda ( que tem) nem do apoio de Fidel ( tão útil quanto nocivo na região) mas de uma tendência de fundo das populações ibero-americanas de tomarem o constitucionalismo democrático e o Estado de direito nas suas mãos, contra os interesses oligárquicos da velha classe política rotativista. Há paralelos a fazer entre a permanência de Lula no Brasil desde Outubro de 2002, de Lúcio Gutiérrez no Equador desde Janeiro de 2003, a eleição em Dezembro de 2005 de Evo Morales na Bolívia, e o candidato presidencial peruano Ollanta Humala.

Começando, então por Chávez.

O presidente venezuelano e o seu regime já sobreviveram a muita coisa. Eleito democraticamente em 1998 contra a bancarrota da velha ordem política, Chavez é um populista nativo que desmontou o poder da velha élite. Com os famosos 49 decretos de Novembro de 2001, Chávez nacionalizou o petróleo, fez uma reforma agrária com redistribuição da terra, generalizou os sistemas de instrução e os serviços de saúde gratuitos, usando o dinheiro do petróleo contra os interesses americanos.

Após 1998, a velha classe política usou os meios de comunicação e controle da produção de petróleo, e a ajuda de alguns líderes sindicais, para derrubar Chavez que alienara muitos apoios da classe média baixa. Quando em 11 de Abril de 2002 Chavez sofreu um golpe apoiado por generais do seu Exército, a imprensa internacional apressou-se a enterrá-lo. Mas dois dias depois, regressou ao palácio, com enorme apoio popular.

A luta era sobre o controle do petróleo. Os oligarcas mobilizaram uma enorme manifestação. Houve disparos e mortes perto do palácio e Chavez, acusado de negligência para com os direitos humanos foi sequestrado após se recusar a renunciar. Não se sabe quem iniciou os disparos mas a imprensa internacional limitou-se a transmitir os "press releases" dos golpistas. Quase teve êxito. Mas "quase" é a distância que vai do palácio à prisão.

O presidente interino, Pedro Carmona, apenas deu corpo ao ressentimento da oligarquia; anulou toda a obra de Chavez – constitução democrática, assembleia nacional, tribunal supremo, ministérios, procuradoria, etc..Mandou a polícia prender todos os ministros e apoiantes de Chavez, incluindo militares. A população venezuelana aprendeu com este golpe de Estado. Muitas forças se combinaram para defender a ordem constitucional .

A maior parte do Exército, sobretudo as unidades de combate, permaneceram leais a Chavez. Parlamentares e ministros recusaram-se a aceitar a alegada renúncia de Chavez, e pediram respeito pela Constituição que exige da Assembleia Nacional ratificar a renúncia. Muitos governos ibero-americanos não reconheceram o novo governo. A organização dos estados americanos (OAS) considerou aplicar sanções. Finalmente, veio o contra-golpe com a mobilização popular, em especial a população de Caracas, que reclamou Chavez de volta.

A primeira conclusão é que existe uma nova tendência em favor do constitutionalismo ibero- Americano. O Estado de direito democrático deixou de ser um presente dos militares apoiados pelos EUA, exactamente como era o golpe de estado anti-democrático. É uma idéia que começa a ser respeitada por políticos, militares, e população, até porquew tem origens no constitucionaliosmo espanhol e português que foi legado aos países sul-americanos, como explica o prof. Colombiano Ricardo Velez Rodriguez. Os generais já não podem fazer golpes à vontade por muito desacreditada que esteja a classe política, lição bem aprendida na Argentina, cuja elite política é tão má como a da Venezuela em 1998.

A segunda conclusão dirige-se aos EUA, que se encontram outra vez sozinhos perante o resto do mundo ao querer derrubar Chavez. Os EUA não podem continuar a querer trocar a sua sacrossanta “rule of law” por trinta dinheiros, ou barris de petróleo. A liderança americana do mundo é a de uma política externa sem rumo que não conduz a nada, porque ninguém a segue.

A terceira conclusão é sobre Chavez . Pode ter génio para criar opositores mas é um populista real, não é só um demagogo, e representa os povos nativos sul- americano na revolta contra a aculturação ocidental, tal como Qechuas em Colombia, Bolívia e Peru, Aztecas e Toltecs na América Central, e mesmo os Maipuche no Chile e os Tupinamis em Brasil. Sobrevivendo, ficou mais forte. A fonte da sua força já não é o exército, que perdeu unidade política. A força foi a confiança da população na Constituição. A "revolução Bolivariana" terá possibilidades se em vez de Chaves “ladrar “ordens e munir-se de artifícios como os de chamar o apoio do cocaínomano “Maradona” procurar a participação integrada das populações e sem vez de cair, no engodo de Fidel, usar o seu populismo para uma cidadania democrática crioula, retomando o que Bolivar pretendia mas efecrtivbamnet nunca conseguiu pois o caciquismo e coronelismo infectaram a a política dos países sul-americanos, até aos últimos dez anos.

A última conclusão é sobre os meios de comunicação, na maior parte privados. que participaram no golpe contra Chavez. Os apoiantes de Chavez tiveram que conquistar a estações de transmissão para publicitar as mensagens do governo constitucional. Os meios americanos serviram a oligarquia venezuelana, com total desprezo para com a democracia crioula. Só passam informação sobre a impopularidade de Chavez.

Este silenciamento sistemático da informação sobre a nova mobilização popular nos países sul-americanos reflecte a incapacidade das neo-teorias conservadoras americanas em compreender que a democracia e o liberalismo não tem de vir da América para ser bom. O que acontece sobre a Venezuela deve ser mais um sinal de alarme dos perigos de uma imprensa controlada por um punhado de interesses privados. Uma comunicação social totalmente privada é um perigo para a democracia em todo o mundo.

13.1.06

Sud-Express, por André Bandeira


Vou no combóio. Parei num lugar há vinte anos, ou mais. Dormi noutras gares, tive amores, casei-me, tive uma filha, ela cresceu. Voltei a tomar o combóio muitos anos depois. Aqui vou eu, pouca-terra, pouca-terra...
O Sud está melhor por fora. São mais simpáticos os franceses que “transferiam o gado” do trem hispano-português (agora) para o TGV, em Irún. Ou Hendaye (não sei onde fica um e onde fica o outro, são Castor e Pollux, irmãos unidos e fiéis, à ida ou ao regresso, passam um rio a vau para se substituírem). Só não abrem o combóio, apesar do frio, enquanto não soa uma voz trilingue, gravada às tiras.
Por dentro, o Sud está melhor. Em vez de garrafões e sacos de plástico com litros de caldo verde, há geleiras com cores giras.
Mas o meu Povo, ali vai, patibular. Ena pá 2000! Não queria ser preto, pelo menos ao primeiro encontro, se este trem fosse num outro sentido, colonizar o Burundi.
Aqui vai o Sr. Miranda e a sua mulher que lê “O Crime” com o lábio luzente. Mas o marido diz-lhe que os jornalistas têm é de vender papel. À noite entro no compartimento. As luzes da linha férrea iluminam compassadamente os rostos adormecidos em sonos descoroçoados. Este será também o meu rosto num jazigo com várias prateleiras. Lá fora, jovens de camisolas de Verão sem mangas, trocam os olhares de quem tem os braços nus à venda no mercado. Passam latas de “Sagres” de mão em mão. Há alguns jovens com um aspecto mais “night life”de Lisboa. De crânios rapados, com lenços blasés à volta do pescoço e blusões de design. Mas não têm trabalho em Portugal, devem-no ter duro à volta de Paris, acabou-se o Natal, vão passando dos ares durões da luz negra de Lisboa para um solar sorriso mais meridional, mais fraterno. Ser tuga em terra de rico, sem o orgulho do árabe, tem mesmo que se sorrir como os cãozitos que baixam a cabeça e abanam a cauda. A vida não está para brincadeiras.
Alguns têm um ar assustado. Mesmo o pobre tem mãe, mesmo o pobre tem algo a perder. E a memória da Serra, mesmo a quem foi chamado de bruto até se convencer disso, mais o sonho fugidio duma rapariguita de tranças loiras a sorrir pela alcongosta verde, faz o calhau orvalhar-se de lágrimas. Devem ir ao negro para um trabalho de fortuna. Há que ser rijo, gente minha, também eu estive aí. Não sabemos para onde vamos. Há hoje senhores de escravos nas grandes metrópoles, tarados de coiro negro em noites de muito frio, amigos fiéis do terceiro imperial.
Encontro um lugar pacífico. Um português de Moçambique fala delicadamente com um cabo-verdiano e podemos imaginar pela janela, tão húmida de sombras, uma fazenda de Moçambique, verde, verde, pelo pôr-do-sol dentro.
Falamos de Deus e de mistérios. Falamos de pessoas com dons, de familiares que adivinham o futuro, que falam do depois da Morte onde molharam os pés. Separamo-nos cuidadosamente das crendices, o moçambicano dos best-seller americanos, o cabo-verdiano, das bruxarias.
Tenho uma doce e calorosa sensação. Este combóio vem de África como uma grande jibóia por baixo da terra e leva-nos às costas. Aí vamos nós pela Europa dentro. Pouca terra, pouca terra. Muito mar...
Ah, sim. Esta é a minha Pátria muito amada, das cinco chagas do mundo, peças do meu rosário que contarei talvez, de Mombaça à Gorongosa, nas mãos da minha gente cor de minério, que não fica bem em nenhum anel...

11.1.06

História da Guerra Civil (Espanhola) que não vai agradar a ninguém”, de Eslava Galán. Por André Bandeira


Algumas frases seduzem pela sua simplicidade e são de tal modo perspicazes que se antepõem aos sentidos. Uma delas é a máxima da Fé Ba´hai: todas as guerras são civis porque todos os Homens são irmãos.
Também é interessante a frase de Lartéguy: todo o Homem é uma Guerra civil.
Em Espanha saiu, no Natal, a “História da Guerra Civil que não vai agradar a ninguém”, de Eslava Galán, filósofo e romancista (com novelas sobre a Guerra Civil) de Jaén, cidade que foi inexplicavelmente martirizada por Franco.

O seu livro, com maneiras, é fundamentalmente, um anedotário de esquerda que tem a nobre intenção de tentar à sua maneira ultrapassar o trauma. O livro tem muitos capítulos muito curtos que se lêem como um jornal, tem sobretudo histórias humanas e uma delas serve de narrador a todo o enredo. Vejamos:

1- Até ao fim da Guerra (incluídas as execuções feitas pelo vencedor até 1944) o número de mortos não é de um milhão, mas cerca de meio milhão. Os republicanos mataram mais gente mas, quando, perderam, Franco ultrapassou-os.
2- Alguém atravessa as duas Espanhas, onde se saúda, à romana ou de punho erguido, e diz, antes de sair:” Só voltarei quando se voltar a cumprimentar, tirando-se o chapéu”
3- No lado republicano, alguns são arrebanhados para morrer. Diz um:” eles não me vão fuzilar porque o comandante foi empregado no meu casino e eu dava-lhe boas gorjetas”. O comandante entra e dá ordens: “Fuzilá-los a todos e este em primeiro lugar!” Diz um outro: “ eu ao menos não tenho inimigos que nunca fiz favores a ninguém!”. Morrem ambos.
4- Durruti e José António. Durruti morre na frente de Madrid insultando os seus homens que fogem da frente (leva um tiro no peito, de pequena distância, deixa em herança apenas uma muda de roupa, uns óculos de míope e um pedido ao Comité da CNT de cem pesetas para gastos pessoais), José António Primo de Rivera é fuzilado duas horas depois, na Prisão de Alicante, sem que haja qualquer relação entre as mortes (os que guardavam o líder da Falange só podiam festejar a morte do líder anarquista e nem dela sabiam). Durruti não aceitava que seus companheiros, como anarquistas que eram, fizessem parte do Governo. José António parece nunca ter sido objecto de uma tentativa séria de resgate (que as houve e muitas) do lado nacional. Destinos semelhantes de um Asturiano e de um Andaluz.
5- Tinker é o mais brilhante dos mercenários republicanos. Piloto americano dum “Chato” soviético estava-se para alistar no lado nacionalista quando viu a resistência do Alcazar de Toledo. Entretanto Franco bombardeia barbaramente Madrid e alista-se pelos Republicanos. Deita quarenta aviões abaixo, recebe uma medalha, vai comprar o que se propusera antes de se alistar, uma casa aos EUA, desce o Mississipi a remos só com o seu cão e aluga um quarto numa pensão. Passa um dia inteiro a ver antigos recortes de jornais espanhóis, outros “souvenirs” senta-se em frente à janela e dispara no peito. Coração grande, alvo fácil.
6- O capitão Cortés resiste às hordas republicanas em Virgen de la Cabeza, com oitocentas pessoas entre militares e famílias. Faminto, abre processo por cada arma que se encrava, como num quartel em paz. Os que desertam com as crianças nos braços, dizem aos milicianos, arriscando a vida: “ Não, não direi mal do Capitão. É o homem mais justo que alguma vez conheci. Deserto pelo meu filho.” Cortés cai finalmente crivado de balas, com os seus nacionais à vista. A sua fotografia no leito de morte, não precisa de ser retocada como a da Benetton para se parecer com a imagem de Jesus.
7- Garcia Lorca é arrancado da casa dos Rosales, falangistas da primeira hora que lutam por o esconder: quando sabe que vai morrer, faz apenas uma tentativa para o evitar: “ Não me mateis que eu creio em Nossa Senhora”. Desgraçado de quem não o ouviu...
8- O diálogo entre Miguel de Unamuno e Milan Astray, o fundador da Legião, é reproduzido ipsis verbis. Todos o conhecem. Astray diz “Viva la Muerte!”, Unamuno, “vencereis porque tendes a força bruta do vosso lado!”. Unamuno morre pouco depois, com um derrame cerebral. Milan Astray, que tentara em vão dissolver o casamento empatado por um voto de castidade mais uma solidadriedade conjugal ímpar, tem uma filha duma belíssima jovem, com metade da idade dele e que lha confia. Vive ainda muito tempo, uma vida de paz, em Lisboa.
9- No Cárcere e hospital de Madrid, os republicanos vão arrancando feridos e prisioneiros, levam-nos para uns “paseos” e matam às centenas todos os dias. Um anarquista assume o comando. É um antigo toureiro, com um passado de fome e miséria a quem uma cornada encurtou a carreira. No dia em que entra, os “paseos” cessam definitivamente. Chamam-lhe o “anjo vermelho”, ele que era vermelho e negro, como a arena e o touro.
10- Um desertor republicano passa-se para os nacionalistas. Chama-se José Pujol, bate-se denodadamente pelo novo partido. Durante a segunda guerra, sob o nome de “Garbo”, será um dos maiores espiões dos Aliados, entre os alemães.
11- Mussolini e Hitler predizem sinceramente o pior para Franco. Acertam pior em relação a si mesmos. É certo que todos os concorrentes morrem (Sanjurjo, Goded, Mola). Só Mola deixa dúvidas, encontrado a cinquenta metros do avião que se despenhara, corpo intacto caído de costas, com a máquina fotográfica ao peito.
12- Um padre catalão sai da cave onde durante três anos celebrou missa clandestinamente. Vai à Igreja e diz:” Caríssimos irmãos: onde pusemos a cabeça? Metade de nós morreram na frente ou foram assassinados, os campos estão por cultivar, os animais foram roubados e eu, eu...tenho de vos dizer a Missa em castelhano!”.

Esta “Guerra de Espanha” é mais uma a juntar às clássicas de Dahms ou Preston, mas ainda com alguma distância. Tem bons números em anexo. Traduz alguma ambivalência, desta vez vinda da esquerda. Dá um ideia geral de que as duas Espanhas eram acriançadas, passando a uma velocidade de mercúrio da irresponsabilidade para o sanguinário. Mas fica claro que, enquanto os espanhóis morriam de faca nos dentes, no pó e na lama, o melhor arsenal da época, alemão/italiano ou soviético/francês, triunfava no céu, no mar e na estrada. Na ambivalência, os espanhóis, deixados a si mesmos, ter-se-iam talvez entendido.
É bom que se mantenham estas ambivalências e se aprenda a viver com elas.

10.1.06

Aproxima-se a hora da verdade em Espanha

Segundo o EL País de 7 janeiro 2006) o comandante-chefe do Exército de Terra espanhol general José Mena Aguado afirmou publicamente em Sevilha que a perspectiva de um estatuto reformado de Catalunha "desencadeou entre os seus subordinados uma preocupação pelo futuro de Espanha". Advertiu "das consequências graves" que acompanhariam a aprovação do novo estatuto contra "os limites incontornáveis" da constituição. Nesse caso, o artigo 8 da Lei fundamental do Reino poderia ter de ser invocada porque coloca a responsabilidade nas forças armadas como garantes (Spain) da integridade nacional espanhola, da soberaqnia, da independência e do código constitucional. Não passou despercebido a ninguém que em 1936, houve anúncios semelhantes em Sevilha por um outro general do exército, Queipo de Llano.
O ministro espanhol da Defesa, José Bono, ordenou a prisão domiciliária, durante oito dias, do tenente-general José Mena Aguado, que anteontem afirmou que as Forças Armadas teriam de intervir se algum Estatuto de Autonomia ultrapassasse a Constituição. A sua destituição será proposta ao Governo espanhol, que o deverá demitir, três meses antes da sua passagem à reserva.
A reacção de seus colegas militares é ainda imprevisível, apesar de a Associação Unificada de Militares Espanhóis apoiou as medidas contra o general. "A democracia tem os seus lugares próprios para fazer política", afirma, em comunicado, onde acusa a cúpula militar de "estar conivente com algum partido", . Muitos que consideram humilhante a saída do iraque nas condições em que se processou recbem agora este segundo agravo do governo Zapatero.

A Irmã Morte e Ariel Sharon

Irmã Morte: treme-me a mão quando te escrevo. Dizem em Xangri-La que dá sorte desenhar-te mas eu vivo cá em baixo e benzo-me, não vá desviar o olhar na tua direcção, quando apareces como uma mulher elegante, um pouco antiquada, com um olhar gélido ou uma ternura tão doce que consome a língua.

Outro dia, um fantasma veio-me visitar no prédio antigo onde vivo. Não eras tu, irmã Morte. Era uma mulher antiga que vinha cuidar de mim e fiquei contente ao saber que a Feminilidade com que apareces seja maior que tu, irmã Morte, e te sobreviva para voltar do Além, enganando-te assim, para puxar os lençóis sobre o meu peito gelado.

Vejo que visitaste o meu irmão Sharon e lembrei-me como tu devias presidir a todas as reuniões, passares de vez em quando o teu véu em frente aos rostos distraídos pelas animações das telas coloridas.

Duramos tão pouco, o nosso tempo não serve para comandarmos o carro de Apolo. Ao fundo estás tu, no teu vestido longo e antigo, como uma noiva prepotente. Não, não percorrerei a álea dos ciprestes gigantes com que o jovem Adolf Hitler quis tranquilizar para sempre a sua alma, na sombra fresca.

Devíamos pôr-te sempre à cabeceira das mesas de negociações, reservar-te um lugar. Sabes que não há gozo, nem justiça, nem Liberdade, nem paixão a que tu subitamente não dês a mão, como uma noiva arrependida a um motorista chegado num carro por trás da Igreja, que ninguém conhece, e que, por isso, embarga todas as gargantas muito antes de apareceres ao fundo. Figura imóvel entre dançarinos, mordomo inesperado que indica a porta na ondulação das suas vestes, amante desprezada que aguarda o seu quinhão...

Sharon disse um dia, provocado por um jornalista, que preferia ser um SS vivo a um judeu morto. É engraçado como todos falam da morte de um ponto onde ela não toca, como um gato que faz dançar a sua presa ferida num círculo letal, parando o tempo, antes de o comer e o deixar apodrecer por dentro, desde a cauda. Os livros relatam as mortes, fazem estatísticas mas poucos dão o testamento pormenorizado de cada afogamento nos seus braços. Alguns livros militares referem a quase universal invocação da mãe, outros, das últimas cartas muitas vezes ocupadas com o final tricotar duma esperança judiciária que a História ouve sem proferir uma palavra, não vá o castigo que a espera, por tão pomposa e sentenciosa, ser ainda pior. Como comportar-se perante ti, irmã Morte? Como respeitar a etiqueta, tu que reverberas para todas as hortas, desde os ermos, como uma torrente ciumenta, que acenas como um melro solitário ao termo de cada jardim onde uma estátua antiga, voltada de costas, faz tropeçar o incauto para fora do Éden. Assim há a morte dum filho, a morte do Amor, a “pequena morte”, a morte do artista, a morte d’homem, a morte do dia. Já vens embargada na garganta das crianças, desde sempre.

E tudo isto, nada disto, devia valer, nem Gaza, nem Jerusalém, nem a Terra Prometida, nem Sião, nem a Aliança, nem a Palestina, nem a Judeia, nem a Samaria, nem a última carta de Mordechai Anielewicz, essa vergasta na mão de Cristo, soçobrando entre as ruínas do Ghetto. Nem mesmo o teu honrado esforço, Sharon, por encontrares uma solução sem que as hienas se fiquem a rir de ti e dos teus antepassados.

Não sei que bonzo dourado me surpreenderá com o seu silêncio, não sei que brisa de Elias me fará sair da caverna do medo, agora que o fim te saudou sem etiqueta (a ti, que, como nós todos, não sabemos o que vestir para a receber). Só sei, Irmã Morte, doce pantera negra que também te ajoelhaste aos pés de S. Francisco, que devias ter aparecido ao lado das manifestações de júbilo dos palestinianos ( e não dentro delas), aos entardeceres das praias de Tel-Aviv ( e não no coração dos soldados de licença). Agora que tens a tua mão no jôrro de sangue de Sharon, irmã Morte, que não a fechas, não a baixas, nem a retiras...

Será que nos lembras a todos que não há tempo a perder porque o Tempo se perdeu há muito?

Será que, Ahmedinejad, não vês que este não foi um castigo de Deus mas o Silêncio todo que fica quando tudo cessa, até o silêncio, depois dos nossos gritos ao Céu? Porque só vês o imã Hussein com o filhinho nas mãos estendendo-o aos assassinos de Kerbala e não o vês caíndo sob os golpes, agarrando-o ternamente no regaço?

9.1.06

Mahmoud Ahmadinejad e os pró-nazis

O novo presidente do Irão, Mahmoud Ahmadinejad, quando nega o Holocausto, está apenas a retomar um velho tema do país. O Irão acolheu agentes nazis em 1940 fazendo do país uma base de operação na região. Em 1935 o Xá Reza Pahlavi, um grande admirador dos nazis, mudou o nome do país de Pérsia para Irão (a terra dos arianos). Após o início da II GM o Pró-Nazi Grande Mufti de Jerusalém foi para Teerão e tentou cortas os abastecimentos de petróleo aos britânicos e aliados. Depois foi para Berlim. O Irão tornou-se um centro de negação do Holocausto, temdo acolhido personagens como Jürgen Graf, sentenciado na Suíça e Wolfgang Froehlich. Também Roger Garaudy foi recebido como um herói em Teerão, depois de se tornar muçulmano e negar o Holocausto. (Edwin Black em San Francisco Chronicle, 1/8/06).

I – A questão monárquica vista de um ponto crítico - André Bandeira

O recente debate mediado por Fátima Campos Ferreira merecia ser transmitido no horário de grande público, da TV. Não foi e é uma pena.

Dos argumentos expendidos recordo, curiosamente, os de Gonçalo Ribeiro Teles, Mendo Castro Henriques e Adelino Maltês. Os do primeiro, não pelo que diz mas por quem o diz, visto que se limitou a repetir o que vem dizendo desde há várias décadas e se tornou cada vez mais óbvio (não que, por isso, seja mais audível). Os do segundo porque diz algo que, de ser tão óbvio e repetido à exaustão, deixou de ser verdade e é preciso que alguém o lembre: a justiça social que seguiu vários caminhos e se traduziu em injustiças assustadoras, já parece que não interessa a ninguém ou então, a igualdade implantada com grandes erros de paralaxe, gerou apenas mais alguns super-homens liberais que, pelo menos, lutarão por figurar nos magazines da nobreza de revista. E os do terceiro porque deixam um grande espaço aberto ao modo como as coisas se virão a passar no futuro.

Tenho a estranha sensação que alguns dos argumentos da outra parte foram de circunstância, como quem se comporta bem num ambiente “nobre e sério”. O que mais me chamou a atenção foi o da reciprocidade da tolerância que um eventual regime monárquico deveria observar a respeito dos republicanos. Não faltam argumentos históricos que testemunhem essa tolerância e, os maus exemplos não podem ser confundidos com hábitos de épocas tão passadas como aquelas que juravam ser o Sol a andar à volta da Terra e que, afinal, valem para as formas da República ou Democracia históricas ( ou não valerão, visto que há sempre um herói sanguinário empolando os nossos mais secretos sonhos?...). O que me mete medo é a falta de mencionar a necessidade de garantias de tolerância que a República devia oferecer a quem não é republicano, nomeadamente quando um debate tão importante ficará apenas na memória de quem lá esteve. Embora um Historiador como Oliveira Marques tenha inteligentemente explorado essa pista, a tolerância tem limites, por exemplo quando se trata a eventualmente perguntar ao eleitorado se aceita a fusão com Espanha (de onde a nossa autonomia Hispânica teria começado muito mais tarde do que se pensa) ou a independência de Portugal insular (na qual, a nova unidade europeia, como chocolate subsidiário, se celebraria).

A outra coisa que se não disse é que Gonçalo Ribeiro Teles não referiu a unidade nacional como se do máximo Bem se tratasse. Toda a gente sabe que ele foi o introdutor em Portugal dum Bem superior a esse do qual a unidade nacional é apenas um efeito, o Rei apenas um sinal mas que, hoje, é pau para toda a obra e não falta no programa de nenhum Partido. Não faço do Ecologismo uma nova ideologia, com profetas, sacerdotes e catecismos. Aliás, o Ecologismo é uma dessa coisas que teve de ter um “ismo” porque o que era óbvio desapareceu da memória dos Homens, como outras coisas tinham desaparecido da mesma quando alguns se viram obrigados a inventar o termo “socialismo”.

Mas isso que Gonçalo Ribeiro Teles repetiu e que ignora o desprezo total e absoluto de alguns pelo que quer dizer “unidade” e por tudo o que se adjective de “nacional” exige outra coisa que talvez possa caber nas perspectivas de Adelino Maltês ou seja: não mais o retorno de um Rei se com ele não vier uma nova Revolução política.

Qual ? A ecológica?

Não. Uma revolução das mentalidades que redimensione de cima abaixo o que esperamos e o que podemos fazer da política. A política não é para as capas de revistas onde, no Verão passado me lembro de ter visto, majoritariamente, o actor brasileiro Alexandre Frota e os seus projectos "cinematográficos" em Portugal. A política pode ser até como um indivíduo perfeitamente desconhecido, num canto qualquer de Portugal, gere uma estranha doença que lhe foi diagnosticada...

8.1.06

Um Debate que tem de continuar...


XII Congresso da Causa Real, em Lisboa, no Parque das Nações. Um debate aberto e longo entre as 15H30 e as 19H00 sobre Monarquia-República, moderado pela dr.ª Fátima Campos Ferreira, no formato do “Prós e Contras”. João Soares, Luís Nandim de Carvalho e Manuel Monteiro, na bancada republicana. Gonçalo Ribeiro Teles, José Maltez e eu mesmo na bancada monárquica. Uma assistência de cerca de 150 pessoas enchia o Auditório donde vieram mais de duas dezenas de oportunas intervenções como as de Ferreira do Amaral, Nogueira de Brito, Rui Carp, Lopo Castilho. Um debate emotivo com palmas e sem apupos, com muitas sintonias e discordâncias suficientes. Um debate em que ninguém cabeceou, como disse Fátima Campos Ferreira. Um debate que consolidou a ligação entre monarquia e democracia. Mas um debate que não pode ser ainda um virar de página porque não teve qualquer órgão da comunicação social a assistir….

A bancada republicana surpreendeu pela argumentação serena e construtiva – e não terá sido por jogar fora de casa. Apesar de obviamente republicana, concordava com o substancial do novo argumentário monárquico pela democracia. Todos os oradores da bancada confessaram não só a sua pessoal simpatia por Dom Duarte de Bragança, que assistiu aos debates, como o seu reconhecimento da valia e do contributo que Dom Duarte tem prestado à pátria e à democracia portuguesa. De João Soares e de Namdim de Carvalho vieram mesmo sugestões de que deveria evoluir o estatuto da Fundação da Casa de Bragança e a composição do Conselho de Estado para reflectir as prerrogativas do representante dos reis de Portugal.

Agora, argumentos específicos de cada a um.

Manuel Monteiro defendeu um regime presidencialista – à americana – com um esvaziamento ou desaparecimento da figura do primeiro ministro. No contexto actual, isso só pode apontar para uma defesa do reforço dos poderes presidenciais e nomeadamente do dr. Cavaco Silva, caso for eleito. Considera direito de qualquer cidadão poder ser eleito chefe de estado. E reforçou o seu capital de simpatia por D. Duarte.

João Soares considera que não devem existir mandatos vitalícios em democracia; nem Câmaras, nem deputados, nem presidentes, e portanto, um rei não seria democrático. Aparte isso, considerou preferível ter dez anos de presidência de Dom Duarte que de Cavaco Silva. Chamou a atenção que Dom Duarte aparecia muitas vezes isolado nos seus combates e que os monárquicos se deveriam organizar, já que notava um revigoramento dos argumentos.

Nandim de Carvalho atacou o “corporativismo partidário”; incitou os monárquicos a term formações políticas próprias - um partido mesmo, disse ele – que possam disputar lugares através de programas políticos genuinamente monárquicos, nomeadamente nas autarquias apoiando listas de independentes. O seu republicanismo pelo “Presidente de todos os portugueses” também recusa os mandatos vitalícios mas nada lhe custaria viver em monarquia, desde que o povo assim desejasse e houvesse plena tolerância dos republicanos como agora há dos monárquicos

Tudo apurado, os argumentos puramente republicanos contra a chefia monárquica do estado resumem-se a dois: é um mandato vitalício e não está aberto a todos. Por força da experiência portuguesa, evaporaram-se na atmosfera os argumentos habituais sobre as (in)capacidades do rei, sobre o papel de (in)existentes nobrezas, sobre o peso da corte. Nalguns caso, o feitiço virou-se contra o feiriceiro . Os velhos argumentos sobre os gastos com a Casa real e o intervencionismo dos reis, são agora tratados à defesa depois do artigo da revista EXAME de Outubro, demonstrando que cada português gasta 18 vezes mais com o seu PR do que os espanhóis com o seu Juan Carlos.

Ns bancada monárquica, todos insistiram que está por inventar o modo de instaurar a monarquia do séc. XXI, em Portugal, através do consenso popular. Uma coisa é existir uma solução histórica que é a instituição real, com as suas tradições; outra coisa é o procedimento actual que permite a um povo escolher democraticamente, com ou sem votos, um representante isento das divisões político-partidárias. Finalmente, todos salientaram que conforme os relatórios da OCDE e do PNUD, são monarquias democráticas a maioria das quais entre os doze países mais desenvolvidos do mundo, em termos de índice de desenvolvimento humano e de produto per capita.

Da assistência veio a ideia força de que um rei tem a vantagem de ser o representante de uma instituição que gera espontâneas manifestações de coesão e de afecto, uma dinastia que no caso português coincide com a família do Duque de Bragança cujo tronco remonta ao próprio D. Afonso Henriques.

Gonçalo Ribeiro Teles realçou que a campanha presidencial está dominada por equívocos: 1) Obriga o país a escolher entre um ( ou mais que um) candidato da Esquerda e um candidato da Direita para um lugar que é de Unidade nacional; 2) Debate programas políticos, quando os poderes presidenciais são por natureza alheios aos do governo. Acrescentou que cabe aos monárquicos inventar o modo de inataurar a monarquia do séc. XXI em Portugal. E insistiu, finalmente, que sem comunicação social a divulgar ideias alternativas às predominantemente veiculadas pelos jornais e televisões, não há verdadeira democracia.

José Maltez considerou que tempo era de sementeira de ideias monárquicas, a médio e a longo prazo, a menos que houvesse conversão dos republicanos. Estabeleceu paralelos históricos com a Restauração, com o 5 de Outubro de 1910, com o Estado Novo em que od monárquicos sempre comhbateram em duas frentes; contra o autoritarismo antidemocrático de 1933, e contra a oposição socialista e comunista. Em tosdos estes momentos históricos salientou a ideia de Passos Manuel sobre “cercar o trono com instituições republicanas”. Seguindo o pensamento de Barrilaro Ruas, afirmou os monárquicos “aperfeiçoavam a república”. Não eram anti-republicanos, mas sim,para além de republicanos, eram monárquicos.

Eu mesmo evidenciei duas tendências políticas de fundo, uma interna, a outra internacional; ambas favorecem o crescimento da instituição monárquica A internacional é de que a processo de integração europeia vem exigir dos estados membros uma partilha dos poderes que o estado republicano não tem maneira de compensar. Mas a solução monárquica oferece uma garantia de independência que não é afectada por desenvolvimentos externos e internos.

A tendência interna é que, com a consolidação do Estado democrático em Portugal pode-se, deve-se e tem-se diminuido os poderes do chefe do estado. Não se justifica a originalidade do “semi-presidencialismo” português; o país deve ter uma única legitimidade democrática por via eleitoral. Os poderes diminuídos do PR abrem o caminho para um chefe de estado real.

Salientei ainda a importância de um debate de ideias como o que opõe monarquia e república, numa fase da democracia em que só os debates economicistas parecem ter direito à comunicação social. É uma herança da má desmarxização dos anos 80 em Portugal, o facto de a ideologia do materialismo económico ter transitado das mãos dos marxistas para a dos liberais, enquanto a utopia da justiça social ficou perdida, para ninguém.

Afirmei que é prematuro debater o modo de transição da república para a monarquia; as circunstâncias futuras ditarão os procedimentos necessários. Segundo as regras da dupla revisão constitucional, é possível fazer do rei o sucessor um presidente. A assembleia pode votar, o país pode referendar, os corpos soberanos podem aclamar o sucessor dos reis de Portugal. A única exigência presente é que a “aclamação” será um procedimento democrático.

No plano histórico, esse sentimento de aclamação verificou-se na restauração de 1640, descrita pelo jornalista internacional da época, o Abade Vertot, como jamais vista no que toca ao extraordinário consenso e unanimidade que permitiu a aparente facilidade com que as guarnições militares e o poder civil dos Habsburgos de Espanha foram expulsos de Portugal. Foi esse mesmo sentido de unanimidade que levou Francisco Velasco de Gouveia a escrever na “Justa Aclamação que “o poder dos reis está no povo”.

Salientei ainda que, sem despesas para o tesouro público, Dom Duarte tem levado a cabo numerosas missões de interesse nacional, tanto junto dos países lusófonos, como das comunidades portuguesas. Internamente tem-se batido por causas cívicas de ordenamento do território, de solidariedade, de património, em que tem ganho a experiência de um chefe de estado real.