23.2.11

LXXV- (Re)leituras - Les musulmans dans la laïcité, de Tariq Ramadan, por André Bandeira

Tariq Ramadan, em tempos, tinha tempo de antena, talvez por ter bom aspecto físico. As funções biológicas de reprodução, numa Europa alienada e sem identidade geográfica, falam outras coisas com os gestos e olham paradas, enquanto ocupamos a nossa boca com palavras hipnóticas, em mimetização com o Meio (vejam esses flamingos côr-de-rosa como se repercutem, quando estão juntos). Os levantinos, realmente provocam paixão, porque se crê que, mesmo deformados de corpo, têm ardor. Num mundo volátil, em que os pais se demitiram de educar, o «ardor» é um direito universal. Mas Ramadan é neto do fundador dos Irmãos muçulmanos,exilado por Nasser e afigura-se neste livro como um maoísta prestes a virar liberal, intimamente encorajado pelas reticências duma Corte aborrecida. Atiçar maoístas xiitas contra nacional-socialistas sunitas é aplicar a máxima «o inimigo do meu inimigo é meu amigo». Quando esta é a única gestão, só o gestor sabe que tem o stock a zero. Como o petróleo. Este livro defende a laicidade e integração do comunitarismo islâmico nas sociedades ocidentais. Espero que sim, como devia ter sido a presença do Ocidente, após a Guerra, nos países do Norte de África. E nunca o foi, por desprezo e ignorância da civilização mediterrânica. Efectivamente há uma responsabilidade política em muitas religiões e a factura do colonialismo está ainda por pagar, independentemente de haver várias contra-facturas a cobrar. Mas a laicidade é mais uma armadilha de Robespierre. A Revolução francesa teve de inventar um culto pagão, por decreto. Por mais que Ramadan tente, devolvendo o ónus da informação, para um Ocidente, tão depressa sedento de Exótico, como violento, o islamismo não é laico e faz muito bem. Tem uma ideia política e jurídica das organizações sociais. Excepto nas seitas místicas, ninguém fica sózinho, no Islão. Mas como o Islão assentou sobre religiões antigas, assim o fez o Cristianismo. Dizer que o Islão não teve Renascença é ignorância. O Islão floresceu precisamente antes da nossa Renascença, e à distância de uma pedra. Ora inventou-se a Nação para dar lugar a todos e as Relações Internacionais para dar alternativas a essa disposição. Mas, no Ocidente, ou no Oceano, a administração da solidão é uma velha prerrogativa nómada e houve muito antepassado que morreu, para a garantir. Em Covadonga, os visigodos de Pelágio sobreviverem e venceram sózinhos, com vizinhos islâmicos. Mas Ramadan tem razão: a luta dos muçulmanos pela sua identidade, num mundo neo-colonizado é sobretudo isso. Eles são mais do Ocidente do que que nós, se calhar, desejaríamos. E o revivalismo foi também uma forma de organização da juventude, contra a droga. A droga, por sua vez, foi uma fuga do desabuso sexual, numa fase de histeria freudiana. O tráfico de droga é concomitante com o dos corpos e começa nas periferias da anomia. Que tem feito verdadeiramente o Ocidente para lutar contra a cultura psicadélica, sem qualquer consistência e contra o seu sucedâneo, o novo alcoolismo? É assim. Não esperem que os jovens muçulmanos, herdeiros de uma Grande Civilização, se deixem morrer. Em lado nenhum.

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